MAIS PÓLVORA QUE POESIA



MAIS PÓLVORA QUE POESIA


Parte da história turbulenta do amor entre os poetas franceses A. Rimbaud e P. Verlaine foi registrada no livro Arthur Rimbaud: Correspondência, que serviu para o roteiro do filme Total eclipse (1995), com David Thewlis e Leonardo Dicaprio e para a peça Pólvora e poesia, de Alcides Nogueira (2001), que vemos agora em cartaz em Salvador (BA), sob a direção de Fernando Guerreiro.

Os títulos – do filme e da peça – aproximam metáforas quando sugerem o encontro de dois pólos: o sol e a lua, a poesia e a pólvora, a tradição parnasiano-simbolista e a vanguarda moderno-libertadora. Um e outro representados pelos poetas Verlaine e Rimbaud, respectivamente.

O segundo, com o espírito rebelde reivindica para si o direito “d’exécrer les ancêtres” recusando a “intelligence borgnesse” dos literatos passadistas, que inclui o primeiro. Rimbaud representaria a vontade de se criar outro mundo, em que o sujeito, em um movimento de fuga e ascensão, pudesse se descobrir de forma integral, absoluta, como instrumento para uma conquista da liberdade, de ruptura com os condicionamentos sociais organizados pela sociedade burguesa. Rimbaud vive aquilo que acredita ser a vocação do poeta, afinal:


Le Poète se fait voyant par un long, immense et raisonné dérèglement de tous les sens. Toutes les formes d’amour, de souffrance, de folie ; il cherche lui-même, il épuise en lui tous lês poisons, pour n’en garder que les quintessences. Ineffable torture où il a besoin de toute la foi, de toute la force surhumaine, où il devient entre tous le grand malade, le grand criminel, le grand maudit, — et le suprême Savant — Car il arrive à l’inconnu ! Puisqu’il a cultivé son âme, déjà riche, plus qu’aucun ! Il arrive à l’inconnu, et quand, affolé, il finirait par perdre l’intelligence de ses visions, il les a vues ! Qu’il crève dans son bondissement par les choses inouïes et innombrables : viendront d’autres horribles travailleurs; ils commenceront par les horizons où l’autre s’est affaissé ! (RIMBAUD, 341.)

Rimbaud escreve sua obra em cinco anos de uma adolescência intensa, tão imatura quanto madura, tão enevoada quanto lúcida. O fragmento acima aponta alguns elementos caros ao poeta, o que torna sua interpretação um dos grandes desafios da encenação de Guerreiro. Talis Castro traz algo de muito acertado na concepção do seu Rimbaud quando recria a inadaptabilidade do poeta e a revolta; o desejo de evasão pela insatisfação com o mundo real e a procura de uma experiência extraordinária; a descoberta de novas vivências e a ampliação/multiplicação dos sentidos; a tensão entre uma força que impulsiona o movimento de ascensão e outra a exercer pressão em sentido contrário.

Acontece que “os espíritos livres, que são os atormentados”, como Rimbaud, são controversos, ambíguos e imprevisíveis e, Talis Castro, parece não acreditar ou desconhecer essa dimensão ao optar por uma construção linear, over, sempre em decibéis acima da média. Seu Rimbaud ignora a direção da queda, que seria um dos movimentos fundamentais, na poesia-trajetória do enfant terrible.


Caio Rodrigo se apropria com menos autoridade de Verlaine e tem maiores dificuldades em transformar as palavras que soam muito literárias e ritmadas, ou como diria Valère Novarina, “a fala não é um comentário, uma sombra do real, a moedagem do mundo em palavras, mas algo vindo ao mundo como que para nos arrancar dele”, embora consiga entender melhor o processo de transformação do poeta, o seu gráfico dramático. É acertada, por exemplo, a opção pelo signo da troca de roupas, quando este coloca a calça de Rimbaud, numa clara alusão ao quanto o contato com o jovem poeta já alterava seu estado inicial, vigiado, conservador, dócil.

Aliás, o texto de Alcides Nogueira é um belo exemplo para discutir os binômios entre essência/naturalidade e cultura/assimilação. Não somos aqueles que queremos ser, mas aqueles que a sociedade desejou e se esmerou para que fôssemos. Verlaine é títere da sociedade burguesa, foi um resultado feliz da sociedade francesa dos anos 70 do século XIX: omisso, cabisbaixo, frágil, covarde. O contato com Rimbaud-pólvora muda decisivamente os rumos da sua vida e, por conseguinte, de toda a poesia francesa.


