sábado, 28 de julho de 2012

Oswaldo Goeldi: Sombria Luz do "outro do modernismo"


"Que estranho homem será esse que resolve as nossas emoções mais subterrâneas com figuras de pavor, de solidão e tristeza. Que sortilégio especial emana daqueles quadrados escuros saídos da madeira e que nos gritam um apelo tão profundo e dramático, despertando inesperadas ressonâncias?"
Raquel de Queiroz



Oswaldo Goeldi em seu ateliê, no Rio de Janeiro, década de 1940

Está em cartaz na Grande Sala do Museu e Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP) a mostra Oswaldo Goeldi: Sombria Luz, com curadoria de Paulo Venâncio Filho. Trata-se da maior retrospectiva do artista carioca, que traz cerca de 200 obras, entre gravuras, desenhos originais e matrizes, trabalhos produzidos no período que vai da década de 1920 até sua morte, em 1961.


Detalhe: Oswaldo Goeldi, Luz Noturna, c. 1960, xilogravura póstuma, coleção particular


Oswaldo Goeldi, Chuva, xilogravura, 1957, Coleção Maurício Fleury Buck

Um dos maiores expoentes da gravura brasileira, Oswaldo Goeldi nasceu na Ladeira do Ascurra, no Rio de Janeiro, em 1895, filho de uma brasileira e do eminente naturalista suíço Emílio Augusto Goeldi - que veio ao Brasil a convite de Dom Pedro II para a grandiosa empreitada de estudar os aspectos naturais do país, trabalho que frutificou no Museu Emílio Goeldi, no Pará. Viveu em Belém do Pará até os seis anos, em função das atividades profissionais desenvolvidas pelo pai pesquisador, logo seguiu para Berna - terra natal de seu pai - e posteriormente para Zurique, onde estudaria na Escola Politécnica (1915).
Durante a Primeira Guerra Mundial, Goeldi é enviado como sentinela à fronteira da Suíça com a Áustria. Nesse período de conturbação mundial, Goeldi ainda era estudante de engenharia na Escola Politécnica. Vigiando um distante posto suíço, estabelece comunicação com um soldado austríaco, Martin Wergner, que mais tarde se casaria com sua irmã, Matilde. Oswaldo e Martin tornam-se amigos.
Oswaldo teve uma relação conflituosa com a família. Após o falecimento do pai, o cunhado Martin Wergner, casado com sua irmã caçula, Matilde, domina a família e expulsa o artista de casa, por condenar os seus hábitos boêmios e por não compreender sua arte, de traços densos e marcada por forte tenebrismo, o que parecia esquisito. Wergner obriga Oswaldo a formalizar a desistência da parte que lhe cabia na herança paterna e o obriga a uma espécie de exílio na Europa, o deixando com apenas um conto de réis.
Goeldi aprende a expurgar, em muito, os seus afetos tempestuosos por meio de sua arte. Em 1915, começa a desenhar, "obedecendo a uma necessidade interior", como afirmou anos mais tarde em uma entrevista. Assim, ingressa à Escola de Artes e Ofícios de Genebra em 1916. Decepciona-se com a escola e dedica-se ao trabalho no ateliê com dois pintores, Serge Pahnke (1875-1936) e Henri van Muyden (1860-1936). Permanece um tempo curtíssimo sob a tutela dos artistas e resolve continuar seu trabalho artístico isoladamente, seguindo suas necessidades interiores, sempre a desenhar muito. Em 1917, abandona definitivamente os estudos de engenharia e passa a dedicar-se exclusivamente à pintura. Oswaldo Goeldi não ficou à sombra do pai. Vai se tornar notável por seu trabalho. Realiza, então, a primeira exposição, na Galeria Wyss, em Berna, evento que propiciou o primeiro e definitivo contato com a obra de de Alfred Kubin. Datam dessa época suas três maiores influências artísticas: os simbolistas, Paul Gauguin, Edvard Munch e Alfred Kubin.



