A imprensa brasileira de rock: Bizz – Ascensão e queda (parte 4/4)
por Marcelo Pimenta e Silva
A revista Bizz trazia em suas páginas uma abordagem alternativa das demais, tendo muitas vezes espaço para textos opinativos e com gírias que assemelhavam ao que a juventude brasileira falava naquele período. Dessa forma, a Bizz era contemporânea em linguagem ao que às rádios tidas como ‘malditas’ como a Fluminense FM, do Rio de Janeiro e a 89 FM de São Paulo apresentavam em sua grade de programação. O estilo gráfico era inspirado na revista inglesa Smash Hits e a chefia de redação de José Eduardo Mendonça.
A Bizz não se restringia apenas a estilos musicais, também era pauta o cinema, a moda, os quadrinhos, a tecnologia, a literatura, entre outros temas. Essa abertura para diversos assuntos teve bons resultados já na estréia, onde foram vendidos 100 mil exemplares. Logo se estabilizaria com uma média de 60 e 70 mil exemplares por mês. Em 1986 a revista consolida-se no mercado, graças também ao êxito do Plano Cruzado. Assim, a Abril lança outras publicações provenientes da Bizz como Letras Traduzidas, Ídolos do Rock e revistas-pôsters de artistas que faziam sucesso na época como The Cure, U2, Dire Straits e o grupo brasileiro RPM. O mercado publicitário também se aqueceu com o plano econômico e a Editora Abril explorou novas publicações direcionadas ao público jovem (FIGUEIREDO, 2005). A Bizz, em 1987, ficou segmentada apenas à música, já que havia sido lançada a revista SET, especializada em cinema. No mesmo ano, a revista passa a não ter concorrentes no mercado de música, pois a Roll e a Somtrês deixam de ser publicadas. Eram os sinais da retração da economia e do desgaste do Plano Cruzado. Nesse período, com a direção de redação nas mãos de José Augusto Lemos e o cargo de editor sendo chefiado por Alex Antunes, a revista assume um caráter “alternativo” em suas novas pautas (FIGUEIREDO, 2005).
Durante os anos 90 a revista seguiu alternando um discurso de apostas em bandas do cenário independente do rock nacional como Skank, Pato Fu, Raimundos, Planet Hemp, O Rappa, Okotô, Nação Zumbi, Carlinhos Brown, entre outros, assim como uma identificação da publicação com o movimento grunge e indie que se popularizava através da emissora MTV. Essa proposta mais “alternativa” seguiu até 1995 quando a revista passou a se chamar Showbizz. Com o tamanho idêntico da Rolling Stone (23x30cm), ela procurava ter uma linguagem idêntica à do canal de TV MTV, que se tornara um veículo abrangente e definia novos padrões de cultura e comportamento para os adolescentes e jovens nos anos 90. Com isso, a revista focava em um público “teen”, mas especificamente o masculino, com uma linguagem mais acessível e identificada aos adolescentes, além de explorar os espaços da revista com mais fotos do que com textos. Em 1998, a revista voltaria ao seu tamanho original, mantendo ainda o mesmo logotipo, contudo a Abril e a sua subeditora Azul, que produzia a Bizz, fizeram um acordo com a concorrente editora Símbolo, da forma que a Abril venderia assinaturas para a Símbolo, e esta teria suas edições trabalhadas pelos profissionais da Abril. Conseqüentemente, a Abril decidiu que a revista Bizz passaria a sair pela Símbolo, visto que, supostamente, esta editora trabalhava melhor com títulos segmentados. Da possibilidade de obter uma rentabilidade maior e de uma saída mais comercial para a Bizz, a revista em maio de 2000, passou a ser produzida e distribuída através da Símbolo, que destituiu diversos cargos que existiam na revista para cortar gastos e despesas internas. O resultado foi um prejuízo na qualidade da revista que aos poucos perdeu anunciante e reduziu o número de páginas. Em maio de 2001 a Bizz encerrou suas atividades.
