sexta-feira, 20 de abril de 2012

Pontes



Olá, caros leitores!


     Iniciamos hoje na Coluna As Horas. Apresentaremos por aqui textos que resultam de uma feliz e importante parceria intelectual, teórica e emocional. Textos que refletem as longas horas, de longos diálogos, de uma simbiose de ideias e emoções. Começamos apresentando uma crônica, um tanto quanto reflexiva. Sensível, “Pontes” leva a um mergulho interior, a uma viagem existencial


Pontes


Adriano Almeida & Renata Cordeiro



     Gosto de poder ser um humano imperfeito. Porque o imperfeito não tem obrigação alguma com a perfeição. Gosto de pensar bobagens e me inquietar com tolices. As tolices, estas, me tomam boa parte dos pensamentos. Tenho perdido momentos importantes observando coisas corriqueiras, como as pontes e os rios. Não! Não insinuo que queira me jogar de alguma delas... Me perco vendo-lhes a fixidez, analisando-lhes a continuidade, muito embora as águas que lhes perpassam jamais voltem a ser as mesmas. Acredito ser exatamente essa novidade, sempre constante, o que me intriga e me atrai nas pontes...


     As pontes são um vinho doce e inebriante ao mostrar-me o tempo, mostrar-me que depois de águas turvas e turbulentas vêm passagens de águas claras e mais calmas... As pontes me fazem um mergulho. Sim! Um mergulho... E não sou eu quem mergulha tomando-as como trampolim, são elas próprias a mergulharem... Acredito hoje que somos todos, eu e os outros paranóicos, os urbanóides pós-modernos que se deixam por tempos a observarem pontes, todos nós oceanos profundos. Ao nos fixarmos fitando uma ponte e suas águas, permitimos que elas nos mergulhem tão longícuamente quanto o longo leito que suas águas irão percorrer até a foz. 


     Por estas pontes já se foram muitas inquietudes, inúmeras incertezas. Foram medos e desencantos. Foram, também, águas que eu desejava, por um instante, que voltassem... Sobre as pontes eu despejei já muitas raivas, muitos elos, malditos! Pesos que jamais deveriam ter estado e que as águas tranqüilas levaram para muito além, onde eu jamais pudesse ver. Sobre as pontes e vendo as águas, ao pôr-do-sol, já saciei a minha sede, já banhei-me de novas ideias, me reergui e me apaixonei. Posto que as pontes são, elas próprias, elos, entre o que se foi e o que virá, entre o que entregamos ao destino e o que recebemos dele. Pontes são mais que caminhos, são o início e o fim, de um eterno recomeço.





Adriano de Almeida é pesquisador na área de cultura, imaginário e simbologia do espaço. Mineiro, tem se dedicado a escrever poemas, crônicas e contos. Seus escritos, de caráter introspectivo, retratam, quase sempre, questões da existencialidade humana.








Renata Cordeiro é uma historiadora-musicista. Cantora, compositora, mineira. Como escritora tem percorrido os caminhos da crônica, da poesia e das narrativas em prosa. Suas produções se fazem numa simbiose entre elementos que vão da música aos profundos insights históricos.

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