Assédio Moral: Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come!

Quando criança minha mãe sempre falava essa tão conhecida frase: "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come"- e eu, na minha mente fértil, ficava imaginando como seria possível fugir do bicho sem correr e sem ficar. Pasmem: eu imaginava um bicho verde, estilo bicho-papão, vindo por todos os lados - por cima, por baixo, correndo em minha direção: uma loucura! - e ficava tentando desvendar como eu poderia vencê-lo. Não ria! Se você pensa que essa imaginação infantil era apenas uma brincadeira de criança, acredite: isso se passa na cabeça de milhares de pessoas a todo o tempo!Talvez ninguém imagine um bicho verde, peludo e monstruoso como eu fazia na minha infância, mas com certeza absoluta, muitas pessoas passam dia e noite tentando encontrar uma forma de vencer as adversidades vividas no local de trabalho. Seguindo, ainda, a linha do texto "Sou ou não sou? Eis a questão!", entende-se que a dinamização econômica e tecnológica da sociedade contemporânea exija muito mais da mente humana do que no passado e, essa esquizofrenia social como resultado de um ambiente extremamente competitivo e instável, deixa muito a desejar para as pessoas envolvidas nesse processo.

Tentando combater a queda de produtividade dos funcionários, muitas empresas adotaram a administração motivacional, que utiliza de bônus, presentes, palestras e outras coisas que possam servir de incentivo ao trabalhador. Funciona mais ou menos como os adestradores de cães fazem para alcançar seus objetivos: se você rolar, eu te dou um pedacinho de carne! - E se acha que exagerei, assista o vídeo motivacional de Daniel Godri, que te incentiva a ser o funcionário cachorro! - Em contrapartida, as empresas estabelecem metas abusivas, jornada de trabalho prolongada, baixo salário e assédio moral. E a mente do trabalhador vai virando sucata em meio a tantas pressões. O fato é que, achar um bom emprego é muito difícil nos dias de hoje, e ninguém quer abrir mão das poucas legalias que uma empresa oferece a mais.
A empresa não está te dando nada, ela não é boazinha, já que os lucros proporcionados pela produção dos funcionários, é muito maior do que ela paga a eles. Essa era a reivindicação de Marx no século XIX: que os detentores dos meio de produção enriquecem com a mais valia, diferença entre o produzido pelo trabalhador e o salário. Hoje em dia, essa discussão já não vem a tona devido à multiplicidade de organizações no mercado, pois a nossa democracia diz que "cada um faz o seu". Marilena Chauí em seu livro "O que é Ideologia", aponta para essa "ideologia invisível" através do "discurso competente", fenômeno próprio do capitalismo que se pretende verdadeiro por estar carregado de cientificidade. A ideologia da competência - que é o discurso da organização (empresas) - é aquela "que oculta a divisão social das classes ao afirmar que a divisão social se realiza entre os competentes (os especialistas que possuem conhecimento científicos e tecnológicos) e os incompetentes (os que executam as tarefas comandadas pelos especialistas."(CHAUÍ, 2001:105)".

O fato é que, ainda não existem soluções plausíveis para melhorar as condições psicológicas de trabalho na sociedade atual e as previsões da OMS (de que esse século será o século das doenças mentais) aproximam-se cada vez mais da realidade. Aquele que depende mesmo do seu emprego, está sempre entre a cruz e a espada, e como eu na minha infância, caça estratégias para vencer esses abusos. Apesar do bicho ser muito grande, é preciso conscientizar-se de si mesmo, da própria integridade moral e da dignidade necessária à saúde mental para avaliar a hora de enfrentar o bicho: não importa o quão horrendo ele seja, sempre vale a pena lutar para vencê-lo!



















