Assédio Moral: Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come!




Por Yone Ramos Marques de Oliveira


Quando criança minha mãe sempre falava essa tão conhecida frase: "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come"- e eu, na minha mente fértil, ficava imaginando como seria possível fugir do bicho sem correr e sem ficar. Pasmem: eu imaginava um bicho verde, estilo bicho-papão, vindo por todos os lados - por cima, por baixo, correndo em minha direção: uma loucura! - e ficava tentando desvendar como eu poderia vencê-lo. Não ria! Se você pensa que essa imaginação infantil era apenas uma brincadeira de criança, acredite: isso se passa na cabeça de milhares de pessoas a todo o tempo!
Talvez ninguém imagine um bicho verde, peludo e monstruoso como eu fazia na minha infância, mas com certeza absoluta, muitas pessoas passam dia e noite tentando encontrar uma forma de vencer as adversidades vividas no local de trabalho. Seguindo, ainda, a linha do texto "Sou ou não sou? Eis a questão!", entende-se que a dinamização econômica e tecnológica da sociedade contemporânea exija muito mais da mente humana do que no passado e, essa esquizofrenia social como resultado de um ambiente extremamente competitivo e instável, deixa muito a desejar para as pessoas envolvidas nesse processo.
Tentando combater a queda de produtividade dos funcionários, muitas empresas adotaram a administração motivacional, que utiliza de bônus, presentes, palestras e outras coisas que possam servir de incentivo ao trabalhador. Funciona mais ou menos como os adestradores de cães fazem para alcançar seus objetivos: se você rolar, eu te dou um pedacinho de carne! - E se acha que exagerei, assista o vídeo motivacional de Daniel Godri, que te incentiva a ser o funcionário cachorro! - Em contrapartida, as empresas estabelecem metas abusivas, jornada de trabalho prolongada, baixo salário e assédio moral. E a mente do trabalhador vai virando sucata em meio a tantas pressões. O fato é que, achar um bom emprego é muito difícil nos dias de hoje, e ninguém quer abrir mão das poucas legalias que uma empresa oferece a mais.
A empresa não está te dando nada, ela não é boazinha, já que os lucros proporcionados pela produção dos funcionários, é muito maior do que ela paga a eles. Essa era a reivindicação de Marx no século XIX: que os detentores dos meio de produção enriquecem com a mais valia, diferença entre o produzido pelo trabalhador e o salário. Hoje em dia, essa discussão já não vem a tona devido à multiplicidade de organizações no mercado, pois a nossa democracia diz que "cada um faz o seu". Marilena Chauí em seu livro "O que é Ideologia", aponta para essa "ideologia invisível" através do "discurso competente", fenômeno próprio do capitalismo que se pretende verdadeiro por estar carregado de cientificidade. A ideologia da competência - que é o discurso da organização (empresas) - é aquela "que oculta a divisão social das classes ao afirmar que a divisão social se realiza entre os competentes (os especialistas que possuem conhecimento científicos e tecnológicos) e os incompetentes (os que executam as tarefas comandadas pelos especialistas."(CHAUÍ, 2001:105)".
E o que isso tudo tem a ver com o assédio moral? Pois é! É baseado nessa mentalidade que os empregadores assediam moralmente seus funcionários, uma vez que os funcionários não relutarão, já que são dependentes de seus salários. Agora, até que ponto, um trabalhador deve aturar o assédio moral? A resposta não é tão simples! Apesar de na atualidade, além da CLT, dos sindicatos e de existirem mais de 80 projetos de lei em todo o país, que visam combater essa política organizacional, na prática, as empresas sempre conseguem um jeito de se safar! Os processos trabalhistas se tornaram uma opção de defesa, mas por outro lado, as empresas, hoje, possuem mecanismos para descobrir se o empregado já processou outras empresas que trabalhou: isso resulta em desemprego para aqueles que reivindicam seus direitos, ou seja, um estigma. Essa lista negra do mercado é mais uma artimanha para calar os oprimidos e, hoje, ouvimos muito falar a famosa frase: "manda quem pode, obedece quem tem juízo!"
O fato é que, ainda não existem soluções plausíveis para melhorar as condições psicológicas de trabalho na sociedade atual e as previsões da OMS (de que esse século será o século das doenças mentais) aproximam-se cada vez mais da realidade. Aquele que depende mesmo do seu emprego, está sempre entre a cruz e a espada, e como eu na minha infância, caça estratégias para vencer esses abusos. Apesar do bicho ser muito grande, é preciso conscientizar-se de si mesmo, da própria integridade moral e da dignidade necessária à saúde mental para avaliar a hora de enfrentar o bicho: não importa o quão horrendo ele seja, sempre vale a pena lutar para vencê-lo!




Yone Ramos Marques de Oliveira, teóloga e historiadora, escreve aos sábados, quinzenalmente no ContemporARTES.
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FOTÓGRAFAS PIONEIRAS

     

Assistindo ao filme “Abraços Partidos” de Almodóvar, há uma cena em que o protoganista Amadeo, um escritor cego, comenta que o dramaturgo Arthur Miller (1915-2005) após ter se divorciado de Marilyn Monroe, foi casado com uma fotógrafa com quem teve um filho com síndrome de down, o qual rejeitou durante toda a vida. Essa informação acendeu minha curiosidade e fui em busca de saber quem era essa fotógrafa, e descobri surpresa, de que embora relativamente pouco conhecida, foi uma artista importante para a sua época, alguém que trabalhou na poderosa agência Magnum, ganhou prêmios, viajou muito, documentando povos e culturas, e hoje há uma fundação com seu nome que promove concursos anuais para fotógrafas iniciantes. Assim ela passou a fazer parte das “minhas” fotógrafas pioneiras, uma daquelas que quebraram barreiras, ousaram, inovaram e deixaram um legado artístico permanente.