Djalma Thürler é Cientista da Arte (UFF-2000), Professor do Programa de Pós-Graduação Multidisciplinar em Cultura e Sociedade e Professor Adjunto do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA. Carioca, ator, Bacharel em Direção Teatral e Pesquisador Pleno do CULT (Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura). Atualmente desenvolve estágio de Pós-Doutorado intitulado “Cartografias do desejo e novas sexualidades: a dramaturgia brasileira contemporânea dos anos 90 e depois”.
Ler Mais

MUITAS MULHERES EM UMA SÓ

Este poderia ser um subtítulo para Cindy Sherman, fotógrafa norte-americana nascida em 1954. Ela estudou no Buffalo State College entre 1972 e 1976, direcionando o seu interesse para a fotografia que considerava como o meio de expressão apropriado à sociedade, dominada pelos meios de comunicação. As suas fotografias são retratos dela própria em vários cenários e segundo vários estereótipos de mulher - uma série de personagens e encenações cujas fontes são retiradas da cultura popular, designadamente de velhos filmes, telenovelas e revistas sensacionalistas.

Sua carreira  aborda uma das preocupações mais recentes de muitas artistas feministas: o fato de que a imagem tradicional da mulher ocidental: doce, sexy, servil foi moldada pelas necessidades e valores do sexo masculino. Tais imagens - dizem as feministas contemporâneas, que dominam o mundo das "grandes obras" -  refletem o poder de controle do "olhar masculino". Cindy desconstrói estereótipos de gênero  daqueles projetados pelo corpo coletivo da "grande arte" e pelo fenômeno moderno da televisão, revistas pornográficas e outros meios de comunicação.

Fotografias de estúdio brilhante da década de 1970 apresentam a própria artista em poses e roupas que chamam a atenção para o corpo como um objeto de política ou sexual, e ela recria estereótipos comerciais que zombam dos papéis subservientes que as mulheres têm como a "mulher pequena", a femme fatale, a boneca, a "pinup" ou a adolescente apaixonada.

Com a sua série dos anos 80, Film Stills, Sherman rapidamente ocupou um lugar de destaque no mundo da arte internacional. Enquanto estes trabalhos iniciais estão imbuídos de fortes sentimentos de introspecção e sensualidade provocatória, as fotografias que marcam o final da década de 80 possuem elementos de horror e decadência. No início dos anos 90, cria uma espécie de caricaturas de personagens históricas que retrata numa série intitulada History Portraits. A esta seguiram-se séries relacionadas com o sexo, com o horror e com figuras monstruosas. Alguns dos seus trabalhos fazem parte das colecções da Tate Gallery em Londres, da Corcoran Gallery em Washington e dos museus nova iorquinos MoMA, Metropolitan e Brooklyn.


Coração aos pedaços, após um divórcio em 1994 

Como uma colegial tipicamente americana

Estrela de cinema dos anos 40

Ensaio para a Revista Harper's Bazar

Uma cinderela debochada

Cindy como o deus Baco

A viajante

Uma velha senhora


Uma dona de casa desastrada

Cindy decide morrer

Mas sua produção não pára por aí, Cindy Sherman continua ativa, criando novas personagens, sempre auto-retratos, e chegou a fazer experimentos como cineasta em alguns filmes como "Office Killers", e claro, dando nó nas cabeças de psicanalistas, críticos de arte e todos aqueles que procuram entender e explicar suas imagens, já que dificilmente se consegue enquadrá-la em um estilo ou escola. A fotógrafa-camaleão conseguiu criar uma linguagem única e inimitável.

                                                    
                                                                ********************






Izabel Liviski é Fotógrafa e Mestre em Sociologia pela UFPR. Pesquisadora de História da Arte, Sociologia da Imagem e Antropologia Visual.  Escreve quinzenalmente às 5as feiras na Revista ContemporArtes.



Ler Mais

“Transformação prático sensível, do verde ao cinza.”





