terça-feira, 23 de outubro de 2012

O nome da Rosa




Quem escreve ficção sabe o quão difícil pode ser batizar um personagem. Horas, dias, semanas para dar nome aos bois, vacas, bezerros, a todo tipo de gente. Agora imaginem só a angústia de quem escreve ficção e está a poucos meses de ser mamãe de uma garotinha linda, fofa, cúti-cúti dos pés à cabeça. É o caso de uma querida amiga, a Diva.

Ela já visitou o alfabeto inteirinho: de Amanda a Zuleica, passando por Beatriz, Carolina, Estela, Fernanda, Gabriela, Júlia, Laura, Nívea, Patrícia, Renata, Sofia, Tatiana e Vanessa. Nada, nada lhe agradou. Substantivos próprios, sem dúvida, mas excessivamente comuns para sua filhota do coração − que merece, segundo palavras dela, "um nome exclusivo".

Como Diva é pessoa levemente cabeçudota − incapaz de resistir a filme do Godard numa sessão à meia-noite ou a palestra sobre Kant num domingo à tarde , sugeri-lhe uma homenagenzinha a qualquer filósofo de renome. Opções exclusivas não faltariam: Adornanda, Aristoteia, Hegelina, Nietzscha, Platoneide, Sartrina, Socratânia, Umberta...

Eca.

Diva detestou todas. Passou, então, a cogitar nomes estrangeiros: Annie, Drew, Felicity, Hillary, Julie, Kate, Meryl, Sharon. Mas logo desistiu deles por considerá-los simplesinhos demais.

Oh. My. God.

Ainda insatisfeita, ela resolveu se arriscar pelo perigoso território dos compostos: Ágatha Maria, Cecília Roberta, Felipa Gertrudes, Giovana Dinorá, Jezebel Helena, Melissa Catarina, Teodora Betânia, Zenaide Paloma. Graças a um milagre de São Pelópidas dos Nomes Multissílabos, não se apaixonou por nenhum.

Cansada de tanta procura, decidiu enfim esperar o nascimento. Quem sabe não encontrasse "o" nome ao ver a criança. Quem sabe a garotinha linda, fofa, cúti-cúti dos pés à cabeça não viesse com etiqueta de identificação ou crachá pendurado na chupeta. Quem sabe suas bochechas não desabrochassem sugestivamente rosadas.

(Desabrocharam.)








Fábio Flora é autor de Segundas estórias: uma leitura sobre Joãozito Guimarães Rosa (Quartet, 2008) e escreve no Pasmatório (http://pasmatorio.blogspot.com.br).

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