Seu nome, Ingeborg Morath, nascida em maio de 1923 em Graz na Áustria, Seu pai era cientista cujo trabalho levou-o a diferentes laboratórios e universidades na Europa durante a sua infância, e ela acabou indo morar em Berlim. O seu primeiro encontro com a arte-vanguardista foi o Entartete Kunst (Arte Degenerada) exposição organizada pelo partido nazista em 1937, que procurou inflamar a opinião pública contra a arte moderna. "Eu encontrei uma série de pinturas emocionantes e me apaixonei por Franz Marc, especialmente seu “Blue Horse", Morath escreveu mais tarde. Mas só eram permitidos comentários negativos, e assim começou um longo período de calar e esconder os pensamentos." No final da II guerra, Morath foi encaminhada para o serviço da fábrica de Tempelhof, juntamente com prisioneiros de guerra ucranianos. Devido a essas experiências,  ela recusou-se a fazer fotografias de guerra, preferindo trabalhar em histórias que mostravam as suas consequências.

Após a Segunda Guerra Mundial, Inge Morath como é mais conhecida, trabalhou como tradutora e jornalista. Em 1948, ela foi contratada inicialmente como correspondente de Viena e, posteriormente, como editora para Heute uma revista ilustrada publicada pelo Office of War Information, em Munique. Ela encontrou o fotógrafo Ernst Haas no pós-guerra, em Viena. Trabalhando juntos para a Heute, Morath escreveu artigos para acompanhar as fotos de Haas. Em 1949, Morath e Haas foram convidados por Robert Capa a integrar a recém-fundada Magnum Photos, em Paris, onde ela atuaria como editora.

Trabalhando com folhas de contato fotográficos enviadas para o escritório da Magnum por um de seus membros fundadores, Henri Cartier Bresson, Inge Morath ficou fascinada. "Eu acho que aprendi a fotografar, estudando o modo como Bresson fotografava, antes mesmo de ter uma câmera na minha mão." No ano de 1951, começou a fotografar durante uma visita a Veneza. "Ficou imediatamente claro para mim que a partir de agora eu seria fotógrafa", escreveu ela. “Eu sabia que poderia expressar as coisas que eu queria dizer, dando-lhes forma através dos meus olhos."

Morath começa a trabalhar como secretária junto à Simon Guttman, que naquele tempo era Editor da Imagem Post. Após vários meses de aprendizado para atuar como repórter fotográfico, Guttman quis saber o que Morath queria fotografar, e por que. Ela respondeu que "não importa o tema, porque após o isolamento do nazismo senti que tinha encontrado a minha linguagem na fotografia." Inicialmente passou vários meses fazendo a cobertura de exposições, inaugurações, eventos noturnos etc., sob o pseudônimo de Egni Tharom, seu próprio nome escrito ao contrário.

Em 1953-1954, por sugestão de Capa, ela foi trabalhar com Cartier-Bresson como pesquisadora e assistente, e em 1955 ela foi convidada para se tornar um membro pleno da Magnum Photos. Durante a década de 1950 viajou incessantemente, fazendo coberturas na Europa, Oriente Médio, África, Estados Unidos e América do Sul para publicações em revistas como Paris Match e Vogue. Morath escreveu e publicou também mais de trinta monografias.

Como muitos membros da Magnum, Morath trabalhou como fotógrafa em vários sets de filmagem. Moulin Rouge (1952) de John Huston foi um dos primeiros trabalhos. Huston escreveu depois sobre a fotógrafa: "É uma sacerdotisa da fotografia. Ela tem a rara capacidade de penetrar além das superfícies e revelar a essência das coisas”.

Morath trabalhou novamente com Huston em 1960 no set de Os Desajustados, um filme ‘blockbuster’ com Marilyn Monroe, Clark Gable e Montgomery Clift, com roteiro de Arthur Miller, fazendo o making of do filme. Ela então conheceu Miller e se casaram em 1962, logo depois que ele se divorciou de Marylin Monroe. Tiveram uma primeira filha, Rebecca, que é hoje cineasta, atriz e escritora. O segundo filho do casal, Daniel, nasceu em 1966 com síndrome de Down e foi internado em uma instituição logo após seu nascimento. Arthur Miller jamais foi visitá-lo, apesar dos pedidos insistentes de Inge, e o filho não foi citado em sua biografia.

Durante os anos 60 e 70, o casal retorna aos Estados Unidos e trabalham juntos em vários projetos. Sua primeira colaboração com Arthur Miller foi o livro Na Rússia (1969), que, juntamente com Encontros Chineses (1979), descreveu as suas viagens e reuniões na União Soviética e na República Popular da China.

Embora a fotografia fosse o principal meio através do qual Morath encontrou sua expressão, era também exímia escritora, e seu dom duplo para palavras e imagens, além do domínio de diversos idiomas, fez com que tivesse fama incomum entre seus colegas. Morath escreveu extensivamente, e muitas vezes de forma divertida, sobre seus temas fotográficos, embora a maioria de seus textos só foram publicados póstumamente.