Quatro anos depois a editora Abril retomou a revista com diversas mudanças na parte gráfica e com matérias novamente baseadas especificamente em rock e pop, além de matérias temáticas seja sobre drogas ou comportamento, mas todas tendo como foco principal a música. No contexto atual de blogs, e-zines, onde a internet é uma realidade já concreta e estabelece novas e dinâmicas formas de comunicação, a Bizz não resistiu novamente às mudanças da sociedade e fechou as portas pela segunda vez em julho de 2007.
Apesar de a Bizz ter nascido de uma demanda mercadológica, com objetivos explicitamente comercias, a revista notabilizou-se e ganhou credibilidade pela sua identidade editorial. Marcada pela irreverência ácida de seus jornalistas que criaram diversas polêmicas com bandas, músicos e gravadoras, a Bizz modernizou o jornalismo cultural do país. Essa característica anárquica da publicação fez com que ela fosse durante muito tempo a principal revista segmentada de música e cultura pop do Brasil. A Bizz continha um público fiel que enxergava na revista o principal veículo de comunicação de cultura jovem, isso antes da entrada da MTV no Brasil e do surgimento e popularização da internet no país. Mesmo que a revista tenha passado por três editoras diferentes (Abril, Azul e Símbolo e por fim voltando a Abril), além de diversas mudanças editoriais e gráficas, a Bizz traduziu toda uma geração (anos 80 e 90) que pode ser caracterizada pelo sociólogo Michel Maffesoli, como a das tribos urbanas. (1)
Dentro de uma perspectiva histórica sobre a imprensa musical no Brasil, em especial a voltada ao gênero rock, pode-se observar a “ascensão e a queda” dessas publicações como o resultado da expansão midiática nos últimos anos. Ou seja, se no começo as revistas serviam como principal canal de informação de um público consumidor do produto música, isso foi alterado com a introdução da televisão a cabo e, posteriormente, a popularização da internet. Dessa forma, as revistas de músicas passaram por uma reformulação em seu conteúdo, muitas perdendo espaço para os novos canais de informação gerada em blogs e redes sociais.
Nota:
(1) - Conceito desenvolvido por Michel Maffesoli que considera “tribos urbanas” micro grupos formados por indivíduos que têm em comum os mesmos gostos, idéias e objetivos em comum. Não tem uma ligação ideológica, contudo podem resistir ao poder com práticas alternativas de resistência. O interesse em consumir bens simbólicos próprios de cada sub-cultura os caracteriza em universos simbólicos característicos. Podem transitar de grupos para grupos, pois o sentido de pertencimento que os envolve é frágil. Exemplos: punks, headbangers, skinheads, neo hippies, entre outras tribos.
Referências bibliográficas:
BISSIGO, Luís. E assim se passaram 20 anos. Jornal Zero Hora. 19/01/2005. Porto Alegre. P. 6 e 7.
BRUNELLO, Aline Viviani; BORGES, Maria Fernanda Duarte Guimarães; TAKAHASHI, Vivian Cristina Bezerra. A Revista Bizz/Showbizz no jornalismo musical brasileiro da década de 90. Monografia de conclusão de curso de jornalismo da Universidade de Ribeirão Preto, São Paulo. Disponível em: http://www.unaerp.br/comunicacao/i. Acesso em 28 de agosto de 2009.
FIGUEIREDO, Alexandre. A volta por cima. Observatório da Imprensa. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.combr/artigos.asp?cod=358JDB003. Acesso em: 17de julho de 2008.
GUIMARAENS, Edgar. Algo sobre Fanzines. Disponível em: http://kplus.cosmo.com.br/materias.asp?co+4. Acesso em: 22 de setembro de 2009.
MAFFESOLI, Michel. O Tempo das Tribos. 2 ed. Rio de Janeiro. Editora Forense Universitária, 1998.
