POETANDO II
Animada
com a (boa!) repercussão do texto anterior, novamente me dirijo ao passado, ao
abrir os cadernos de poesia que confeccionei na minha adolescência.
Inspiradíssima
pela geração do Mal do Século, a segunda geração do Romantismo brasileiro, escrevi
algumas poesias num tom bem pessimista, o que combinava perfeitamente com meu
estado de ânimo adolescente.
Lembro
que dessa escola literária meu poeta favorito era Álvares de Azevedo, cujo poema
Lembranças de morrer eu sabia de cor. Eu costumava recitá-lo ao acordar, olhando
para o espelho, com os cabelos ainda desgrenhados. Algumas vezes, chegava a
chorar de tristeza. A parte mais triste
para mim, na época, eram os dois versos:
“À
sombra de uma cruz — e escrevam nela:
Foi poeta, sonhou e amou na vida... ”
Foi poeta, sonhou e amou na vida... ”
Eu
ficava imaginando quão triste era o fato de o poeta morrer praticamente sozinho.
Pois bem, este era o estado de espírito que me assaltava às vezes. E foi nessa
situação que escrevi muitos poemas. Primeiro apresento o poema de Álvares de
Azevedo. Depois, diretamente dos meus
cadernos, apresento três poemas dessa fase! Naturalmente que meus pobres versos
não chegam sequer perto do brilhantismo da obra desse poeta maravilhoso!
Álvares de Azevedo |
LEMBRANÇAS DE MORRER *
Álvares
de Azevedo
Eu deixo a vida como deixo o tédio
Do deserto, o poento caminheiro,
- Como as horas de um longo pesadelo
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;
Como o desterro de minh’alma errante,
Onde fogo insensato a consumia:
Só levo uma saudade - é desses tempos
Que amorosa ilusão embelecia.
Só levo uma saudade - é dessas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas.
De ti, ó minha mãe, pobre coitada,
Que por minha tristeza te definhas!
Se uma lágrima as pálpebras me inunda,
Se um suspiro nos seios treme ainda,
É pela virgem que sonhei. que nunca
Aos lábios me encostou a face linda!
Só tu à mocidade sonhadora
Do pálido poeta deste flores.
Se viveu, foi por ti! e de esperança
De na vida gozar de teus amores.
Beijarei a verdade santa e nua,
Verei cristalizar-se o sonho amigo.
Ó minha virgem dos errantes sonhos,
Filha do céu, eu vou amar contigo!
Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
Foi poeta - sonhou - e amou na vida.
Profecia
Vanisse Simone
É
belo viver
Assim
como é belo morrer
Mas
não sei se é belo matar
O
que eu busco é a morte impregnada de vida
E o
que tu buscas é a vida impregnada de morte
Eis
aí nossa luta mais íntima, eis aí a nossa dor real
Demorei
a entender isso
como
também tu demorarás
Mas,
quando tiveres entendido,
Será
tão pleno e vasto
Que
durará para sempre
Ou
para nunca.
Nunca
mais acabar.
Agosto
de 1987
Solidão
Vanisse Simone
Cá
estamos
Seres
tão frágeis que somos
Longe
daqueles que amamos
Sombras
sutis do que fomos
Cá
estamos
Meros
mortais, sub-humanos
Longe
daqueles que amamos
Tristes,
perdidos, choramos
Cá
estamos
E
nada somos
Longe
daqueles que amamos
Cá
estamos
E,
sem saber, já morremos
Longe
daqueles que amamos.
Outubro de 1985
Sem escolha
Vanisse Simone
Que
dor maior existe
que a
de ter que viver?
Sofrendo
sempre
Tendo
a angústia por companhia
Alguns
respingos de alegria
E
muita, muita decepção.
Para
que viver?
A
morte é doce.
O
sofrimento deixa de existir
Quando
a morte chega
A
paz que o ser tanto busca
O amor
e a calma
Não
existem em vida
Vida
é turbulência e agitação
Viver
é desagradável
E
temos que ir vivendo
A
vida não é um dom
É um
pesado fardo
Que temos
que carregar
Nós,
seres humanos, tão pequenos
Tão fracos
e imbecis
Não
temos nem o direito de escolher
Entre
a vida e a morte.
Dezembro
de 1987
*Versão encontrada do poema na Internet.
- Imagens retiradas da Internet, sem fins comerciais.
Vanisse Simone Alves Corrêa é doutoranda em Educação pela
UFPR, co-editora da Contemporartes e colunista da Planetário. Ela ainda gosta
de recitar poemas mas, hoje prefere os mais alegres.
2 comentários:
Voltar ao passado sempre nos proporciona reflexões e ensinamentos. Os teus poemas são tristes, mas belos. Tua sensibilidade aflora em cada linha e quem te conhece sabe como tua alma cresceu e superou tudo isso. Tens a alma do poeta e a grandeza do ser humano que viveu e aprendeu. Parabéns e muito sucesso, querida amiga Vanisse.
31 de julho de 2015 às 08:11Obrigada pelas lindas palavras, querido Thelmo.
31 de julho de 2015 às 15:47Vindas de você, um artista sensível, valem muito
para mim.
bjo grande
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