Desde a infância gosto de assistir filmes e, desde 2007, tenho buscado sanar algumas dúvidas com profissionais que me ajudam a entender os procedimentos técnicos de roteiro até pós-produção. Por acreditar que a obra áudio visual pode ser um importante meio de difusão cultural, tenho a pretensão de expressar o acumulo de conhecimento adquirido nas inúmeras possibilidades proporcionadas pela imagem estática ou em movimento.

Realizei a comunicação do meu projeto de dissertação, no IV Simpósio de Política e Cultura: Diálogos e Interfaces, do mestrado em História da Universidade Severino Sombra (USS), em Vassouras, interior do Rio de Janeiro.


Vilmar, Ana Maria, Soraia, Kathia, André e Filipe

O enfoque foi nas produções áudios visuais que venho me dedicando, mas assim como feito em Vassouras, afim de contextualizar citarei brevemente do projeto de dissertação:

“Do verde ao cinza: A primeira estrada de ferro do Estado de São Paulo e a sua influência no processo do desenvolvimento da industrialização até 1955”

A atividade prática humana no mundo sensível proporciona mudanças em todo o cenário natural. O homem, que apesar de também ser natureza, transforma meio em que vive. A história é, em primeira instância, a história da sociedade civil e o sujeito da história é o homem.

No livro intitulado “Região e Organização Espacial” o autor Roberto Lobato Corrêa cita que “A intervenção na natureza foi, em um primeiro momento, marcada pelo extrativismo, passando em seguida por um progressivo processo de transformação, incorporando a natureza ao cotidiano do homem como meios de subsistência e de produção, ou seja, alimentos, tecidos, móveis, cerâmica e ferramentas.” (7ª Edição, Editora Ática, São Paulo, 2000.)

Em São Paulo, nota-se uma alteração na paisagem com o escoamento de mercadorias realizado por tropas de muares. Os tropeiros que faziam o transporte das cargas até o porto de Santos, mas, nos fins do século XIX o volume de demanda do café chegou a um patamar que mesmo com diversas dificuldades a utilização do percurso chegou a colocar em risco a Mata Atlântica, ao atender as necessidades mercantis vigentes neste período. Os caminhos que os índios utilizavam foram gradualmente transformados em estradas, com o fluxo constante dos tropeiros foram feitas paradas para o descanso – pouso dos tropeiros –, feiras de trocas para os intercâmbios de mercadorias e o incipiente desenvolvimento do comércio nas proximidades do trajeto. O cultivo do café em SP começa a se expandir, assim como o aumento da procura internacional pelo insumo, os tropeiros não conseguiam mais dar suporte ao crescimento da demanda. Até que em 1854 o governo Imperial autoriza a implantação do sistema ferroviário, devido à falta de recursos para a consolidação Barão de Mauá procurou investidores na Inglaterra para a efetivação da proposta. A proposta foi aceita e, assim, consolidada a estrada de ferro São Paulo Railway com o intuito de realizar a interligação do oeste paulista ao porto de Santos, de forma mais eficaz. Apesar de estar pesquisando este tema há mais de três anos, de imediato, não é fácil se explicar sobre o desenvolvimento de São Paulo, mas, tenho grandes pretensões de continuar com esta pesquisa.

História e Cinema

Estou produzindo um documentário com apoio das instituições UFABC e CUFSA, que propõe a produção de um vídeo-documentário como instrumento pedagógico multidisciplinar de divulgação do patrimônio histórico relacionado à identidade dos ferroviários na Vila de Paranapiacaba. Elaboramos entrevistas para analisarmos a memória coletiva dos ferroviários que se estabeleceram na Vila de Paranapiacaba (Santo André-SP) durante o processo de implantação e desenvolvimento da primeira via férrea em solo paulista: São Paulo Railway. Por meio das narrativas e dos materiais de arquivos, pretendemos estabelecer um diálogo entre passado e presente, entre a memória e o espaço e entre as identidades dos grupos sociais que possuem algum vínculo com a Vila, na procura de aumentar a visibilidade ao passado relacionado aos protagonistas desta obra: os ferroviários.