Paul Gauguin, Te Atua (The Gods) de Noa Noa, 1893-1894, xilogravura, uma da série de xilogravuras, The Museum of Modern Art, doação de Abby Aldrich Rockefeller



Edvard Munch, Madonna (Liebendes Weib), xilogravura, 1895, coleção particular



Edvard Munch, O Beijo da morte, litogravura, 1899, Munch Museet, Oslo


Alfred kubin, Train of hair, pena, nanquim, lavada, spray vermelho, c. 1900-1903, coleção particular



Alfred Kubin, Marguerite, 1938, aquarela, tinta injetada, Coleção de Artes Gráficas, Oberösterreichische Landesmuseen, Viena



Oswaldo Goeldi, Solitário, xilogravura, 1950, Coleção Maurício Fleury Buck


Após retornar à terra natal, em 1919, humildemente, executa ilustrações para a revista Para Todos e para o jornal A Manhã. Dedica-se, por certo período exclusivamente a ilustração de periódicos e livros. Faz dessa atividade seu meio de subsistência. Mais adiante, em 1924, também realiza trabalhos para a revista O Malho. São notáveis suas ilustrações para o romanceO Idiota, do escritor russo Fiódor Dostoievisky, para a Editora José Olympio, reeditado novamente pela Editora 34. A longa trajetória de ilustrador lhe permitiu atingir um nível de comunicação mais amplo com o público, para além das mostras de artes plásticas.






Oswaldo Goeldi, Ilustração para a primeira edição brasileira do romance "O Idiota", de Dostoievsky,

Jornal A Manhã, suplemento "Letras e Artes”: Rio de Janeiro, 12/09/1946, ano 3, nº 98, p.6, Desenho a nanquim, assinado, 14,5 x 10,5cm,Coleção Academia Brasileira de Letras, Biblioteca Lúcio de Mendonça




Capa da edição da Editora 34 da obra "O Idiota" de Dostoievisky com ilustrações de Oswaldo Goeldi


Em 1920, Goeldi expôs seus desenhos pela primeira vez no Brasil, em 1921, no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro. Recebeu críticas contundentes do jornalista, também de descendência germânica, Erwin Zach, que considera os seus trabalhos marcados por uma percepção marginal de mundo, beirando o "fabuloso e lúgubre" a la Edgard Alan Poe e Nikolai Gogol. Goeldi plasmaria "criações monstruosas de um talento satânico", como descreve Zach no artigo "Um artista desconhecido" em O Jornal, edição de janeiro de 1926. Na realidade, o estranhamento se dava pela tempestuosidade emocional e caráter goticista que jorravam da plasticidade goeldiana. Goeldi arranca sua arte de seu coração, do inconsciente, da percepção acerca do marginal, do que se torna renegado, do mundo interior. Contudo, o jovem Oswaldo contou com o decisivo incentivo de Emiliano Di Cavalcanti. Em 1923, conhece Ricardo Bampi, que o inicia na xilogravura. Começou, então, a gravar em 1924, demonstrando capacidade ímpar na apreensão do cotidiano carioca, tal qual Di Cavalcanti fazia com imensa maestria.


Emiliano Di Cavalcanti, Mulatas, óleo sobre cartão, 1969, coleção particular



Oswaldo Goeldi, Três Mulheres, xilogravura, 1930, Coleção Maurício Fleury Bucky


Em agosto de 1926, buscando aprovação à sua obra, sentindo-se "abandonado" pela crítica de arte carioca, presa ao modernismo brasileiro canônico, envia uma carta ao artista austríaco Alfred Kubin:

Caro Senhor Kubin, queria ter a bondade de olhar os meus desenhos. (...) A forte influência que o senhor exerce sobre mim, sem dúvida, se nota logo. (...) Num momento crítico da minha vida foi o senhor que me deu forças.
O artista austríaco respondeu entusiasmado. Goeldi recebe o aval do mestre inspirador. Tomado pelo sentimento de ter um encontrado alguém com quem partilhasse da mesma "estrutura primária de personalidade", Kubin qualifica seus trabalhos como tecnicamente magistrais. A troca epistolar entre os artistas se frutificou por muitos e muitos anos e a profusão de ideias desse encontro deixou marcas relevantes na trajetória de Oswaldo. O artista brasileiro chega visitar o austríaco em 1930.



