quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Há 50 anos...


Em 1º outubro de 1964, a viagem de pouco mais de 500 km entre Tóquio e Osaka se tornava mais rápida, passando das rotineiras seis horas e 40 minutos para cerca de quatro horas. O responsável por essa drástica diminuição de tempo foi o Shinkansen (jap. 新幹線 , “nova linha troncal”), mais conhecido entre nós como trem-bala (tradução da palavra japonesa dangan ressha, jap. 弾丸列車). Na época, com sua incrível velocidade de 220km/h, essa “nova” maravilha da engenharia ferroviária assombrou não só os japoneses, mas o mundo. Tornando-se umas das principais referências nipônicas nos dias de hoje.
O desejo pela criação de um trem de alta velocidade existia desde a década de 1930 no Japão. No entanto, ele só foi se materializar a partir do final da década de 1950, no início do chamado “milagre econômico” japonês. O trem-bala era  parte do gigantesco projeto visando preparar a cidade de Tóquio para receber às Olimpiadas de 1964. Cabe ressaltar aqui, que desde 1872, com a construção da linha pioneira ligando a capital Tóquio à cidade de Yokohama,  os trens são parte integrante da paisagem do arquipélago nipônico, ligando todo o país de forma rápida, segura e pontualíssima. Eu mesmo não consigo mais dissociar trens/estações da minha imagem sobre o Japão. O cotidiano japonês é regulado, entre outras coisas, pela pontualidade. Um território com área exígua, montanhosa e com um alto indíce de concentração populacional urbana, teve como um dos principais eixos do seu processo de modernização a construção de ferrovias. Desenvolvendo, em pouco mais de cem anos, um dos melhores e mais eficientes sistemas ferroviários do mundo. O Shinkansen, pode ser considerado a epítome deste processo. Só para se ter uma ideia da eficiência do sistema, no ano de 2012,  a média de atrasos dentre todos os Shinkansen em operação foi de 36 segundos. Além disso, em 50 anos de operação nunca foi registrado um acidente fatal. Tristemente, muitos dos acidentes fatais que acabam paralisando as linhas de Shinkansen  são causados por suicídios.


Desde sua primeira viagem inaugural em outubro de 1964 até os dias atuais o trem-bala vem sendo aprimorado tecnologicamente e esteticamente. No entanto, para mim a sua primeira versão (série 0) aposentada em dezembro de 2008 é a mais charmosa de todas as séries. Ela foi carinhosamente apelidada de 団子っ鼻( dangoopana jap. だんごっぱな) devido ao seu característico “nariz” arredondado.

Dentre os Shinkansen o que mais chama atenção dos japoneses - e a minha também - é a versão amarela ou “Dr. Yellow” (jap.ドクターイエロー).  Este “trem-bala”, como o próprio nome indica,  tem como objetivo checar e diagnosticar quaisquer problemas nas linhas, como também no sistema de cabos de transmissão de energia. O “Dr. Yellow” entra em ação a cada dez dias e na maioria das vezes,  trafega a partir do fim da noite, portanto, dificílimo de ser visto. Por isso muitos japoneses acreditam que é sinal de sorte caso você consiga ver um desses em ação. Eu nunca vi...



Sim, viajar de Shinkansen é realmente  uma experiência única. Administrado desde 1987 pelo grupo JR (Japan Railways), toda a estrutura ligada a este serviço é de primeiríssima linha. E como tudo o que é bom tem o seu preço, a passagem não é barata, mesmo para os padrões nipônicos. Algumas vezes fica “menos caro” viajar de avião do que de trem-bala, mas dependendo da distância, eu (e muitos japoneses) prefiro ir de Shinkansen. Na maioria das vezes em que usei este meio de transporte foi no trecho da linha Tôkaidô entre as cidades de Osaka e Tóquio, onde a cada dia cerca de 400 mil pessoas utilizam o serviço. O valor da passagem (ida e volta) pelo Nozomi (mais rápido)? Exatos 28,900 ienes ou cerca de 650 reais. A opção mais barata seria pegar o ônibus noturno que leva sete horas para percorrer os mesmos 550 km entre as cidades e custa cerca 5 vezes menos. Os ônibus também são muito bons, o único problema é o espaço, muito apertado para nós “ocidentais”, espaço que o Shinkansen tem de sobra, bem mais do que a classe econômica de um voo doméstico.
Atualmente a viagem entre Tóquio e Osaka leva exatas duas horas e 25 minutos. Existem sete linhas operando em todo o Japão e os modernos Shinkansen da série N700 operam com uma velocidade de 300km/h.

Otanjiyobi omedetou e vida longa a essa verdadeira obra-prima da engenharia !

Todas imagens publicadas na coluna possuem direitos autorais Copyright ©2014AkitiDezem




Fontes interessantes:


東海道新幹線ビジュアル大図鑑 (洋泉社MOOK 鉄道Special) Edição de fevereiro de 2014) (rômaji: Tôkaidô Shinkansen Bijuaru Daizukan) 

Dan Free, Early Japanese Railways 1853-1914. Engineering Triumphs that transformed Meiji-era Japan. Tokyo, Tuttle, 2008. 


http://www.japan-guide.com/e/e2018.html

Bela homenagem Shinkasen série 0:  http://www.youtube.com/watch?v=huIahNEnyM4
Este video (em inglês) é bem interessante: http://www.youtube.com/watch?v=pQha2xDSbbo
 Shinkansen Hayabusa (em japonês): http://www.youtube.com/watch?v=kMFEr7GizcU
Shinkansen “Dr. Yellow”(em japonês): http://www.youtube.com/watch?v=_IOlVYxxo4M









Rogerio Akiti Dezem é professor visitante de língua portuguesa e cultura brasileira da Universidade de Osaka, no Japão. Mestre em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), é autor de Matizes do Amarelo - A gênese dos discursos sobre os orientais no Brasil (Humanitas, 2005) entre outros livros. Além da História sua grande paixão é a Fotografia (http://akitidezemphotowalker.zenfolio.com/).





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