Foto de Soraia O. Costa

O projeto está dividido em três etapas: pesquisa histórica e de campo (elaboração de entrevistas com ferroviários, seus familiares diretos, turistas e moradores da Vila de Paranapiacaba e estudiosos da memória dessa região); produção do documentário e exibição e debate com alunos de instituições do ensino superior, entidades, associações, sindicatos e núcleos de memorialistas que pretendam congregar o patrimônio ferroviário, para a população de Paranapiacaba e outros interessados. O público alvo são alunos, professores, ferroviários, especialistas ligados às áreas de engenharia, tecnologia e humanidades (destacando o caráter interdisciplinar do projeto), estimuladas, sobretudo na produção de novos conhecimentos gerados em exibições e debates. Ao final, pretende-se criar um registro histórico audiovisual de um importante fragmento da história brasileira, da ferrovia e dos ferroviários, assim como registrar a memória relacionada ao cotidiano, ao trabalho e às técnicas de antigos ferroviários da Vila de Paranapiacaba.

Além desta produção, estou desenvolvendo outro documentário sobre a área da Luz, em São Paulo. Este que temos a pretensão de salientar o contraste das mudanças na região, uma produção que o enfoque principal é elaborar, por meio de imagens, a história do Bairro da Luz. Com a intenção de difundir o conhecimento deste bairro de uma forma inovadora e dinâmica, explicar à intensificação das mudanças ocorridas em um dos principais bairros localizado na região central do Estado de São Paulo, a área da Luz.

Foto de Melina Resende

Essas mudanças da metrópole são promovidas pelos movimentos das contradições, transformações provocadas pela atividade do homem no mundo, em suma, a reprodução do espaço é um produto histórico.



Foto de Melina Resende



Foto de Melina Resende

O crescimento econômico determina a produção do espaço, em condição das mudanças e interesses econômicos houve a reestruturação do espaço. Como, por exemplo, os interesses mercantis, fins do século XIX, com a facilidade de transportes da estrada férrea e com as condições de energia atraíram fábricas, empreendimentos comerciários e o aumento da população e a paisagem que a predominância era vegetação verde começa a diminuir bruscamente e assim o cenário passa a se acinzentar.


Foto de Soraia O. Costa

Com orientações da professora Dra. Guiomar Ramos e da fotógrafa Melina Resende, esta que está produzindo o livro “Na Estrada Sul” chegamos à conclusão de que ficaria magnífico se contextualizarmos estes importantes momentos históricos na região central paulistana com alguns elementos significativos que ilustre cada período colocado em questão:

  1. Antes da chegada da ferrovia;


  2. Implantação da ferrovia inaugurada em 1864 até o fim da concessão inglesa em 1946;


  3. Degradação do Bairro: década de 1940 até 1970;


  4. Políticas públicas, “revitalização”: década de 1970 até hoje;


  5. ....................?



Foto de Melina Resende.

Percebi que a pesquisa bibliográfica é muito importante para dar base na elaboração do roteiro, da condução e do enfoque que o documentário pretende seguir.

Faremos uma troca com o bairro e aceitamos participação > uma ação em conjunto com autores, moradores e admiradores. Estamos criando, recebemos intervenções, sugestões e apoio para dar corpo ao conteúdo.

Como por exemplo, o Sr. João Carlos Matos de Carapicuíba-SP, que forneceu o material da visita que realizou na CPTM, caso queiram assistir, basta clicar em: "Entrando na Estação Luz vindo do Brás"




Soraia Oliveira Costa
Graduada em Ciênciais Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André (2009). Pesquisadora e documentarista do projeto Neblina sobre Trilhos sobre a memória ferroviária de Paranapiacaba - apoio institucional Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA), Universidade Federal do ABC (UFABC) e Ministério de Cultura e Educação MEC/SEsu. Pesquisadora do Intituto Brasileiro da Economia, Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (IBRE/FGV-SP). Participamm desta coluna o historiador Demócrito Mangueira Nitão Junior FSA/UFABC e a socióloga Marina Rosmaninho FSA/UFABC.

Ler Mais

Mataram o Cara



O título desta crônica é, por si, deveras horrível. Não imagino um leitor que lendo o título e sabendo do que se trate tenha sentido vontade de ler o texto por causa dele. Salvo por alguma repugnância. Dar a notícia desse jeito é banalizar o fato. E vou meter-me em terreno, agora, perigosamente delicado. Como falar da imensa indignidade que é um assassinato por motivo fútil, sem inseri-lo numa sequência de eventos semelhantes de modo a transformá-lo em algo corriqueiro e cotidiano semelhante a olhar para os lados antes de atravessar a rua?

