quinta-feira, 3 de abril de 2014

DIANE WAKOSKI, poeta (EUA)

         
Nascida na Califórnia, em 1937, de origem polonesa e proletária, Diane Wakoski é uma poeta muito prolífica, mas pouco conhecida por aqui.  Pese as ressalvas que ela diz ter de ser identificada como uma poeta “feminista” (“One of the reasons I have not been wanting to be called a feminist poet is that the label seems to lump all women writers together, as if we have a common message. I am not even sure that I have a message, but if I do, it is full of contradictions and paradoxes and perhaps even baffling” ), sua voz articula, à sua maneira – observando, sentindo, se permitindo todas as viagens possíveis, sem exigências de “coerência ideológica” - um olhar sobre a vida desde uma perspectiva de sujeito-mulher, crítica e por vezes, denunciadora das desigualdades culturais de gênero.




Eu particularmente tenho quatro livros dela (pouco, pensando que ela já publicou mais de 40), cada um deles gasto e marcado pelos anos, viagens, lidas. Venho nestes dias relendo Medea the Sorceress (Black Sparrow Press, 1995), um trabalho que me parece genial. É composto por poemas, cartas e até pequenos extratos de um livro sobre física quântica (para acrescentar reflexões sobre várias questões : por exemplo, o que é o “real”, ou o caráter inseparável de corpo, matéria, pensamento e imaginação ...) Também neste livro ela aborda sua passagem para a “meia-idade”. E prevalece nele uma linguagem quase cotidiana, mas metaforicamente rica e sempre casada com reflexões filosóficas; trata-se portanto de um cotidiano denso, onde cada coisa, por “banal” que pudesse ser, se carregue de denso significado existencial onde poderemos encontrar a nós mesmos (mesmas), com nossas problemáticas partilhadas. Emprega muita ironia, e embora pretenda muitas vezes ser forte ou enfática naquilo que coloca, conserva também uma atitude brincalhona.

Cativam-me as diversas metáforas (figuras, “tropos”) que ela desenvolve para significar seu próprio caminho pela vida, que não só se repetem ao longo do livro senão representam uma continuidade com livros anteriores. Esboço apenas algumas, muito sinteticamente:

Medeia dos poderes mágicos: embora à procura do amor, encontra-se com a traição. Assim, se o desencontro e as expectativas (românticas, ridículas?) falidas caracterizam sua vida, desta surge a agência feminina - movida, principalmente, por ciúme, raiva e o desejo da vingança, é verdade E afinal, recupera para si um poder. Jason, quem a trai, significa, de diversas formas, todos os homens... ou quase todos.

A Carteira (“the Postmistress”). A portadora de cartas e mensagens (entre os ancestrais da poeta, há alguém que cavalgou o país pelo legendário Pony Express). Para esta personagem, a vida gira em torno da lógica da comunicação/conexão: o impulso de levar aos outros cartas e mensagens, de construir pontes através das palavras.

The Silver Surfer/Steel Man/King of Spain: as várias versões das fantasias erótico-amorosas da poeta.

O marinheiro, ou o pai: que na cultura patriarcal, é livre no sentido de ir e vir em função de si mesmo, e de quem não se deve esperar... que volte!

A dama da luz/o arquiteto da luz:  mulher, homem, qualquer um; evoca uma forma de assumir os desafios existenciais.





Temos – a poeta e escritora curitibana Sabrina Lopes e eu – realizado já várias traduções de poemas da Diane.  Por hoje, publicarei um mais curtinho, no qual a Diane nos expõe um pouco de sua “ars poética”:

 
A poesia, a imprevisível.

Você me faz perguntas
que eu posso responder.
Não me satisfazem,
como os pacotes de semente que descansam
sobre minha mesa:
a pimenta doce da Califórnia ou o aneto gigante,
sementes que talvez nem plante, e que com certeza
tem poucas chances de prosperar na casa de
alguém que viaja, planta sementes em vasos para depois
deixar os vasos para outros cuidarem.

Meu dedo verde me excita
porque não há resposta para a pergunta de
por que algumas coisas crescem enquanto outras
não-
e minhas aulas de botânica nunca me ensinaram por que algumas plantas
têm botão e
outras não.

Vejo só que as rosas me excitam
e outras coisas vivas.
E o oceano atrás da minha porta,
do outro lado das janelas,
nestes dedos;
é este o ruído.
Eu o amo/mas de noite intimida

O desconhecido,
O misterioso,
Aqueles de nós que precisamos saber tudo
descobrimos que quanto mais conhecemos,
mais o que não conhecemos
nos excita.

A poesia?
Com certeza o mais imprevisível?
Como as rosas do proprietário
desta casa, as que as minhocas
não devoraram.


(versão: Miriam Adelman)

 Consulte também:

Adelman, Miriam. Vida e poesia em Diane Wakoski.

Imagem:  Ana Luisa Sallas.

  


Nascida em Milwaukee, Wisconsin, a colunista da Contemporartes Miriam Adelman reside no Brasil desde 1991. Socióloga, tradutora e poeta, é professora da Universidade Federal desde 1992.  Publica regularmente e mantem um blog pessoal, Juntando Palavras (www.conviteapalavra.blogspot.com 

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