II Encontro de São Lázaro.






Entre os dias 13 e 17 de junho ocorreu em Salvador na Bahia, o II encontro de São Lázaro. A Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA, é conhecida como “São Lázaro”, pois seu campus se encontra próximo a Igreja de São Lázaro no bairro da Federação. Este evento atraiu pesquisadores renomados das mais variadas partes do mundo e do Brasil. O II Encontro propiciou um intercâmbio dos temas pesquisados nos cursos e programas de pós-graduação lotados no mais charmoso Campus da UFBA. Durante o encontro apresentei uma comunicação “Sacralização do espaço e o culto à personalidade de Stalin, durante o realismo socialista” e ministrei um minicurso “O uso de novas tecnologias para aquisição de fontes históricas”.

Uma das conferências mais interessantes foi proferida por István Mészáros. Durante as duas horas de conferência Mészáros apresentou a sua interpretação da atual crise do capitalismo. Para Mészáros a atual crise é uma crise estrutural, e não cíclica, portanto diferente das anteriores. O titulo de sua conferência foi “Crise estrutural necessita de mudança estrutural” ou seja, está explicito no enunciado que este pensador concebe esta crise com uma oportunidade de romper as estruturas que fundamentam o capitalismo, porém, ele reconhece que não é fácil realizar esta ruptura e por isso boa parte das suas palavras foram direcionadas para o dialogo com outros pensadores que também abordaram qual mecanismo seria o mais eficiente para realizar ações de confronto ao modelo de organização capitalista.
Abaixo segue a programação do encontro com informações colhidas da página FFCH-UFBA.
Fonte das informações abaixo: http://www.ffch.ufba.br/
No dia 13 de junho de 2011, aniversário de 70 anos da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, o Prof. István Mészáros proferiu a conferência "Crise estrutural necessita de mudança estrutural", abrindo o II Encontro de São Lázaro.
O Prof. Mészáros gentilmente nos autorizou a divulgar a tradução com a qual então oferecemos ao público presente uma versão em português do texto base de sua conferência.
Registramos a presença no Encontro de vários convidados, como Alberto Cupani, Ângela Santana do Amaral, Arley Ramos Moreno, Barbara Freitag, Chico de Oliveira, Claudia Mazzei Nogueira, Claudio Furtado, Cristiane Gottschalk, István Mészáros, Ivan Domingues, John Gledhill, Karin Alejandra Rosemblatt, Márcio Cataia, Marco Aurélio Nogueira, Maria Alice de Carvalho, Oswaldo Giacoia Júnior, Paulo Roberto Margutti Pinto, Ricardo Antunes, Sérgio Paulo Rouanet, Sidney Chalhoub e Zita Nunes.



Diogo Carvalho é Historiador pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente desenvolve mestrado pelo Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (UFBA), onde realiza pesquisas sobre o cinema soviético. Membro da Oficina de Cinema-História da Faculdade De Filosofia e Ciências Humanas (UFBA). Trabalha com os seguintes temas: cinema, culturas, História, cultural digital, política, humanidades e literatura beatnik. diogocarvalho_71@hotmail.com
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"Na Estrada da Vida", Nelson Pereira em: "Veja Esta Canção". Parte I






“Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente.
Filosoficamente”.
Oswald de Andrade (Revista de Antropofagia, Ano 1, No. 1, maio de 1928.)
 Tema da Bienal Internacional de São Paulo de 1998, a antropofagia é uma instância quase secular de apropriação de culturas e técnicas que são digeridas e lançadas na beleza da carência e da falta. Foi como uma denúncia de Oswald para chamar a atenção para a dor de ser, de ser..., sabe se lá o que... A falta de (re) conhecimento de sua própria cultura é  a maior dor social brasileira.
Abaporu, 1928 (Tarsila do Amaral)
“ A arte como a redenção do que sofre – como via de acesso a estados onde o sofrimento é querido, transfigurado, divinizado, onde o sofrimento é uma forma de grande delícia”. (Nietzsche, 1983, VP, # 853, p.28).

A família enferma, 1920 (Lasar Segall)
Contam que a tela “Abaporu”, 1928, um presente de Tarsila do Amaral a Oswald de Andrade, propulsionou a criação do pensamento antropofágico. Grande quadro que gerou polêmicas, discussões e muitas criações nas artes plásticas, literatura, música e cinema: As Bachianas Brasileiras de Villa Lobos,  A Tropicália de Caetano .... o Cinema Novo de Nelson Pereira dos Santos e de Glauber Rocha...

Cena do filme "Na Estrada da Vida"

"A estrada da vida"
(José Rico)

Nesta longa estrada da vida      
Vou correndo não posso parar
Na esperança de ser campeão  

Alcançando o primeiro lugar
Na esperança de ser campeão
Alcançando o primeiro lugar       

Mas o tempo
Cercou minha estrada
E o cansaço me dominou           

Minhas vistas se escureceram
E o final da corrida chegou....