Junto com Eve Arnold, Inge Morath foi uma das poucas mulheres que se tornaram membros da Magnum Photos, que até hoje permanece como uma organização predominantemente masculina. Muitos críticos têm escrito sobre o elemento lúdico e de surrealismo que caracteriza o trabalho de Morath do início de sua carreira como fotógrafa. Morath atribuiu isso às conversas que teve com Cartier Bresson, durante as suas viagens à Europa e aos Estados Unidos. A fotógrafa continuou com seu trabalho até idade avançada, recebendo inclusive o título de Doutor Honoris Causa da Universidade de Hartford, em 1984.

Ingeborg Morath Miller morreu em 2002, com a idade de 78 anos. A Inge Morath Foundation foi criada por sua família em 2003, para preservar e compartilhar o seu legado. Ela sempre encorajou entusiasticamente as mulheres fotógrafas e como tributo à sua colega, os membros da Magnum Photos estabeleceram a Inge Morath Award em 2002. O prêmio anual é administrado pela Fundação e é concedido a jovens fotógrafas, com idade inferior a 30 anos, para apoiar o trabalho e a realização de projetos de longo prazo.

Como muitos de seus colegas da Magnum, o trabalho de Morath foi motivado pela questão fundamental do humanismo, formado tanto pela experiência da guerra, e por sua sombra persistente sobre o pós-guerra na Europa. Essa motivação aumenta em sua obra madura em temas que ela documenta a resistência do espírito humano em situações de extrema coação, bem como as suas manifestações de êxtase e alegria.

“A fotografia é um fenômeno estranho ... Você confia em seus olhos ao mesmo tempo em que desnuda sua alma” (I.M.)


Izabel Liviski, professora e fotógrafa, doutora em Sociologia pela UFPR, escreve a Coluna INcontros, e é também co-editora da Revista ContemporArtes. 
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Novo Aeon (Cícero Barbosa)


Sábado à noite, fim de verão. O calor intenso fez com que no final daquela tarde houvesse um pequeno temporal. Agora o calor era até suportável. Tamanha a minha sorte que uma leve brisa me alentava, e que unida à cerveja barata e gelada que comprei de um ambulante amenizavam a ansiedade de ficar na fila de espera para entrar no bar. Tinham umas vinte pessoas do lado de fora e pela movimentação do local deveria ter esse mesmo número lá dentro.


No Novo Aeon tocaria uma banda punk chamada Distorção Social, e provavelmente teria mais umas duas ou três bandas antes. Tinha comigo uma fita K7 que um amigo havia gravado. Escutava ela com freqüência no meu walkman com um volume consideravelmente alto.


Minha vez de entrar no lugar havia chegado, quando surge um ônibus carregado de punk sujos. Fiquei sabendo depois que com o cachê que ganhariam o pessoal da banda alugou o ônibus, mas parece que até hoje não receberam a tal grana. O lugar tocava uma música barulhenta e que eu não conseguia distinguir a voz, a guitarra ou a bateria, muito menos o contrabaixo. A quantidade de cerveja que havia tomado me fez ir direto para o banheiro, onde encontrei um cenário de guerra: pichações em todos os espaços possíveis, a privada sem tampa e a descarga era daquelas de puxar a cordinha (e que não tive coragem de tocá-la).


Embaixo tinha um porão, que foi fechado pelo dono do lugar depois que um garoto foi ferido por arma branca numa briga de gangues. O lugar onde teria o show estava praticamente lotado, fazendo com que a maioria transpirasse. Muito pelo fato do bar não ter muitas janelas e porque o segurança ficava de guarda na porta com medo que as pessoas saíssem do lugar sem pagar.


Para conseguir pegar uma bebida tinha que chegar ao pequeno balcão disputando espaço com “chega pra lá, por favor” em forma de cotoveladas e dizendo e/ou “não empurra, porra”. Era um esforço muito desgastante, mas que era logo esquecido quando saiam com um largo sorrizo e com vários tipos de drinks nas mãos. A precária iluminação dava ao lugar um clima de insanidade coletiva. Os cantos da casa eram usados para os casais se conhecerem melhor. Vez ou outra tinha que desviar de garotos embriagados que desmaiavam e deitavam no chão imundo.


Para se divertir, alguns garotos pegaram um de seus colegas para Cristo: apanharam-no pelas pernas e iam de encontro a uma das vigas que sustentavam o lugar, dando a impressão que queriam aleijar o rapaz. De repente um tumulto: empurrões e cadeiras voando, garrafas e copos sendo usados como armas. Parece que alguém mexeu com uma garota que namorava um cara que veio com o pessoal do ônibus. Mas foi bom, porque faltavam poucos minutos para a banda começar a tocar e como a briga foi lá para fora o lugar esvaziou pela metade.


Foi a última coisa que me lembro, pois bebi tanto naquela noite que não me recordo muita coisa do show, menos muito como cheguei em casa.



Cícero F. Barbosa Jr., mestrando em História pela PUC/SP, músico e artista, escreve às quartas-feiras quinzenalmente no ContemporARTES.