Contribuição do leitor Marcelo Pimenta e Silva, natural de Bagé/ Rio Grande do Sul, nascido em 11 de outubro de 1979. Jornalista pela Universidade da Região da Campanha – Urcamp, atua como assessor de imprensa e pesquisador. E escreve artigos sobre política e cultura em geral.
A Bizz não se restringia apenas a estilos musicais, também era pauta o cinema, a moda, os quadrinhos, a tecnologia, a literatura, entre outros temas. Essa abertura para diversos assuntos teve bons resultados já na estréia, onde foram vendidos 100 mil exemplares. Logo se estabilizaria com uma média de 60 e 70 mil exemplares por mês. Em 1986 a revista consolida-se no mercado, graças também ao êxito do Plano Cruzado. Assim, a Abril lança outras publicações provenientes da Bizz como Letras Traduzidas, Ídolos do Rock e revistas-pôsters de artistas que faziam sucesso na época como The Cure, U2, Dire Straits e o grupo brasileiro RPM. O mercado publicitário também se aqueceu com o plano econômico e a Editora Abril explorou novas publicações direcionadas ao público jovem (FIGUEIREDO, 2005). A Bizz, em 1987, ficou segmentada apenas à música, já que havia sido lançada a revista SET, especializada em cinema. No mesmo ano, a revista passa a não ter concorrentes no mercado de música, pois a Roll e a Somtrês deixam de ser publicadas. Eram os sinais da retração da economia e do desgaste do Plano Cruzado. Nesse período, com a direção de redação nas mãos de José Augusto Lemos e o cargo de editor sendo chefiado por Alex Antunes, a revista assume um caráter “alternativo” em suas novas pautas (FIGUEIREDO, 2005).
Durante os anos 90 a revista seguiu alternando um discurso de apostas em bandas do cenário independente do rock nacional como Skank, Pato Fu, Raimundos, Planet Hemp, O Rappa, Okotô, Nação Zumbi, Carlinhos Brown, entre outros, assim como uma identificação da publicação com o movimento grunge e indie que se popularizava através da emissora MTV. Essa proposta mais “alternativa” seguiu até 1995 quando a revista passou a se chamar Showbizz. Com o tamanho idêntico da Rolling Stone (23x30cm), ela procurava ter uma linguagem idêntica à do canal de TV MTV, que se tornara um veículo abrangente e definia novos padrões de cultura e comportamento para os adolescentes e jovens nos anos 90. Com isso, a revista focava em um público “teen”, mas especificamente o masculino, com uma linguagem mais acessível e identificada aos adolescentes, além de explorar os espaços da revista com mais fotos do que com textos. Em 1998, a revista voltaria ao seu tamanho original, mantendo ainda o mesmo logotipo, contudo a Abril e a sua subeditora Azul, que produzia a Bizz, fizeram um acordo com a concorrente editora Símbolo, da forma que a Abril venderia assinaturas para a Símbolo, e esta teria suas edições trabalhadas pelos profissionais da Abril. Conseqüentemente, a Abril decidiu que a revista Bizz passaria a sair pela Símbolo, visto que, supostamente, esta editora trabalhava melhor com títulos segmentados. Da possibilidade de obter uma rentabilidade maior e de uma saída mais comercial para a Bizz, a revista em maio de 2000, passou a ser produzida e distribuída através da Símbolo, que destituiu diversos cargos que existiam na revista para cortar gastos e despesas internas. O resultado foi um prejuízo na qualidade da revista que aos poucos perdeu anunciante e reduziu o número de páginas. Em maio de 2001 a Bizz encerrou suas atividades.
Quatro anos depois a editora Abril retomou a revista com diversas mudanças na parte gráfica e com matérias novamente baseadas especificamente em rock e pop, além de matérias temáticas seja sobre drogas ou comportamento, mas todas tendo como foco principal a música. No contexto atual de blogs, e-zines, onde a internet é uma realidade já concreta e estabelece novas e dinâmicas formas de comunicação, a Bizz não resistiu novamente às mudanças da sociedade e fechou as portas pela segunda vez em julho de 2007.