Por isso, não ataco o centro nem passo ao largo da morte a facadas do professor de educação física Kassio Vinícius Castro Gomes. Ele – para usar a chatinha linguagem do direito que tem invadido os noticiários – fora supostamente assassinado por um aluno que supostamente teria se chateado com uma suposta nota baixa. É melindre demais. Por que não dizer o estrito, direto, caroço? Mas voltemos... Não pretendo passar ao largo, pois seria uma conivência, quase uma cumplicidade. Mas também não posso atacar o centro, pois aí eu seria parcial e quase sumário. Como não sei detalhes dos motivos nem posso dar ao (suposto - sic) culpado o direito de defesa ou de voz, termino indo ao mais amplo e geral.

Vi numa reportagem sábado que nossas escolas são palco de violência e que grassa a insegurança e a impunidade. Não o nego, mas não ‘calango’. Pouco se escuta falar que em nossas escolas e – pasmem – faculdades, proliferasse não só discursos, mas também práticas de promoção automática, de superprotecionismo, de cuidado excessivo para não constranger o aluno, de cuidado para não prejudicá-lo com uma reprovação ou nota baixa.

Não me entendam mal. Não sinto prazer nisso. Não é meu trabalho, nem trabalho de professor algum que eu conheça e possa apontar atribuir nota baixa a algum discente por prazer ou perseguição. Não nego que isso exista, só quero que entendam que não faço apologia. Entretanto, trabalho mal feito, copiado de Internet, atendendo parcialmente instruções e enunciados... Deixem o professor trabalhar. Deixem que o professor atribua o conceito em conformidade com seus critérios e com suas orientações. Deixem-no fazer isso que também é seu trabalho: ensinar ética, ensinar promoção por merecimento, ensinar que a matrícula no curso não é garantia de aprovação. Deveriam preocupar-se com aqueles que não fazem isso e por não fazê-lo prestam um desserviço.

Aí, a atividade não merece nem um “I” e chega-lhe o orientador de pesquisa para lhe dizer que seja condescendente. Se tiver baixo rendimento, tadinho, fica sem bolsa. Não deveria ser o contrário? Não deveria, desde o primeiro dia ter consciência de que não poderia tirar menos que “B”? A obrigação de bom rendimento para bolsistas não deveria ser um instrumento de promoção automática, mas de incentivo ao bom rendimento. Quer dizer: A obrigação de bom rendimento para bolsistas não deveria ser um instrumento de promoção automática, mas de incentivo ao bom rendimento?

Fiquei esperando ainda que a reportagem atacasse ou discutisse as causas de violência na escola. Esperando que apontassem a falta de limites de nossos jovens secundaristas. Ou falassem do pensamento pedagógico que tem predominado nas instituições de ensino brasileiras, cuja meta principal tem sido estáticas de promoção e de não evasão, e agora os índices qualitativos governamentais, em detrimento de fatores ligados à verdadeira aprendizagem e à promoção por mérito.

Acostumados desde as séries iniciais ao protecionismo absoluto, à não-reprovação e à falta de limites éticos, nossos jovens têm chegado desse jeito a faculdades e universidades. Disse que era delicado e perigoso esse terreno. Disse também que não iria atacar o centro do problema nem passar ao largo... O leitor já percebeu claramente: enquanto esse quadro perdurar em nossas escolas, a insatisfação por uma nota baixa ou uma reprovação, em vez de motivar o aprendizado, ainda poderá resultar em outros Kassios mortos a facadas, a tiros, a pontapés... a indignidade.


Belém, 13 de dezembro de 2010.

Abilio Pacheco é professor universitário, escritor e organizador de antologias. Três livros publicados. É membro correspondente da Academia de Letras do Sul e Sudeste Paraense (com sede em Marabá), integra o conselho de redacção da Revista EisFluências, de Portugal, é Cônsul dos Poetas Del Mundo para o Estado do Pará e é Embaixador da Paz pelo Cercle Universal des Ambassadeurs de la Pax (Genebra-Suiça).
Site: www.abiliopacheco.com.br.
Ler Mais

LANÇAMENTO VIA PALAVRA 10



VIA PALAVRA 10 - ESPAÇO LITERÁRIO NELLY ROCHA GALASSI

Criado em 1981 na cidade de Americana, interior de São Paulo, por Nelly Rocha Galassi (in memorian), Therezinha Rocha Poles e Ivanise Pântano, o "Espaço Literário Nelly Rocha Galassi" completou vinte e nove anos em abril 2010.