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Amor Incondicional



Estava eu sonhando com um lindo jardim, cheio de borboletas coloridas, quando acordei com o despertador insistente, anunciando a hora de levantar. Rapidamente me lembrei que ela ainda não havia acordado, e decidi, como em todas as manhãs, cheirar seu lindo pescoço para despertá-la suavemente nesse novo dia. Ela se virou murmurando algo inteligível, quando então passei para a segunda tática que sempre funciona: mirei bem aqueles lábios carnudos e aquele narizinho empinado, e então, lhe dei uma enorme lambida, bem molhada! Abruptamente ela se sentou na cama gritando, cheia de energia para o novo dia: “Rex, eu vou te matar! Quantas vezes te pedi para não me lamber?”.
Eu adoro quando ela acorda dizendo o meu nome! Comecei então a puxá-la pela camisola, abanando a cauda freneticamente, para que ela abrisse a porta e eu corresse para o jardim, para esvaziar minha bexiga. Volto sempre correndo para estar ao seu lado por alguns minutos antes dela partir para o longo dia de trabalho.

Depois do banho e de escovar os dentes, ela sobe na balança todos os dias. Nesse momento eu fico tenso, levanto as orelhas e aguardo sua reação, que por vezes é um grito de dor, e em outras, um monte de palavras horríveis. Normalmente às segundas-feiras, ela bate a cabeça na parede, repetindo algo do tipo: “nunca mais comerei lasanha na minha vida”. Se ela não comesse tudo que já prometeu para a balança, ela viveria de filé de frango e eu seria um cão muito mais feliz e esbelto.

No quarto, em frente ao espelho, ela começa brincar. Nunca entendi muito bem o porquê dela fazer isso, se está sempre atrasada. Parece que sem esse jogo ela não pode sair de casa: tira uma roupa do armário, veste, dá uma volta em frente ao espelho e dá a sentença: “muito gorda”, “aparece a celulite”, “não sobressaem meus olhos azuis”, “quanta flacidez”, “uma ruga nova”, “cabelos brancos”, etc.Depois de uns quarenta minutos, ela encontra algo que a faz pular feliz,sendo então aquela roupa a escolhida do dia, enquanto ela cantarola: “pareço 2 quilos mais magra” ou “parece que rejuvenesci 5 anos”.

Eu, um mero cachorro, jamais entenderei a raça humana, pois ela fica linda de qualquer jeito. Quem vai olhar suas dobrinhas quando ela abre aquele sorriso encantador? Quem vai reparar naquelas jóias brilhantes quando seus olhos verdes brilham mais que esmeraldas? Nós, os cachorros, somos seres inferiores, muito simplistas. Para nós não importa se a coleira tem diamantes ou é de couro velho. Se encontrarmos outro cachorro que não queira brigar, pronto, seremos amigos instantaneamente. Não sabemos classificar nossos amigos pelo que usam. Tampouco nos importa se somos de raças ou cores diferentes. Só nos importa que sejam alegres e espontâneos. Mas eu sei, sou apenas um cachorro, como entenderia a complexidade da raça humana, ainda mais de suas fêmeas?

Outro dia minha dona dizia ao telefone, que sentia solidão, sentia falta de uma família, um marido e filhos, e que eu só lhe trazia problemas. Eu não fiquei magoado com ela, porque logo lembrei que os humanos nem sempre falam o que realmente sentem. Muitas vezes eles preferem culpar algo ou alguém pela sua dor, porque a dor é grande demais para ser expressa em palavras. E se não me amasse, porque teria ela me abraçado outro dia e estalado um beijo na minha bochecha caída? Dizem que os elefantes não esquecem, mas nós cachorros também não. Como temos um cérebro pequeno e só podemos nos lembrar de poucas experiências, preferimos nos lembrar só das boas. Somos mesmo seres inferiores e simplistas.

De repente, percebo que ela já passou pelo ritual da transformação, quando coloca muitas cores em seu rosto e parecendo outra pessoa, sobrepõe inúmeros objetos brilhantes nos dedos, braços, pescoço e orelhas, que desviam a atenção da sua alma. Nunca entendi muito bem o porquê dela precisar trabalhar disfarçada, mas acredito que ninguém possa descobrir quem ela realmente é. Uma pena, porque eu acho que ela é muito mais agradável quando está sem a armadura, e não precisa fingir ser outra pessoa.

Quando ela está assim, também muda seu comportamento, e até sua voz fica mais austera, o sorriso parece mecânico e a gargalhada programada. Eu acho que ela trabalha no exército. Talvez seja por isso que ela sente solidão! Ela precisa afastar as pessoas e esconder quem ela realmente é. Já sei, ela é uma agente secreta, só pode ser isso. Nada mais justificaria esse comportamento complexo, pois até mesmo os cachorros sabem que ninguém gosta de alguém que tenta ser quem não é.

Eu a acompanho até a porta todos os dias, e fico observando sua imagem desaparecer. Ela sempre esquece de se despedir de mim, já que está sempre correndo. Eu dou umas boas latidas para ela saber que vou esperá-la ansiosamente. Quando ela se vai, o tempo parece não passar.Meu dia não é importante como o dela.Eu passeio pelo jardim desengonçadamente, corro atrás do gato do vizinho, tomo sol, roo mais um pedaço do sofá, brinco com um galho que encontro por aí e caço borboletas que nunca pego.