Alfred Kubin, O Filho Pródigo, litogravura, sem data, coleção particular




Oswaldo Goeldi, “Sem título”, Desenho a nanquim sobre papel arroz,

(Assinado canto inferior esquerdo), coleção particular



Alfred Kubin, Na lagoa de pesca (Am Fischteich) de Ein Neuer Totentanz (A Nova Dança da Morte), desenho a bico de pena e nanquim de 1938, reprodução litográfica de 1947, Museum of Modern Art of New York






Oswaldo Goeldi, Um Sorriso Por Favor, bico de pena, c. 1940, Coleção Ary F. Macedo



O artista e pesquisador Carlos Zílio o apelidou “o outro do modernismo”, pois Oswaldo estaria posicionado à parte da corrente do movimento modernista no Brasil, dadas sua falta de compromisso com uma pauta nacionalista e sua desconfiança quanto à institucionalização do modernismo, entregue, após 1930, às suas relações com o propósito cultural do estado-novismo. Manteve-se distante de qualquer noção rasteira de modernidade e brasilidade, aquela muito marcada por um referencial solar e exotista. Recusou-se a subordinar sua arte a um projeto ideológico já constituído, primou por preservar em sua obra um ideal universal e profundo de humanidade, talvez por influência de sua veia germânica. Sua poética, em busca de uma revelação do mistério do mundo, dos pequenos segredos do ser e do existir, enfatiza a solidão do ser humano, o cotidiano, a aridez do trabalho, o lado trágico, sombrio e violento da vida. Goeldi exalta as noites silenciosas que com suas estrelas consolam os indivíduos solitários. Seus temas e personagens são anônimos – sobrados, pescadores, vagabundos, transeuntes das cidades ensurdecidas etc., voltou-se aos homens comuns, heróis do cotidiano – eles destilam um intimismo sombrio e transcendental claramente inspirado pelo pathos munchiano, com uma carga de dramaticidade muito próxima daquela do mestre norueguês. De Munch e de Kubin brota o caráter expressionista da obra de Oswaldo Goeldi, produzindo uma linguagem particular dentro do modernismo brasileiro.

Segundo o curador da mostra em cartaz no MAM-SP, sua visão obscura e melancólica do Rio de Janeiro, assim como de suas realidades marginais, do desarranjo, da desestruturação, sem ser piegas ou panfletário, visada esta que contrasta com a temática solar proposta por muitos de seus contemporâneos. A proposta do museu paulistano é apropria-se desse universo em duas mostras que enfocam aspectos distintos do mestre gravador e desenhista.




Edvard Munch, Amanhecer na praia, 1930, óleo sobre tela, Munch Museet, Oslo


Edvard Munch, O Grito, 1895, xiloravura, Munch Museet, Oslo, Noruega


Oswaldo Goeldi, Por do sol, xilogravura, sem data, coleção particular


Edvard Munch, O velho pescador, 1897, Henie Onstad Kunstsenter



Oswaldo Goeldi, Pescadores, xilogravura, c. 1955, Coleção particular



Oswaldo Goeldi, Pescadores, xilogravura, c. 1955, Coleção particular

Ao lado do lituano naturalizado brasileiro, Lasar Segall, Goeldi seria a primeira grande expressão da gravura brasileira moderna. Em princípio – até cerca de 1937 -, marcada pelos contrastes em preto e branco, suas gravuras em madeira só paulatinamente foram tensionando o uso da cor.


Lasar Segall, Dor, 1909, litografia



Lasar Segall, Mulheres errantes, 1919, xilogravura

Na década de 1930, lança o álbum 10 Gravuras em Madeira de Oswaldo Goeldi, com introdução de Manuel Bandeira (1886 – 1968), faz desenhos e gravuras para periódicos e livros, como Cobra Norato, de Raul Bopp (1898 – 1984), publicado em 1937, com suas primeiras xilogravuras coloridas. Em 1941, trabalha na ilustração das Obras Completas de Dostoievsky, publicadas pela Editora José Olympio. Em 1952, inicia a carreira de professor, na Escolinha de Arte do Brasil, e, em 1955, torna-se professor da Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), no Rio de Janeiro, onde abre uma oficina de xilogravura.