Iniciou sua trajetória com um pequeno grupo de pessoas que tinha como objetivo comum estudar a língua portuguesa e promover o contínuo aperfeiçoamento na arte de escrever.


Heterogêneo no estilo, formação, idade e profissão dos associados, durante muitos anos o "Espaço Literário Nelly Rocha Galassi" foi formado apenas por mulheres, passando, a partir de 1996, a contar também com a participação de escritores do sexo masculino.


Atualmente com 38 sócios, sendo 28 ativos, 3 correspondentes (de outras cidades), 3 honorários e 4 beneméritos, o grupo, que se reúne periodicamente duas vezes por mês para estudos, debates e leitura dos trabalhos, já publicou as seguintes coletâneas:

• 1989 - Revista "Nossas Crônicas e Poesias" - 7 autores - 100 exemplares
• 1991 - Revista "Momentos Poéticos" - 12 autores - 210 exemplares
• 1994 - Via Palavra 1 - 13 autores - 1.500 exemplares - J. Scortecci Editora
• 1995 - Via Palavra 2 - 16 autores - 1.500 exemplares - J. Scortecci Editora
• 1997 - Via Palavra 3 - 22 autores - 1.000 exemplares - Caminho Editorial
• 1998 - Via Palavra 4 - 32 autores - 1.500 exemplares - Caminho Editorial
• 2000 - Via Palavra 5 - 33 autores - 1.500 exemplares - Caminho Editorial
• 2002 - Via Palavra 6 - 42 autores - 1.500 exemplares - Caminho Editorial
• 2004 - Via Palavra 7 - 42 autores - 1.500 exemplares - Caminho Editorial
• 2006 - Via Palavra 8 - 44 autores - 1.500 exemplares - ViaPalavra Editorial
• 2008 - Via Palavra 9 - 31 autores - 1.000 exemplares - Gráfica e Editora EME

De acordo com o calendário de eventos, que prevê a publicação de um novo livro a cada dois anos, em 07 de dezembro último, o "Espaço Literário Nelly Rocha Galassi" lançou sua mais recente antologia:
• 2010 - Via Palavra 10 - 29 autores - 1.000 exemplares - ViaPalavra Editorial


A seguir, alguns poemas extraídos da nova publicação:


MIRAGEM
A vida já está tão sem brilho...

Os braços afastados,

Os beijos fingidos.

Elogios comedidos.

Amor em extinção.

Esperança já não resta.

Nem olhando pelas frestas.

Mas o coração está sempre acelerando.

Procurando algum afeto.

Como quem vê água no deserto.


Raquel Navarro

Pedagoga pro profissão, poetisa por paixão.



DA BELEZA

Da matéria efêmera e dispersa

O que se retém?

Nada. Quando muito, o belo.

Então, que nos bastem as flores da cerejeira

O Colibri pousado

Emoldurado pelo halo diáfano

Em torno da lua cheia...


Maria Lúcia Nascimento Capozzi
Professora de Língua Portuguesa e Literatura,
Pós-Graduada em Linguística pela UNICAMP.


PARALELOS

Corre o rio
E eu, corro e rio

Da semelhança do destino

Que faz o tempo das águas

Ser meu tempo de mágoas

E, com todo o desatino
Da água-alma
Que, sem temor,

Corre em busca do amor!...


Maria Cecília dei Santi
Formada em Pedagogia e Matemática


Geraldo Trombin é publicitário e membro do Espaço Literário Nelly Rocha Galassi, de Americana - SP (desde 2004), lançou em 1981 o seu livro “Transparecer a Escuridão”, produção independente de poesias e crônicas. Com mais de 160 classificações conquistadas em inúmeros concursos realizados em várias partes do país, tem trabalhos editados em mais de 60 publicações.
Ler Mais

Fotografia, memória e esquecimento


Fotografia, memória ou memórias, esquecimento:
“Fotografia é memória e com ela se confunde.” (Kossoy)1 ou
“a fotografia contribui para a memória, mas não é a memória”.2(?)