Sou um cachorro muito feliz. Tenho uma dona maravilhosa que me deixa água e comida, e com ela não preciso fingir ser quem não sou. Ela sabe que eu tenho bafo canino (da lasanha, obviamente), solto pum e muitas vezes sou atacado por pulgas oportunistas. Além de que estou ficando calvo com a idade e solto pelos o tempo todo. Mesmo assim, ela me dá banho, remédio e osso para roer. Para nós cachorros, o amor é tudo, e não precisamos de sofisticadas demonstrações. Somos mesmo uma raça simples e pouco evoluída.

Quando a noite chega e eu escuto seu carro estacionando, meu coração começa palpitar como uma revoada de maritacas e eu fico louco de felicidade. Corro para recebê-la. Sempre esqueço que ela estará cansada, dirá para eu sair, e fechará a porta do quarto no meu fucinho. Mas eu não fico magoado com ela, sei que é muito desgastante passar o dia tentando ser outra pessoa, preocupando-se com o seu disfarce, escondendo seus sentimentos e encenando ser uma pessoa perfeita.

Eu deito no chão gelado e aguardo pacientemente ao lado da porta. Sei que depois do banho, quando ela tirar aquele disfarce, ela se sentará no sofá usando uma camisola larga e pantufas velhas. Tranqüila, ela finalmente permitirá que eu me aproxime dela.Então, eu vou me sentar aos seus pés, feliz de sentir o seu cheiro, o seu calor, e ver a beleza daquela pessoa humana, tão complexa, tão forte, e tão frágil ao mesmo tempo.

Quando ela com suas mãos delicadas acariciar minhas costas, eu vou ronronar como um gato, e ela saberá que eu a amo mais que tudo, exatamente como ela é.






Simone Pedersen é escritora para crianças e adultos.

Autora de quatro infantis e duas coletâneas de poemas e crônicas,

todos no prelo e sendo lançados nos meses de junho e na Bienal do


Livro de São Paulo em agosto.

http://www.simonealvespedersen.blogspot.com/
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O Poeta Matogrossense Antônio Sodré.



El Poeta de la Transmutación y de la Trancedencia.
por Altair de Oliveira

Recentemente em Cuiabá eu reencontrei o meu amigo poeta e compositor Antônio Sodré, antigo companheiro dos nichos de poesia independente nos campos da UFMT e na boemia cuiabana na década de 80, figura singularíssima, quase que folclórica na capital matogrossense, e um poeta de mancheia. Aproveitei então a oportunidade para entrevistá-lo para a nossa coluna.

Antônio Sodré é natural de Jucimeira-MT, filho de baianos radicados no Mato grosso pelos programas de ocupação do oeste. Mudou-se para Cuiabá no final da década de 70, época que iniciou a escrever poemas, e ingressou na universidade federal do Mato Grosso no curso de história no início dos anos 80, depois de letras e depois de música. Na verdade o poeta nunca mais saiu dos campos da UFMT, tendo se estabelecido lá com uma banca de livros, estudando e divulgando poesia por cerca de 30 anos. O poeta participou também de um grupo de arte litero-musical chamado "Caxemir-Bouquê", que durante muito tempo fez apresentações de música e poesia falada, tendo gravado 2 CDs.

As estórias que envolvem o poeta no campus da universidade confundem-se com as histórias de seus poemas e canções e são conhecidas e celebradas por várias gerações de estudantes que passaram por lá, assim como pelos grupos de artistas e arteiros que conviveram naquele ambiente estudantil. Antônio, que é irmão do pintor matogrossense Adir Sodré, gostava de denominar-se "el poeta de la transmutación y de la trancedencia!" Pequenos poemas e versos seus como "Eu não quero as réguas/ para traçar os meus caminhos./ Eu prefiro as éguas/ num galopar torto e veloz..." ou "Nunca pensei que você fosse tão fóssil!.../ ...ó! meu osso duro de roer!" são lembrados com saudade pelos ex-alunos daquela escola.

O poeta escreve pouco e parece não ter muita vontade em publicar seus escritos, mas não perde a oportunidade de declamar ou de participar de eventos culturais ou de incentivo à leitura. Juntamente com o poeta e professor Luiz Renato ele participa de um projeto de poesia nas escolas denominado de "Poesia Necessária", do qual foi o idealizador e, sempre que possível, promove exposição de poemas ou apresentação de poetas no saguão do curso de letras.


"O poema é quem escolhe o poeta!"


PC- Poderia nos falar um pouco sobre a tua infância e de como nasceu este teu apego à poesia?

AS1- Passei a infância em Jucimera-MT e tive lá os meus primeiros estudos, mas no segundo grau eu passei a estudar na cidade vizinha de Jaciara-MT, indo todas as noites no ônibus estudantil. Fui um menino tímido e arredio, me lembro que gostava de futebol e de ouvir rádio. Na adolescência comecei a trabalhar como ajudante de meu pai na mercearia da família, aí passei a estudar no colégio noturno. Apesar de eu não ler muito, devido à dificuldade de se obter livro nesta época, foi na adolescência que os primeiros poemas me tocaram, principalmente 2 poemas chamados, se não me engano, "Trem-de-Ferro", um de Manuel Bandeira e o outro de Catulo da Paixão Cearense. Mas eu não escrevia poesia nesta época, apenas divagações filosóficas. Minhas primeiras tentativas de escrita poética vieram na universidade, no curso de letras, quando comecei a conhecer o trabalho de grandes poetas.

