quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Do cinza ao Dark: O cinza - 1946 - 1955




Como primeira coluna deste ano gostaria de utilizar deste espaço para especificar o motivo de meu projeto de pesquisa se intitular "Do Cinza ao Dark". E para tanto gostaria de explicar o primeiro nome, ou seja, o cinza. O cinza seria exatamente nosso tema de hoje, o segundo surto de industrialização em SP e como este fato possui vínculo com a ferrovia, no diz respeito ao trecho LUZ- Rio grande da Serra da CPTM.

Primeiramente não basta mostrar por meio de imagens e vídeos apenas a degradação, uma carcaça de indústria. É preciso ter embasamento histórico, mostrar todo o processo que levou diversas indústrias a se instalarem no entorno da ferrovia e somente após este conhecimento básico, que necessita ser exposto, estar hábil a discorrer sobre tal tema. É por estas e outras que apresento para ao longo do ano os passos que levaram SP a ser considerada a "Detroit Brasileira" e a região do ABC como a "Detroit paulistana". Mas primeiro temos que entender como o período de 1946- 1950 influíram para tal nomenclatura.



1946 - 1955 : O embrião para o surto.

Apesar de economicamente o Brasil estar abalado, é a partir de 1946 que este quadro começa a mudar. Com a alavancada econômica diversas indústrias brasileiras puderam comprar maquinário novo e a frota de veículos puderam ser renovadas. As indústrias referentes ao setor de peças para veículos se firmaram definitivamente no mercado. Todo o contexto de SP estava fervilhando: a televisão, o cinema em extrema ascensão, o despontar do setor de eletrodomésticos, como a Wallita que lançava no brasil o primeiro liquidificador. A marca "indústria brasileira" passou a ser gravada em diversos produtos.

batedeira lançada pela Wallita em 1944 já era sucesso em 1946 ;foto: livro "110 anos de Industrialização em SP". pag105.


Em 1947 uma mudança significativa: desde o ínicio da industrialização em SP datada de 1880 sempre produzimos mais bens de consumo do que à produção. Mas a partir de 47 esta equação se inverte o que significou que passamos a ser fornecedores de nossas próprias fábricas.
Com a alta taxa de importação poderiam dizer que a indústria de autopeças iria por água abaixo. Mas por que ela se manteve? isso é simples, imaginem vocês, por mais que seu veículo "exótico" fosse uma super máquina ela não viria com peças extras para reposição. Isto significa que mesmo que não quisessem os próprietários deste veículos importados teriam que recorrer a conhecidas peças "piratas" da indústria nacional. Aliás este fato possui histórias engraçadas pois podemos dizer que este setor fez "milagres". Meninos do bairros do Brás, Lapa, Penha, Campinas e do ABC paulista corriam pelos terrenos baldios em busca de torneiras quebradas, enxadas velhas, pedaços de canos, pedaços de ferro, arames, panelas de ferro estouradas, todo o tipo de sucata que vendiam as indústrias de autopeças para garantir a matinê do fim de semana. E esta sucata se transformava em bronzinas, polias, coroas, tambores de freio, ou seja, em peças genuínamente brasileiras.

comercial da Companhia de Gás Esso em 1946; foto: livro "110 de industrialização em SP" pag 114.

Além das autopeças outras indústrias e fábricas abriam o terreno para ocorrer o segundo surto de industrialização, como a Arno que a partir de 1944 também passou a produzir eletrodomésticos, a Antarctica Paulista abria mais 12 filiais em 12 cidades (sendo a matriz na frente da estação mooca da linha turquesa), os irmãos Jafet abriam mais três metalúrgicas, a Vigorelli passou a fabricar máquinas de costura, a Votorantim aumentou sua produção de cimento e sustentou diversas obras de expansão em SP, e por fim, a fundação da Compahia Nacional de Gás Esso.