Oswaldo Goeldi, Subúrbio (Tropischer Garten), xilogravura, c. 1930, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro


Oswaldo Goeldi, Cena urbana, homem e cachorro, xilogravura 02/12 - 14 x 18 cm - Primeira tiragem póstuma de Oswaldo Goeldi por Reynal, 1973




Oswaldo Goeldi, Gato e peixe, xilogravura 5/12 - 23 x 30 cm - ass. inf. direito. Primeira tiragem póstuma de Oswaldo Goeldi, realizada por Beatriz Reynal 1973. Reproduzida no livro do artista “Osvaldo Goeldi Mestre Visionário”, página 60. Reproduzido no livro Um Auto-Retrato de Oswaldo Goeldi, página 67



A excepcionalidade de Oswaldo Goeldi é notada em seu legado, artistas como Iberê Camargo, Cildo Meireles e Lygia Pape, que se inspirou na gravura do emblemático guarda chuva vermelho para criar o curta metragem O Guarda chuva vermelho, em 1971.



Iberê Camargo, Ciclista 3, Água-tinta (processo do guache e lavis), 1991, Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre

No lírico texto o poeta e crítico de arte maranhense Ferreira Gullar descreve tão bem o artista e seu fazer artítisco:

Goeldi, expressionista, (...). Preocupado com o mistério do mundo, com o significado do ser e do existir, ia buscando na paisagem os pequenos segredos da existência, segredos que desvendava à custa de lágrimas e suor, à custa de um trabalho árduo, mais que cotidiano, um trabalho de todas as horas, com o sol e, principalmente, com a noite.
Com a goiva abria os sulcos da vida; com incisões firmes, traçava os caminhos da luz, essa luz terrivelmente forte a recortar os perfis dos homens magros, dos trabalhadores do mar e dos animais abandonados. Dava à madeira uma função nova, criava-lhe a seiva perdida, fazia-a participar de novo da vida esvaída há tempos. A madeira lisa se transformava num mundo fantástico, de peixes, homens, animais, casas: Goeldi, o artista, derramava a sua alma, como um raio e como tinta. Mesmo a morte vem iluminada entre os corvos e galhos de árvores secadas.
Este mundo fantástico surrealista, que Goeldi criou, mostra, antes de tudo, a alma generosa do homem, este que soube compreender os homens, que soube misturar-se com eles, bebendo a dor e as alegrias simples; soube dar a mão aos bêbados perdidos na chuva e soube cantar ou chorar com as criancinhas, aquelas dos bairros pobres, aquelas que buscavam canal para a sua expressão própria, na escolinha, aquelas que se perdiam no lamaçal, catando restos para matar a fome. Goeldi, transpôs, como nenhum outro o soube, todas estas experiências para os planos da arte e a purificou a um tal grau que acabou lhe garantindo a eternidade. Goeldi construiu o fantástico.
Mas a essa fantasia, aliava-se uma exigência objetiva de artesão, que talhava a madeira com extremo rigor, para tornar realidade e comunicação as suas experiências profundas.
A par de suas experiências humanas, foi descobrindo no trabalho artesanal, novas possibilidades de expressão dentro do gênero. Experiências que aos poucos foram dando à sua gravura maior comunicação e impacto. A técnica se enriqueceu vagarosamente, não foi por acaso que começou a usar as cores. E, usou-as, não para efeito decorativo, como tradicionalmente é empregada, mas como elemento expressivo, integrado à composição. Ele próprio disse: "Não fiz da gravura uma forma mecânica; ainda tenho esperanças, faço descobertas e gravo com a mesma satisfação de há 40 anos."
texto de apresentação de Ferreira Gullar para o livro Goeldi, de José dos Reis Junior, publicação da Civilização Brasileira, Coleção Panorama das Artes Plásticas, Rio de Janeiro, 1966.
[Texto publicado no Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 1966.]



Oswaldo Goeldi, Ventania, xilogravura, sem data, coleção particular


Oswaldo Goeldi, Garças, xilogravura 05/12 - 28 x 22 cm - ass. inf. direito. Reproduzida no livro do artista “Oswaldo Goeldi Mestre Visionário”, página 62


Em 1995, o Centro Cultural Banco do Brasil realiza exposição comemorativa do centenário do seu nascimento, no Rio de Janeiro. Em 2010 é realizada no Centro Cultural dos Correios no Rio de Janeiro, uma grande exposição comemorativa Goeldi: o encantador das sombras, pelos 50 anos de morte do artista.