Apesar de a Bizz ter nascido de uma demanda mercadológica, com objetivos explicitamente comercias, a revista notabilizou-se e ganhou credibilidade pela sua identidade editorial. Marcada pela irreverência ácida de seus jornalistas que criaram diversas polêmicas com bandas, músicos e gravadoras, a Bizz modernizou o jornalismo cultural do país. Essa característica anárquica da publicação fez com que ela fosse durante muito tempo a principal revista segmentada de música e cultura pop do Brasil. A Bizz continha um público fiel que enxergava na revista o principal veículo de comunicação de cultura jovem, isso antes da entrada da MTV no Brasil e do surgimento e popularização da internet no país. Mesmo que a revista tenha passado por três editoras diferentes (Abril, Azul e Símbolo e por fim voltando a Abril), além de diversas mudanças editoriais e gráficas, a Bizz traduziu toda uma geração (anos 80 e 90) que pode ser caracterizada pelo sociólogo Michel Maffesoli, como a das tribos urbanas. (1)
Dentro de uma perspectiva histórica sobre a imprensa musical no Brasil, em especial a voltada ao gênero rock, pode-se observar a “ascensão e a queda” dessas publicações como o resultado da expansão midiática nos últimos anos. Ou seja, se no começo as revistas serviam como principal canal de informação de um público consumidor do produto música, isso foi alterado com a introdução da televisão a cabo e, posteriormente, a popularização da internet. Dessa forma, as revistas de músicas passaram por uma reformulação em seu conteúdo, muitas perdendo espaço para os novos canais de informação gerada em blogs e redes sociais.
Nota:
(1) - Conceito desenvolvido por Michel Maffesoli que considera “tribos urbanas” micro grupos formados por indivíduos que têm em comum os mesmos gostos, idéias e objetivos em comum. Não tem uma ligação ideológica, contudo podem resistir ao poder com práticas alternativas de resistência. O interesse em consumir bens simbólicos próprios de cada sub-cultura os caracteriza em universos simbólicos característicos. Podem transitar de grupos para grupos, pois o sentido de pertencimento que os envolve é frágil. Exemplos: punks, headbangers, skinheads, neo hippies, entre outras tribos.
Referências bibliográficas:
BISSIGO, Luís. E assim se passaram 20 anos. Jornal Zero Hora. 19/01/2005. Porto Alegre. P. 6 e 7.
BRUNELLO, Aline Viviani; BORGES, Maria Fernanda Duarte Guimarães; TAKAHASHI, Vivian Cristina Bezerra. A Revista Bizz/Showbizz no jornalismo musical brasileiro da década de 90. Monografia de conclusão de curso de jornalismo da Universidade de Ribeirão Preto, São Paulo. Disponível em: http://www.unaerp.br/comunicacao/i. Acesso em 28 de agosto de 2009.
FIGUEIREDO, Alexandre. A volta por cima. Observatório da Imprensa. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.combr/artigos.asp?cod=358JDB003. Acesso em: 17de julho de 2008.
GUIMARAENS, Edgar. Algo sobre Fanzines. Disponível em: http://kplus.cosmo.com.br/materias.asp?co+4. Acesso em: 22 de setembro de 2009.
MAFFESOLI, Michel. O Tempo das Tribos. 2 ed. Rio de Janeiro. Editora Forense Universitária, 1998.
Contribuição do leitor Marcelo Pimenta e Silva, natural de Bagé/ Rio Grande do Sul, nascido em 11 de outubro de 1979. Jornalista pela Universidade da Região da Campanha – Urcamp, atua como assessor de imprensa e pesquisador. E escreve artigos sobre política e cultura em geral.
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