PC- Quais os poetas que te fascinaram ou te influenciaram e que ainda hoje tens admiração?

AS- Primeiramente foram poetas modernos como Bandeira, Drummond e Gullar. Depois foram os poetas da década de 70, como Paulo Lemiski, através dele conheci o japonês Bashô, poeta que tenho grande admiração! Sou um grande fã também de Mário Quintana e Manoel de Barros.

PC- Ainda na década de 80 você participou de um grupo de arte independente denominado "Caxemir-Bouquê" que ficou bastante conhecido no Mato Grosso devido ao bom nível dos trabalhos apresentados e às performances incomuns das exibições lítero-musicais. Poderia nos falar um pouco sobre o "Caxemir" e sobre as atividades que eram praticadas lá?

AS- Bem,o Caxemir surgiu a partir da reunião de um grupo de amigos que participaram de um evento chamado "Mecânica da Palavra", que aconteceu na Casa de Cultura de Cuiabá em 1983. No evento foi criado um grupo poético denominado "Bandogira" para apresentar performances de poesia falada, como uma amostra da poesia que estava sendo produzida em Cuiabá naquele momento. Posteriormente alguns dos poetas participantes deste grupo (Antônio Sodré, Luiz Renato, Eduardo Ferreira, Antônio Carlos de Lima e outros) se reuniram para formar o grupo "Caxemir-Bouquê". As apresentações iniciais eram performances de poesia e apresentações musicais, de forma intercalada. Mas não dá para a gente falar em poesia separada da música aí...Era a apresentação do trabalho de vários artistas, reunidos num único show. É claro que cada performance tinha a sua própria identidade, às vezes acompanhada de seu próprio figurino ou cenário, como atos separados de um mesmo show. Aí eu pude apresentar minhas composições poéticas e também as musicais. Esta primeira fase do Caximir foi de 1984 a 1987, depois o grupo se dissolveu, voltando a reunir-se em 1999, agora com mais integrantes. Esta segunda fase, que durou de 1999 a 2005, foi mais musical que poética, tendo sido produzido 2 CDs “Caximir I” e “Caximir II”, já esgotados.

PC- Quer dizer que você escreve letras para música e poemas separadamente?

AS- Sim, quando escrevo um poema eu não penso em musicá-lo. Mas os meus textos para músicas já nascem como letra, sendo pretencialmente musicais.

PC- O teu primeiro livro "Besta Poética", hoje uma raridade, saiu em 1984. Fale-nos um pouco sobre este trabalho, de que se trata e de como foi o seu processo de edição?

AS- Na verdade a edição do meu livro "Besta Poética" foi uma iniciativa de meu irmão Adir Sodré que coletou 13 poemas dos escritos que eu tinha até então e fez a composição e ilustração dos poemas a bico de pena, um a um, para fazer uma brochura que foi editada pela imprensa oficial do estado de Mato Grosso. Estes poemas tratavam de temas diversos, não tive intenções de fazer um livro temático.
PC- Poderia nos falar sobre o teu processo de escrita poética: como se inicia, como se conclui e como você sabe que algo merece ou tem que se transformar num poema?


AS- Meu processo de escrita poética se inicia de maneira diversificada. Às vezes é fruto de um processo de meditação, outras vezes ele vem de uma imagem, duma paisagem ou de um signo que parecem querer uma resposta. Praticamente tudo é passível de se tornar poesia ou de ser composto como poema. O que ocorre é que as idéias para o poema podem momentaneamente estarem truncadas, mesmo porque há coisas ou sensações que as palavras não podem traduzir. Mas não gosto da idéia de pensar num poema inacabado para sempre, ou mesmo da idéia de abortar um poema, porque acho que é o poema quem escolhe o poeta que o escreva, e não o poeta quem escolhe o poema a ser escrito. Então um impasse num poema é frustrante! Para mim o fato de um poema não estar pronto reflete somente que o poeta ainda não está pronto para escrevê-lo.

PC- O seu segundo livro "Empório Literário" surgiu 21 anos depois do livro "Besta Poética". Por que demorou tanto em publicar? Fale-nos um pouco sobre este trabalho.

AS- Acho que houve vários motivos pelos quais eu protelei em publicar os poemas que tinha escrito, por exemplo: autocrítica, excesso de zêlo e principalmente à minha falta de interesse em publicar. Na verdade eu fui procurado por um pessoal que havia feito um projeto de publicação dos poemas que eu havia produzido, através da lei de incentivo à cultura. Então reuni novamente os meus escritos, selecionando-os para montar este livro "Empório Literário". O título é talvez alusivo ao tempo em que ficava trás do balcão da mercearia de meu pai. Mas, pensando bem, ainda continuo atrás do balcão. Só que agora eu fico atrás do balcão de minha banca de livros na UFMT.

PC- Então fale-nos um pouco sobre este teu trabalho de livreiro que, por mais de 2 décadas, vem negociando com livros no campus da UFMT.

