Há 50 anos...
Em 1º outubro de 1964, a viagem de pouco mais de 500 km
entre Tóquio e Osaka se tornava mais rápida, passando das rotineiras seis horas
e 40 minutos para cerca de quatro horas. O responsável por essa drástica
diminuição de tempo foi o Shinkansen (jap.
新幹線 , “nova linha troncal”), mais conhecido entre nós como trem-bala
(tradução da palavra japonesa dangan
ressha, jap. 弾丸列車). Na época, com sua
incrível velocidade de 220km/h, essa “nova” maravilha da engenharia ferroviária
assombrou não só os japoneses, mas o mundo. Tornando-se umas das principais
referências nipônicas nos dias de hoje.
O desejo pela criação de um trem de alta velocidade
existia desde a década de 1930 no Japão. No entanto, ele só foi se materializar
a partir do final da década de 1950, no início do chamado “milagre econômico” japonês.
O trem-bala era parte do gigantesco
projeto visando preparar a cidade de Tóquio para receber às Olimpiadas de 1964.
Cabe ressaltar aqui, que desde 1872, com a construção da linha pioneira ligando
a capital Tóquio à cidade de Yokohama, os
trens são parte integrante da paisagem do arquipélago nipônico, ligando todo o
país de forma rápida, segura e pontualíssima. Eu mesmo não consigo mais
dissociar trens/estações da minha imagem sobre o Japão. O cotidiano japonês é
regulado, entre outras coisas, pela pontualidade.
Um território com área exígua, montanhosa e com um alto indíce de concentração
populacional urbana, teve como um dos principais
eixos do seu processo de modernização a construção de ferrovias. Desenvolvendo,
em pouco mais de cem anos, um dos melhores e mais eficientes sistemas
ferroviários do mundo. O Shinkansen,
pode ser considerado a epítome deste processo. Só para se ter uma ideia da eficiência
do sistema, no ano de 2012, a média de
atrasos dentre todos os Shinkansen em
operação foi de 36 segundos. Além disso, em 50 anos de operação nunca foi
registrado um acidente fatal. Tristemente, muitos dos acidentes fatais que
acabam paralisando as linhas de Shinkansen
são causados por suicídios.
Desde sua primeira viagem inaugural em outubro de 1964
até os dias atuais o trem-bala vem
sendo aprimorado tecnologicamente e esteticamente. No entanto, para mim a sua
primeira versão (série 0) aposentada em dezembro de 2008 é a mais charmosa de
todas as séries. Ela foi carinhosamente apelidada de 団子っ鼻( dangoopana jap. だんごっぱな) devido ao seu característico
“nariz” arredondado.
Dentre os Shinkansen
o que mais chama atenção dos japoneses - e a minha também - é a versão amarela
ou “Dr. Yellow” (jap.ドクターイエロー). Este “trem-bala”, como o próprio nome indica,
tem como objetivo checar e diagnosticar quaisquer
problemas nas linhas, como também no sistema de cabos de transmissão de energia.
O “Dr. Yellow” entra em ação a cada dez dias e na maioria das vezes, trafega a partir do fim da noite, portanto, dificílimo
de ser visto. Por isso muitos japoneses acreditam que é sinal de sorte caso
você consiga ver um desses em ação. Eu nunca vi...
Sim, viajar de Shinkansen
é realmente uma experiência única.
Administrado desde 1987 pelo grupo JR (Japan Railways), toda a estrutura ligada
a este serviço é de primeiríssima linha. E como tudo o que é bom tem o seu
preço, a passagem não é barata, mesmo para os padrões nipônicos. Algumas vezes
fica “menos caro” viajar de avião do que de trem-bala, mas dependendo da
distância, eu (e muitos japoneses) prefiro ir de Shinkansen. Na maioria das vezes em que usei este meio de
transporte foi no trecho da linha Tôkaidô entre as cidades de Osaka e Tóquio,
onde a cada dia cerca de 400 mil pessoas utilizam o serviço. O valor da
passagem (ida e volta) pelo Nozomi (mais
rápido)? Exatos 28,900 ienes ou cerca de 650 reais. A opção mais barata seria
pegar o ônibus noturno que leva sete horas para percorrer os mesmos 550 km
entre as cidades e custa cerca 5 vezes menos. Os ônibus também são muito bons,
o único problema é o espaço, muito apertado para nós “ocidentais”, espaço que o
Shinkansen tem de sobra, bem mais do
que a classe econômica de um voo doméstico.
Atualmente a viagem entre Tóquio e Osaka leva exatas
duas horas e 25 minutos. Existem sete linhas operando em todo o Japão e os
modernos Shinkansen da série N700 operam
com uma velocidade de 300km/h.
Otanjiyobi omedetou e vida longa a essa verdadeira obra-prima da
engenharia !
Todas imagens publicadas
na coluna possuem direitos autorais Copyright ©2014AkitiDezem
Fontes interessantes:
東海道新幹線ビジュアル大図鑑 (洋泉社MOOK
鉄道Special)
Edição de fevereiro de 2014) (rômaji: Tôkaidô Shinkansen Bijuaru Daizukan)
Dan Free, Early Japanese Railways
1853-1914. Engineering Triumphs that transformed Meiji-era Japan. Tokyo,
Tuttle, 2008.
http://www.japan-guide.com/e/e2018.html
Bela homenagem
Shinkasen série 0: http://www.youtube.com/watch?v=huIahNEnyM4
Este video (em inglês)
é bem interessante: http://www.youtube.com/watch?v=pQha2xDSbbo
Shinkansen
Hayabusa (em japonês): http://www.youtube.com/watch?v=kMFEr7GizcU
Rogerio
Akiti Dezem é professor visitante de língua portuguesa e cultura brasileira da
Universidade de Osaka, no Japão. Mestre em História Social pela Universidade de
São Paulo (USP), é autor de Matizes do Amarelo - A gênese dos discursos
sobre os orientais no Brasil (Humanitas, 2005) entre outros livros.
Além da História sua grande paixão é a Fotografia
(http://akitidezemphotowalker.zenfolio.com/).
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