sexta-feira, 31 de julho de 2015

POETANDO II






Animada com a (boa!) repercussão do texto anterior, novamente me dirijo ao passado, ao abrir os cadernos de poesia que confeccionei na minha adolescência.



Inspiradíssima pela geração do Mal do Século, a segunda geração do Romantismo brasileiro, escrevi algumas poesias num tom bem pessimista, o que combinava perfeitamente com meu estado de ânimo adolescente.



Lembro que dessa escola literária meu poeta favorito era Álvares de Azevedo, cujo poema Lembranças de morrer eu sabia de cor.  Eu costumava recitá-lo ao acordar, olhando para o espelho, com os cabelos ainda desgrenhados. Algumas vezes, chegava a chorar de tristeza.  A parte mais triste para mim, na época, eram os dois versos:

“À sombra de uma cruz  — e escrevam nela: 
Foi poeta, sonhou e amou na vida... ”

Eu ficava imaginando quão triste era o fato de o poeta morrer praticamente sozinho. Pois bem, este era o estado de espírito que me assaltava às vezes. E foi nessa situação que escrevi muitos poemas. Primeiro apresento o poema de Álvares de Azevedo.  Depois, diretamente dos meus cadernos, apresento três poemas dessa fase! Naturalmente que meus pobres versos não chegam sequer perto do brilhantismo da obra desse poeta maravilhoso!

Álvares de Azevedo


LEMBRANÇAS DE MORRER *

                                                Álvares de Azevedo

Eu deixo a vida como deix
o o tédio 
Do deserto, o poento caminheiro, 
- Como as horas de um longo pesadelo 
Que se desfaz ao dobre de um sineiro; 

Como o desterro de minh’alma errante, 
Onde fogo insensato a consumia: 
Só levo uma saudade - é desses tempos 
Que amorosa ilusão embelecia. 

Só levo uma saudade - é dessas sombras 
Que eu sentia velar nas noites minhas. 
De ti, ó minha mãe, pobre coitada, 
Que por minha tristeza te definhas! 

Se uma lágrima as pálpebras me inunda, 
Se um suspiro nos seios treme ainda, 
É pela virgem que sonhei. que nunca 
Aos lábios me encostou a face linda! 

Só tu à mocidade sonhadora 
Do pálido poeta deste flores. 
Se viveu, foi por ti! e de esperança 
De na vida gozar de teus amores. 

Beijarei a verdade santa e nua, 
Verei cristalizar-se o sonho amigo. 
Ó minha virgem dos errantes sonhos, 
Filha do céu, eu vou amar contigo! 

Descansem o meu leito solitário 
Na floresta dos homens esquecida, 
À sombra de uma cruz, e escrevam nela: 
Foi poeta - sonhou - e amou na vida.






Profecia
                                               Vanisse Simone

É belo viver
Assim como é belo morrer
Mas não sei se é belo matar
O que eu busco é a morte impregnada de vida
E o que tu buscas é a vida impregnada de morte
Eis aí nossa luta mais íntima, eis aí a nossa dor real
Demorei a entender isso
como também tu demorarás
Mas, quando tiveres entendido,
Será tão pleno e vasto
Que durará para sempre
Ou para nunca.
Nunca mais acabar.
                                                                       Agosto de 1987






Solidão
                                              Vanisse Simone

Cá estamos
Seres tão frágeis  que somos
Longe daqueles que amamos
Sombras sutis do que fomos

Cá estamos
Meros mortais,  sub-humanos
Longe daqueles que amamos
Tristes, perdidos, choramos

Cá estamos
E nada somos
Longe daqueles que amamos

Cá estamos
E, sem saber,  já morremos
Longe daqueles que amamos.
                                                                    Outubro de 1985







Sem escolha
                                      Vanisse Simone

Que dor maior existe
que a de ter que viver?
Sofrendo sempre
Tendo a angústia por companhia
Alguns respingos de alegria
E muita, muita decepção.
Para que viver?
A morte é doce.
O sofrimento deixa de existir
Quando a morte chega
A paz que o ser tanto busca
O amor e a calma
Não existem em vida
Vida é turbulência e agitação
Viver é desagradável
E temos que ir vivendo
A vida não é um dom
É um pesado fardo
Que temos que carregar
Nós, seres humanos, tão pequenos
Tão fracos e imbecis
Não temos nem o direito de escolher
Entre a vida e a morte.

Dezembro de 1987



*Versão encontrada do poema na Internet.
-  Imagens retiradas da Internet, sem fins comerciais.






Vanisse Simone Alves Corrêa é doutoranda em Educação pela UFPR, co-editora da Contemporartes e colunista da Planetário. Ela ainda gosta de recitar poemas mas, hoje prefere os mais alegres.







2 comentários:

THELMO OLISAR disse...

Voltar ao passado sempre nos proporciona reflexões e ensinamentos. Os teus poemas são tristes, mas belos. Tua sensibilidade aflora em cada linha e quem te conhece sabe como tua alma cresceu e superou tudo isso. Tens a alma do poeta e a grandeza do ser humano que viveu e aprendeu. Parabéns e muito sucesso, querida amiga Vanisse.

31 de julho de 2015 às 08:11
Vanisse Simone disse...

Obrigada pelas lindas palavras, querido Thelmo.
Vindas de você, um artista sensível, valem muito
para mim.
bjo grande

31 de julho de 2015 às 15:47

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