AS- Sempre trabalhara como ajudante de meu pai na mercearia. Quando o negócio faliu, eu tive que sair de trás do balcão e assumir minha condição de estudante desempregado. Fiz alguns
trabalhos esporádicos. Na época eu tinha um amigo que possuia um sebo ambulante no campus da universidade e comecei ajudá-lo. Quando o meu amigo se formou ele desistiu do negócio e repassou-o para mim. Desde 92 eu instalei-me no saguão do instituto de linguagem (curso de letras) com uma banca fixa de compra e venda de livros usados. Ali, além de negociar com livros usados, nós promovemos uma exposição denominada "(EN)CANTO POÉTICO" onde o principal objetivo é divulgação de poetas brasileiros. Nomes como Drummond, Leminski, Quintana, etc. figuram como participantes desta iniciativa.

PC- Você acha que o estado tem a responsabilidade de incentivar os poetas, publicando e divulgando as suas produções?

AS- No caso brasileiro, onde a leitura é em geral deficitária, penso que o estado tem a responsabilidade de incentivar sim. A poesia poderia funcionar como um porta de acesso a esta leitura pretendida, principalmente para os jovens em idade escolar. É claro que esta poesia a ser subsidiada deveria ser filtrada, deve ser passada à críticas onde se estabeleçam uma qualidade mínima. Filtragem feita, por exemplo, por uma banca examinadora composta de leitores, de
críticos e de educadores. Isto não impediria porém, que poetas ou o próprio mercado editorial financiassem e divulgassem suas próprias publicações de poesia. Isto só ampliaria os suprimentos de poesia, que atualmente são tão precários, àqueles que se aventuram ao mundo da leitura.

PC- Você tem escrito poesia ultimamente, tem pensado numa nova publicação?

AC- Tenho escrito poemas sim, como sempre fiz. Mas não tenho pensado ainda em publicação. Tenho escrito poemas esparsos que, para facilitar a visualização, tenho chamado de "Lirismo à Flor da Pele". Tenho trabalhado também num poema um épico, sem estrofes, um poema longo e com rimas desencadeadas e sem conexão lógica entre elas.





Os Poemas




pé-de-verso

Uma folha branca:
Pede um verso meu!

Uma rosa branca:
Pede um verso meu!

Uma pauta em branco:
Pede um verso meu!

Uma árvore torta:
Pé de um verso meu!

Antônio Sodré - In: "A Besta Poética"



sonhostantostontossonhos

Os sonhos sonhei-os todos
num sonhar desesperado
até me perder sonhando
perdido no meu passado

recordações ilusórias
quimeras imagens tolas
gravadas no inconsiente
"pra" no presente repô-las!

suscitou-me pesadelos
assanhando meus cabelos
oh! era melhor não vê-los
soaram em vão meus apelos!

mas tem sonhos tão gostosos
dá vontade de comê-los
suaves vôos de aves
caravanas de camelos

flutuando...flutuando...flutuando
feito espuma colorida
e chego a pensar que a vida
é um sonho em movimento.

Antônio Sodré - In: "Empório Literário"


Um poema Inédito!


Nove Musas


Nove musas do Paraso
estavam todas sentadas

esperando a ocasião
para entrarem em ação

soprando versos e, então

a inspiração baixou

e eu, esperto que sou,
captei mais um poema
o tema vocês não sabem

e não saberão jamais

não sairá nas revistas

em TVs, rádios, jornais...

Pois é segredo sagrado

verso consagrado, santo
que em meio a doce canto

traz acalanto ao triste
e o ouvido não resiste

liras plangentes se ouvem

dedilhadas pelas musas

bailando, pisando em nuvens

tocando a canção do vento

a bordar entre colcheias,
semibreves, semifusas...


Antônio Sodré - In: Lirismo à Flor da Pele.


O Trem-poesia que Despertou o Poeta


O Trem de Ferro


Num trem,
em grande disparada,
pai
e filho corriam.
E ambos
o que viam?
As montanhas, os montes,
os horizontes,
o matagal cerrado os penedos
os rochedos,
os arvoredos...
Tudo a correr com a rapidez do vento
tresloucado.
E o trem, que era em verdade o que corria,

parecia estar parado.


A criança,
o petiz, cheio de espanto,
lhe perguntou:
"Papai,
por que é que tudo ao longe
está correndo tanto,

e o trem daqui não sai?!"


Os passageiros riam,
pois sabiam

que o petiz se enganava.

O trem, que parecia estar imóvel,

era de fato o que corria e voava.


Dos passageiros todos,
um,
somente nem de leve sorriu.
E então os passageiros riram dele
porque ele não riu.
E o poeta
(era um poeta...)
disse, então:
"É natural, senhores,
a ilusão
do petiz iludido.
Muitas vezes a nós
a mesma
coisa
já tem acontecido.
E vós, ó meus senhores,

- os cientistas, os sábios, os doutores -

caís no mesmo engano lisonjeiro,

pois, afinal,
todos nós nos enganamos,

quando, todos os dias, exclamamos:

— Como é que o tempo passa tão ligeiro!

...e nós é que passamos".



Catulo da Paixão Cearense, In: Fábulas e alegorias. Apud Ferreira, 1966.



Ilustrações: 1- O poeta Antônio Sodré; 2- Outra foto do poeta; 3- Capa do livro "Empório Literário".


Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve às segundas-feiras no ContemporARTES. Contará com a colaboração de Marilda Confortin (Sul), Rodolpho Saraiva (RJ / Leste) e Patrícia Amaral (SP/Centro Sul).
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Do livro direto para as telonas

Hoje, na coluna Drops Cultural, iremos comentar um pouco sobre grandes sucessos literários que viraram grandes produções do cinema.