A mostra em cartaz no MAM-SP lança outro olhar à obra de Goeldi, evitando lugares comuns, não há lugar para uma visão linear da obra do artista. A ordem cronológica é substituída por características recorrentes na obra do desenhista/gravador para criar os agrupamentos dos trabalhos em exposição. Tais conjuntos são formados eixos temáticos, que trazem uma certa visão do espaço urbano carioca, suas ruas, casarões e transeuntes de um Rio em processo de modernização e urbanização; assim como por afinidades plásticas, com predominância da técnica da xilogravura - que a partir de um determinado momento de sua produção ganha cores para contrabalançar a constância do negro -, do desenho e da gravura próxima ao desenho, e da exploração de luz e sombra. Dessa forma, o projeto expográfico busca fragmentar o espaço expositivo, isso possibilita aos visitantes vários percursos distintos em vez de um trajeto único.
O visitante pode também adentrar o universo do artista ao explorar o módulo que recria o ateliê de Goeldi no Leblon. Lá estão a prensa, algumas matrizes e desenhos, a escrivaninha, a cadeira, a luminária, o relógio, a cama e o mancebo com objetos, como capa, chapéu e guarda chuva, que aludem a cenas de muitas de suas gravuras, além de fotos, documentos e livros que ilustrou.
Vale a pena atentar para a sala dedicada ao trabalhos de Goeldi que referenciam o "Totentanz" (também referida como Dança Macabra ou Dança da Morte), a alegoria artística do final do medievo que marca a tradição cultural e iconográfica europeia, sobretudo nos domínios germânicos e eslavos e que trata sobre a universalidade da morte, expressando a ideia de que não importa o estatuto de uma pessoa em vida, a vaidade é perda de tempo (vanitas),a dança da morte une a todos. Esta parte da obra goeldiana tem inspiração no trabalho do mestre austríaco Alfred Kubin, e trabalha a tradição iconográfica exaltando seu simbolismo característico, porem acentuando-a com boa dose de sarcasmo. Há também a sala dos desenhos, muitos a carvão, que mostram a influência do simbolista francês, Odilon Redon na obra de Oswaldo Goeldi. As gravuras clássicas em negro e vermelho, como em Chuva, são inesquecíveis, e duas versões da obra abrem e fecham a mostra.




Oswaldo Goeldi, "Abandono", xilogravura, c. 1937, assinada xilogravura a cores, sem numeração 17,3 x 21,8 cm Coleção Ary Ferreira de Macedo





Oswaldo Goeldi, Tarde, xilogravura, 1950, Coleção Maurício Fleury Buck




Oswaldo Goeldi, Céu Vermelho, xilogravura, 1950, Coleção Maurício Fleury Buck

Goeldi fez da técnica da gravura sua grande paixão, seu meio mais extraordinário de expressão da sua fértil individualidade e de sua sensibilidade. A precisão com que Goeldi desenhava, gravava e imprimia, e a determinação com que obtém os mais refinados contrastes entre o negro e o branco é fruto da experimentação e do estudo das possibilidades inerentes ao material. Alcançar resultados tão expressivos só foi possível após anos de luta diária com a resistência da madeira, com a aplicação de quem sabe aonde chegar, vencendo passo a passo os obstáculos impostos por todas as limitações, tanto as da natureza individuais quanto a as exógenas. Goeldi disse certa vez: "Não fiz da gravura uma forma mecânica; ainda tenho esperanças, faço descobertas com a mesma satisfação de há 40 anos."
Em uma entrevista realizada em 1956, Goeldi se manifesta sobre sua expressão individual: "Acho que o caminho do artista é o individualismo. (...) Muita coisa está morta porque o indivíduo quase não existe, tende a opinar num sentido coletivo".
E prossegue o pensamento acerca de sua singularidade, "Nunca sacrifiquei a qualquer modismo o meu próprio eu - caminhada dura, mas a única, que vale todos os sacrifícios." (Rio, 22. jun. 1949)
Vitimado por um enfarto, em 15 de fevereiro de 1961, o mestre gravador Goeldi morreu com a mão no coração e sozinho como viveu, em seu pequeno ateliê ( à Rua Almirante Guilhen, no Leblon, Rio de Janeiro, cercado por seus livros e pedacinhos de madeira em que gravou sua obra.



Detalhe: Oswaldo Goeldi, Autorretrato, xilogravura, 1950, Coleção Maurício Fleury Buck

Nos versos de Carlos Drummond de Andrade, Goeldi é celebrado:

(...) És metade sombra ou todo sombra?
Tuas relações com a luz como se tecem?
Amarias talvez, preto no preto,
Fixar um novo sol; noturno; e denuncias
as diferentes espécies de trevas
em que os objetos se elaboram:
a treva do entardecer e da manhã;
a erosão do tempo no silêncio;
a irrealidade do real. (...)