Por André Luiz Reis Mattos.

Entendo que a relação fotografia/real, tratada em artigo anteriormente publicado na revista Contemporâneos, esta vinculada no imaginário popular às questões da memória, ao desejo de que a pessoa, o objeto e o momento sejam preservados, e permaneçam “vivos” na expressão material da imagem registrada, e que o tempo, inexorável inimigo da vida, pois nos conduz invariavelmente a morte, seja vencido.

Na apresentação do livro “Memória e (Res)sentimento: Indagações sobre uma questão sensível”, Bresciani e Naxara, sinalizam para uma série de apreensões da memória:
Salvador Dalí, The Persistence of Memory, 1931.
Museum of Modern Art, New York. © Salvador Dalí.
Fundación Gala-Salvador Dalí, DACS, 2007
“(...) memória-faculdade intelectual, memória-conhecimento,... memória que se submete à história e a ela oferece suporte documental importante para suas narrativas... Memória-testemunho... Memória que pode se desprender de seu referente,... Memórias que transitam pelo apagamento de outras memórias... Memórias ressentidas... Memórias que podem atuar como advertência e rememoração de derrotas,... mas que também encontram lugar na afirmação positiva do direito à cidadania, ...”3



"A Planície do Esquecimento"
(Salvador Dali)
A memória em sua essência é abstrata, afetiva, subjetiva, o que não foi segregado ou confiscado. Mesmo que desta maneira “fatiada” em planos ou memórias, é o que permanece vinculado, presente, esquecido como medida de proteção ou mesmo oprimido, nas lembranças, nas diversas expressões da vontade individual ou coletiva, nas representações e símbolos, nos rituais e práticas de rememoração, nas imagens, nos espaços e nas paisagens transformadas; memória que vence o tempo e é reavivada, resignificada ou realimentada nas ações do sujeito histórico em suas diversas formas de manifestação.

Quando afirma que “Heródoto retoma e transforma a tarefa do poeta arcaico: contar os acontecimentos passados, conservar a memória, resgatar (termo substituído na atualidade por reavivar) o passado, lutar contra o esquecimento”, Jeanne Marie Gagnebin4 o faz após observar que este – Heródoto de Halicarnassus5, na tradição considerado o “pai da história”, apresenta como objetivo de suas investigações o desejo de “que a memória dos acontecimentos não se apague entre os homens com o passar do tempo.”6

Preservar a memória é criar uma imortalidade que a vida naturalmente impede, então para “vencer” o tempo é primordial “vencer” o esquecimento, e “Mnemosine7 é a principal aliada do ser humano.

Mnemosyne, por
Dante Gabriel Rossetti,
1828-1882, pintor e poeta inglês.
Os homens sempre utilizaram de artifícios para que o tempo e a morte não lhes condenassem ao esquecimento. Mitos de origem, tradições, feitos heróicos dos antepassados, permanecem nas diversas civilizações através das expressões da linguagem, inicialmente pela oralidade, capaz de transpor a passagem do tempo; é o “discurso mítico, que fala de um tempo longínquo, de um tempo das origens, tempo dos deuses e dos heróis, do qual só as musas podem nos fazer lembrar, pois, sem elas, não podemos saber (idem) daquilo que não vimos.”8. Acrescento ainda a estes artifícios os lugares de memória e a “obsessão comemorativa” que tomou conta de todas as sociedades contemporâneas nas últimas décadas do século XX9; e, por ser também linguagem, a fotografia.