Para começar a lista e aproveitando que o filme ainda está em cartaz, ou seja, dá para vocês terminarem de ler e sairem correndo para a próxima sessão, “Os homens que não amavam as mulheres”. O livro sueco é o primeiro da Coleção Millenium e foi lançado no Brasil no final de 2008, juntamente, com diversos artigos de jornal que contavam a história do autor. Stieg Larsson, autor e também jornalista, morreu em 2004 e não desfrutou da fama que a Trilogia Millenium atingiria.
O livro que tem mais 500 páginas é aquele tipo que te prende do começo ao fim, fazendo você mergulhar na história e querer vasculhar cada detalhe atentamente, junto com o jornalista Mikael Blookmvist, o personagem principal. Para os amantes de Agatha Christie, é a realização em poder continuar sentindo o cérebro trabalhando incessantemente, enquanto tentamos revirar o caso e os suspeitos, porém, num cenário muito mais atual e com questões políticas que considezem com nosso mundo contemporâneo.

Sinopse do livro
Os Homens que Não Amavam as Mulheres é um enigma a portas fechadas - passa-se na circunvizinhança de uma ilha. Em 1966, Harriet Vanger, jovem herdeira de um império industrial, some sem deixar vestígios. No dia de seu desaparecimento, fechara-se o acesso à ilha onde ela e diversos membros de sua extensa família se encontravam. Desde então, a cada ano, Henrik Vanger, o velho patriarca do clã, recebe uma flor emoldurada - o mesmo presente que Harriet lhe dava, até desaparecer. Ou ser morta. Pois Henrik está convencido de que ela foi assassinada.

O filme que estreou no Brasil em 2010, foi uma produção sueca, o que representou grande realidade na reprodução dos ambientes citados. O meu receio inicial ao ir assisti-lo foi com a edição, afinal, o livro tem 520 páginas e muitos detalhes que estão intensamente ligados com o desenrolar da história. Quanto a isso, não me decepcionei, o longo filme, com mais de 2h 30 minutos, representou bem a essência do livro.

Sinopse do filme
Harriet Vanger desapareceu 36 anos atrás sem deixar pistas na ilha de Hedeby, um local que é quase propriedade exclusiva da poderosa família Vanger. Apesar da longa investigação policial a jovem de 16 anos nunca foi encontrada. Mesmo depois de tanto tempo seu tio decide continuar as buscas, contratando o jornalista investigativo da revista Millennium, Mikael Blomkvist, que não está em um bom momento de sua vida, enfrenta um processo por calúnia e difamação. Mas, quando o jornalista se junta a Lisbeth Salander, uma investigadora particular nada usual, incontrolável e anti social, a investigação avança muito além do que todos poderiam imaginar.




Apenas um alerta, o filme não é recomendado para menores de 16 anos!


Continuando a nossa lista, agora com um livro encantador, suave e ao mesmo tempo intensamente triste, “O menino do Pijama Listrado”. Escolhi esse livro porque ele não se tornou uma mania nacional, assim como a Saga Crespúsculo e muito menos uma mania cinematográfica. Mas, como acredito na beleza, mesmo daquilo que é triste e doloroso, e que muitos preferem esquecer, irei comentar sobre ele.

O Menino do Pijama Listrado de John Boyne, na verdade, é uma bela história sobre amizade, uma verdadeira amizade.

Sinopse do livro:
Bruno tem nove anos e não sabe nada sobre o Holocausto e a Solução Final contra os judeus. Também não faz idéia de que seu país está em guerra com boa parte da Europa, e muito menos de que sua família está envolvida no conflito. Na verdade, Bruno sabe apenas que foi obrigado a abandonar a espaçosa casa em que vivia em Berlim e mudar-se para uma região desolada, onde ele não tem ninguém para brincar nem nada para fazer. Da janela do quarto, Bruno pode ver uma cerca, e, para além dela, centenas de pessoas de pijama, que sempre o deixam com um frio na barriga. Em uma de suas andanças Bruno conhece Shmuel, um garoto do outro lado da cerca que curiosamente nasceu no mesmo dia que ele. Conforme a amizade dos dois se intensifica, Bruno vai aos poucos tentando elucidar o mistério que ronda as atividades de seu pai. 'O menino do pijama listrado' é uma fábula sobre amizade em tempos de guerra e sobre o que acontece quando a inocência é colocada diante de um monstro terrível e inimaginável.



Como no filme anterior, também temi a edição, afinal o livro continha cenas de violência que eu realmente preferia não ver. Acho que leram meus pensamentos, a edição foi cuidadosa e o filme manteve a essência e principalmente a inocência do livro, mesmo mudando o narrador, uma vez que o livro era narrado por Bruno, garotinho de nove anos e personagem principal. O final do filme também foi diferente do final do livro, mas entendo a mudança e confesso que preferi o final mais dramático do cinema.




Espero que compreendam que essa lista é algo muito subjetivo, com comentários também subjetivos e que não tinham a menor intenção de se transformarem em críticas, ou algo mais elaborado.




Ana Paula Nunes é jornalista, Pós-graduanda em Mídia, Informação e Cultura pela Universidade de São Paulo/USP. Coordenadora de Comunicação da Contemporâneos, Revista de Artes e Humanidades. Escreve aos domingos no ContemporArtes.






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