Carlos Drumond de Andrade, Trecho da homenagem A Goeldi - a vida passada a limpo (1958) publicada no Jornal Macunaíma, n.4, Rio de Janeiro, agosto de 1961- ano I.

In Ars Veritas

Para conhecer um pouco mais sobre a vida e obra de Oswaldo Goeldi:

Centro virtual de documentação e referência Oswaldo Goeldi


Exposição de 42 obras de Oswaldo Goeldi, mais 15 obras literarias ilustradas pelo artista e ainda dois videos institucionais. Coleção André Buck, Curadoria Lani Goeldi, Coordenação e realização Projeto Goeldi


O trecho do documentário de autoria de Olívio Tavares de Araújo traz um resumo histórico da gravura, com base em depoimentos de artistas que se utilizam desta técnica em suas obras, incluindo Oswaldo Goeldi. O documentário faz parte da iniciativa do Itaú Cultural de pesquisar e divulgar os Aspectos da Cultura Brasileira.

Bibliografia:
ABOS, Márcia. O Brasil sombrio e solitário de Goeldi é exposto em SP. O Globo, Rio de Janeiro, 14. jun. 2012, Segundo Caderno, p. 12.
ABREU, Laura Maria Neves de. Oswaldo Goeldi: desenhos, matrizes e gravuras - acervo Museu Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro: Museu Nacional de Belas Artes, 2008.
CARDOSO, Rafael. A arte brasileira em 25 quadros. Rio de Janeiro: Record, 2008.
CHILVERS, Ian (Org.). Dicionário Oxford de Arte. Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
CYPRIANO, Fabio. O Antitropicalista. Folha de S. Paulo, São Paulo, 14. jun. 2012, Ilustrada, p. E3.
____________. Goeldi viveu rejeição familiar e exílio. Folha de S. Paulo, São Paulo, 14. jun. 2012, p. E3.
ELEOTÉRIO, Anderson. Goeldi: Luz Noturna. São Paulo: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, 2009.
GONÇALVES FILHO, Antonio. A Sombra de Goeldi. O Estado de S. Paulo, São Paulo, ANO XXVII, N° 8762, 14. jun. 2012, Caderno 2,Visuais. Inauguração, p. D1.
___________. Goeldi: a luz que vem das trevas. O Estado de S. Paulo, São Paulo, ANO XXVII, N° 8762,14. jun. 2012, Caderno 2,Visuais. Inauguração, p. D5.
MACHADO, Anibal M. Goeldi. Rio de Janeiro:Ministério da Educação e Cultura, 1955.
NAVES, Rodrigo. Goeldi. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
RIBEIRO, Noemi. Oswaldo Goeldi: Um auto-retrato - Exposição Comemorativa do centenário de nascimento - 1895-1961. Centro Cultural Banco do Brasil, 1995.
RUFINONI, Priscila Rossinetti. Oswaldo Goeldi: Iluminação, Ilustração. São Paulo: Cosac & Naify, 2006.
SERVIÇO NACIONAL DA INDÚSTRIA - GALERIA DE ARTE; RIBEIRO, Noemi. Oswaldo Goeldi: mestre visionário. São Paulo: SESI, 1996.
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Calculo da Expressão - Goeldi, Segall, Ibere. São Paulo: IMESP, 2010.



Mariana Zenaro é graduada e licenciada em História pelo Centro Universitário Fundação Santo André e bacharel em Comunicação Social, com ênfase em Jornalismo, pela Universidade Metodista de São Paulo. Tem Pós-Graduação, MBA em Bens Culturais: Cultura, Economia e Gestão, pela Fundação Getúlio Vargas. Frequentou os cursos livres de História da Arte na Escola do Museu de Arte de São Paulo (MASP) por dois anos e meio. Trabalhou em Museus, Arquivos e Instituições Culturais. Foi voluntária no Centro de Documentação e Biblioteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Dá cursos e palestras sobre história da arte em fundações, centros culturais e no Centro de Capacitação para professores da rede pública municipal de São Caetano do Sul (CECAPE- SCS). Atualmente trabalha na divisão de pesquisa e produção da Difusão Cultural da Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul.

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