Segundo Almeida10, existimos atualmente em uma sociedade oral cujo caminho comunicacional ocorre prioritariamente por imagens e sons. Para Jolly11, “a opinião mais comum sobre as características de nossa época, já repetida há mais de trinta anos, é que vivemos em uma 'civilização da imagem'”. As fotografias, mais do que meras ilustrações, são como afirma Barthes12, um “certificado de presença”; e na mesma dimensão como testemunho direto ou indireto de um tempo anterior, apresentando-se como “evidências no processo de reconstrução da cultura material do passado” (Burke)13, configuram-se como lugar manifesto de memória na sua função cognitiva, o conhecimento do passado, o que a aproxima também da ciência histórica.
_________
Notas:
1- KOSSOY, Borys. “Realidades e Ficções na Trama Fotográfica”. São Paulo. Ateliê Editorial. 4ª Edição. 2009, pp 8.
2- PARGA, Profº Drº Eduardo Lucas. Afirmativa proferida em avaliação do artigo “História e Fotografia: A memória visual das transformações das paisagens urbanas – Morro Dois Irmãos no Rio de Janeiro/RJ” de minha autoria, durante IV Seminário de História Social da Universidade Severino Sombra, Vassouras/RJ, em 6/10/2010.
3- BRESCIANI E NAXARA, Stella e Márcia. “Memória e (Res)sentimento: Indagações sobre uma questão sensível”. Editora Unicamp. SP. 2004. pp. 9/10.
4- GAGNEBIN, Jeanne Marie. “O início da História e as lágrimas de Tucídides”, in: Sete aulas sobre linguagem, memória e história. Imago Editora. RJ. 2005, pp 15.
5- “Heródoto de Halicarnasso foi um historiador grego, continuador de Hecateu de Mileto, nascido no século V a.C. (420 a.C. - 485 a.C.?). Heródoto de Halicarnasso foi o autor da história da invasão persa da Grécia nos princípios do século V a.C., conhecida simplesmente como As histórias de Heródoto. Esta obra foi reconhecida como uma nova forma de literatura pouco depois de ser publicada. Antes de Heródoto, tinham existido crônicas e épicos, e também estes haviam preservado o conhecimento do passado. Mas Heródoto foi o primeiro não só a gravar o passado mas também a considerá-lo um problema filosófico ou um projeto de pesquisa que podia revelar conhecimento do comportamento humano. A sua criação deu-lhe o título de "Pai da História" e a palavra que utilizou para o conseguir, história, que previamente tinha significado simplesmente "pesquisa", tomou a conotação atual de "história".”
6- Idem 8, pp 15.
7- “Mnemosine - A memória personificada, filha de Urano (o Céu) e de Gaia (a Terra), é uma das seis Titanides. Durante nove noites seguidas Zeus a possuiu na Pieria e dessa união nasceram as nove Musas. As nove filhas de Mnemosine (a Memória) e Zeus. Além de inspirar os poetas e os literatos em geral, os músicos e os dançarinos e mais tarde os astrônomos e os filósofos, elas também cantavam e dançavam nas festas dos Deuses olímpicos, conduzidas pelo próprio Apolo. Na época romana elas ganharam atribuições específicas: Calíope era a musa da poesia épica, Clio da História, Euterpe da música das flautas, Erato da poesia lírica, Terpsícore da dança, Melpomene da tragédia, Talia da comédia, Polímnia dos hinos sagrados e Urânia da astronomia.” KURY,  Mário da Gama. (1990). Dicionário de Mitologia Grega e Romana. Jorge Zahar Editor Ltda. Rio de Janeiro, RJ. pp. 405.
8- Idem 8, pp 15.
9- SEIXAS, Jacy Alves de. Citando Pierre Nora no seu trabalho Les lieux de memórie. “Percursos de Memórias em terras de História: Problemáticas atuais”, in “Memória e (Res)sentimento: Indagações sobre uma questão sensível”. Editora Unicamp. SP. 2004. pp. 37.
10- ALMEIDA, Milton José. Imagens e sons: a nova cultura oral. São Paulo: Cortez, 2001.
11- JOLY, Martine. Introdução à análise da Imagem. SP, ed. Papirus. 2009.
12- BARTHES, Roland. A Câmara Clara. RJ, ed. Nova Fronteira. 2008, pp 129.
13- BURKE, Peter. Testemunha Ocular: História e Imagem 2ª ed. S.P.: EDUSC. 2004, pp. 99.



Contribuição do leitor Profº André Luiz Reis Mattos, graduado em Administração pela UFRural/RJ e Licenciado em História pela UNIUBE/MG, Pós-Graduado em Docência do Ensino Superior pela FIJ/RJ e Mestrando em História Cultural pela USS, Vassouras/RJ. Fundador e Presidente entre 2008/2010 da Fundação Educacional de Três Rios/RJ e servidor do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Ler Mais