segunda-feira, 10 de junho de 2013

Pé na estrada



Larguei minhas coisas assim que cheguei e caí no Sena. De barco, óbvio. A Sacré Coeur, o Quartier Latin, a Torre Eiffel – Paris comme il fautPasseio quase perfeito se eu não tivesse descido no ponto errado e parado pra lá de Marrakesh, no meio do souk, o mercado a céu aberto dentro da medina.

Só estou dando uma olhadinha? Que nada. Os vendedores partiram pra cima de mim feito gaviões. Corri. Corri muito. Corri até me sentir seguro como na Suíça. Peraí. Eu estava na Suíça. No jardim secreto de Montreux, em pleno festival de música, a Andrea do The Corrs cantando “Breathless”.

O ar se rarefez. Desmaiei, claro. E só abri os olhos de novo – pasmem à vontade – em Machu Picchu. Detalhe: com um xamã me servindo ceviche. Madrecita, que sabor. Ficaria horas ali, diante da Porta do Sol, degustando a iguaria se não fosse o fôlego me faltar mais uma vez. Desmaio dois, a missão.

Acordei no sofá de casa. Coluna torta, cabelo amontoado. Completamente Dorothy depois do furacão. O livro da Martha – Um lugar na janela – escorregando pelo corpitcho magrinho deste que vos escreve meio sonado, meio sonhado. Não necessariamente fifty-fifty.

Mas certamente cento e um por cento a postos para o próximo atenção-senhores-passageiros, o próximo apertem-os-cintos, o próximo encontro com aquele moço no espelho. Que viajar não é fuga, bem diz a autora. É entrar no Magic Kingdom e despertar o Peter Pan; é piquenicar na Place des Vosges e rejuvenescer o Alain Delon; é sair pra um retiro espiritual em Noronha e ressuscitar o Jacques Cousteau.

(De preferência, nadando com tartarugas gigantes.)

Enfim: viajar é fazer um check-in de si mesmo. É guardar o zumbi no armário, vestir o Indiana Jones e caçar as tantas arcas perdidas por esse mundo cheio de graais. É tirar o pé da cova do dia a dia – do rame-rame de quem espera horas o técnico da geladeira enquanto vê todos os RJ-TVs – e pôr os dois pés na estrada.

A cabeça pra fora da janela.

No meu caso, reencontrar aquele sujeito de malas sempre prontas e com excesso não de bagagem, mas de sonhos – e ainda muitas páginas vazias no passaporte.







Fábio Flora é autor de Segundas estórias: uma leitura sobre Joãozito Guimarães Rosa (Quartet, 2008) e escreve no Pasmatório (http://pasmatorio.blogspot.com.br).

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