terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Tinha que ser o Chaves


Pois é, pois é, pois é. Foi só eu topar com uma enquetezinha boba – dessas que levam do nada a algum barril da memória – que me escapuliu aquela vontade nhonha de evitar a fadiga e esquecer a louça na pia. A pergunta do dia: é de groselha, limão ou tamarindo? Brincadeira. Ainda bem que o leitor tem paciência comigo; não tem? Sério agora. Queriam saber qual tinha sido o melhor episódio de todos os tempos da série criada por Roberto Gomes Bolaños, que faleceu na última sexta-feira, aos 85 anos, deixando muito mais que um "pi pi pi pi pi" mundo afora e, principalmente, na América Latina.

Sem querer querendo, o site oferecia mais que uma xícara de reminiscências, e recordava pérolas (ou seriam carambolas?) que iam da viagem a Acapulco – com seu entardecer ninado pelos versos de “Boa noite, vizinhança” – ao cineminha com toda a turma da vila – episódio que popularizou o bordão “Teria sido melhor ver o filme do Pelé” –, passando por inúmeros outros clássicos.

Mas, como qualquer lista, essa também tinha ausências dignas de um ai-que-burro-dá-zero-pra-ele, ainda que citasse duas dezenas de histórias inesquecíveis. O povo dos comentários – em geral a gentalha da rede – dessa vez prestou um serviço do tamanho do Sr. Barriga ao lembrar, entre vários tesouros e loterias inacreditavelmente ignorados pela pesquisa, os espíritos zombeteiros, o julgamento do Chaves e os “higiênicos churros da Dona Florinda”.

Como esquecer a Bruxa do 71, digo, a Dona Clotilde incorporando a médium enquanto o Chaves puxava a toalha da mesa e o Quico batia a cabeça na porta, fazendo com que todos acreditassem que os mortos estavam de fato se manifestando? Ou o Chaves (olha ele, olha ele!) perguntando ao Professor Girafales pela enésima vez se este se referia ao gato ou ao Quico? Ou, ainda, o Seu Madruga com chapéu e avental de chef?

Cada um deles deixou um gostinho de sanduíche de presunto na lembrança de quem os degustou. A ponto de até hoje os fãs rirem de falas – quando não as usam no cotidiano – como “Já chegou o disco voador”, “A vingança nunca é plena, mata a alma e a envenena” e “Não tem biscoito”. Entre tantas linhas memoráveis, guardo especialmente a sabedoria macunaímica de Don Ramón, Madruguinha para os íntimos: “Não existe trabalho ruim. O ruim é ter que trabalhar”.

A louça na pia que o diga.








Fábio Flora é autor de Segundas estórias: uma leitura sobre Joãozito Guimarães Rosa (Quartet, 2008), escreve no Pasmatório, tem perfil no Twitter e no Facebook.

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