O pós Guerra fez de São Paulo uma cidade moderna e que necessitava se expandir. Foi um renascimento. Vários imigrantes de diversos países viram no Brasil um local de paz e prosperidade e por isso diversos judeus se instalaram no bairro do Bom retiro, assim como alguns italianos. Poloneses, alemães, franceses, eslavos, e que não eram meros camponeses mas sim cientistas, comerciantes, técnicos, industriais. Entre os últimos o mais conhecido industrial foi Francisco Matarazzo Sobrinho, sim sobrinho do imigrante de 1881 que se tornara o maior industrial brasileiro.


Outro fator importante neste período foi a construção da via Anchieta, obra que o paulistano demorou oito anos para ver construída. Isto mudou o quadro até então de ferrovia como a melhor opção para o escoamento de mercadorias entre São Paulo e o porto de Santos. Outro problema é que tanto o maquinário quanto as peças referentes a ferrovia, como o por exemplo, o ferro gusa, estava em falta neste período. Isto mostra o quanto investir na ferrovia, em um país que a pouco tempo sabia o que era ser fornecedor de suas próprias fábricas, era difícil.

Construção da Anchieta. foto: livro "110 anos de industrialização em SP, pg 106.

Entre a opção rodoviária e a ferroviária a primeira ganhou e São Paulo com suas ruas novas, bairros novos, novos percursos como a Anchieta e Anhaguera, o Aeroporto de Conhonhas etc, expansão, mudanças geográficas, transformação. Não dava mais para negar, o paulistano precisava e queria espaço. O confronto entre rodovia e ferrovia se torna injusta na medida que entendemos que o Brasil, em especial São Paulo, precisa crescer mas ainda sofre com seu atrelamento ao passado, pois, quando colocado na balança é nítido que estamos falando de um país essencialmente agralista, que possui uma burguesia medrosa e retrógada, visto que todo o exemplo europeu nos mostra que um país essencialmente industrial necessita de uma malha ferroviária eficiente.
É neste cenário que em 1955 irá ocorrer o chamado "segundo surto de indústrialização paulista",pautada pela indústria automobilística, o tema de minha próxima coluna.Para saber o motivo do Cinza ao Dark, continue seguindo esta coluna, quinzenal sempre com o título do Cinza ao Dark.



Marina Rosmaninho é formada em Ciências Sociais no Centro Universitário Fundação Santo André(2008). É socióloga, amante da linguagem audiovisual, documentários, ferrovias, indústrias e escombros e procura juntar todas suas paixões para analisar a sociedade. Convida a embarcar neste trem sem descarilhar!














2 comentários:

Bruno Salgado disse...

Prieiro parabenizo pelo exelente texto, entendo este de forma enrriquecedora para entendermos as contradições no que tange hoje a ferrovia não só pta,a ferrovia nacional como um todo, analizando seu contexto no desenvolvimento já tardio do pais. Sendo atravez de trabalhos históricos e sociológicos minunciosamente pesquisado assim como este, entender a real função que as ferrovias nacionais desenpenham hoje na economia e o que ela foi no passado em relação ao processo de alavancagem da industrialização, tanto de auto peças como de bens de consumo e de primeira necessidades. Não sou altamente gabaritado para discutir detalhadamente essa linha do tempo traçado na pesquisa, sobre a total degradação e a anulação dos que trabalharam para fazer das ferrovias o carro chefe naquele período aureo, muito esclarecedor para a importância do resgate de uma história esquecida, ainda não por completo mas parcialmente esquecida.

23 de fevereiro de 2011 às 11:15
Anônimo disse...

Como diz a tv o trem anda pra frente, e assim deveria ser, mas e de prima importancia observar esse caminho a beira da ferrovia ascessao e queda das industrias, que pela ferrovia se desenvolveram e agora muitas estao desativadas, outras a beira de fecharem, hoje passei na frente do Moinho Sao Jorge, uma tristeza so, aquilo antes fervilhava agora e so mais uma industria abandonada infelizmente. Parabenizo a Marina pela bela pesquisa aqui exposta , continue a escrever sobre esse tema , pois aprendemos sempre mais um pouco sobre o assunto. Parabens ao grupo

1 de março de 2011 às 05:31

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