Este é o exemplo da vida
Para quem não quer compreender  

Nós devemos
Ser o que somos
Ter aquilo que bem merecer     

Nós devemos
Ser o que somos
Ter aquilo que bem merecer... 


Mas o tempo
Cercou minha estrada
E o cansaço me dominou        

Minhas vistas se escureceram
E o final desta vida chegou...


Uma música que inspirou um filme, foi assim em “Na Estrada da Vida”, 1979.  Nelson Pereira dos Santos reproduz, em parte, a longa caminhada da dupla sertaneja Milionário e José Rico em busca de fama e sucesso. Sem a produção e o sucesso de “2 Filhos de Francisco”, 2005, que conta a vida de Zezé di Camargo e Luciano,  “Na Estrada da Vida” encanta mais pela simplicidade e autenticidade das cenas do que pelo apelo dramático.  Com vontade de realidade documentária, Nelson Pereira fez a dupla vivenciar sua própria realidade,  veredando muito mais pelos campos suaves e aparentemente incrédulos da comédia do que pelo convencimento do drama. O sertanejo de raiz em confronto com a cultura de massa e suas exigências de mercado: esse é o centro da discussão fílmica.


É possível entender como a música sertaneja de raiz foi se modificando para entrar nos hits de sucesso nas rádios de todo país. O  filme mostra o sertanejo que sai de seu lugar, de sua terra,  carregando consigo sua arte e cultura, evidenciada no seu jeito de falar, andar e vestir.  No decorrer da estrada da vida, vão surgindo  modificações, agregando outros valores ao "purismo" sertanejo. Este movimento é bem interessante pois proporciona o entendimento da gênesis das misturas.
Falar de cultura do povo brasileiro é sempre uma tarefa árdua, pois esta questão perpassa  por muitas variantes histórias e sociais, numa rede de hibridismos e miscigenações. A cultura popular brasileira foi sendo modificada na medida em que entrou em contato com a cultura de massa, midiática e erudita.
Se nos voltarmos para o início do sec. XX , vemos no surgimento do modernismo e do pensamento antropofágico uma necessidade do Brasil alcançar o mercado artístico mundial e ser visível lá fora. Os artistas intelectuais brasileiros queriam mostrar para o mundo o povo, a terra, a dor e a alegria de ser brasileiro.
Mas como fazer isso dentro de uma estética ultrapassada? Foi necessário um movimento grande por parte destes artistas para dar uma reviravolta nos conceitos estéticos arraigados no academicismo da época. Implantar o conceito de uma arte que deveria mostrar o povo miscigenado e sua terra.
Para tanto, foi preciso denunciar nas obras os arranjos e desarranjos sociais, evidenciados nas moradias dos morros e na pobreza; no entanto também era preciso mostrar as belezas do clima, das mulheres e das frutas tropicais.  
Da intelectualiade dos artistas brasileiros e das visões destes a respeito da cultura popular brasileira, nasceu o nosso “ismo”. O êxodo, o índio, a mulata, a pobreza, o caipira, o negro, a favela passaram a ser temas das obras. Este movimento não poderia ser chamado de Expressionismo, Cubismo, Futurismo, Dadaísmo, Impressionismo, porque estes já existiam. A Antropogafia seria o caminho para fortalecer o nosso Modernismo. Do canibalismo dos “ismos” europeus, engolido na marra, nasce o nacionalismo brasileiro, nasce a Antropofagia. Para o bem e para o mal, o  reconhecimento do povo brasileiro pela ótica intelectualizada dos modernistas fez perpetuar o estereótipo tupiniquim .
Por ser o Brasil um país marcado pela grande extensão territorial, é possível encontrar uma diversidade cultural enorme, desde o pequeno vilarejo às grandes metrópoles. É muito difícil para o brasileiro conhecer o Brasil.
A dupla Milonário e José Rico
A falta de identidade é característica do povo brasileiro, como Macunaíma, o herói sem caráter. Sem dar conta da  própria grandeza e magnitude cultural é que nasce-se, vive-se e morre-se aqui no Brasil.  É obvio que há nisso tudo a contribuição  de políticas públicas e interesses sociais sedimentados  na nossa tradição escolar e política de não valorizar e estudar o próprio povo. Desde a Educação Infantil até o Ensino Superior não se conhece, não se valoriza nossas raízes étnicas, nossas tendências primeiras e derivadas. É por esse motivo que não se discute temas como cultura e sociedade. Simplesmente não fomos acostumados a pensar sobre nós mesmos seriamente. Fica para os magnatas da mídia instruir, “educar” e mostrar aquilo que lhes convém. 
 "Na Estrada da Vida"  faz algumas pessoas tremerem pelo medo de que o Brasil, de alguma forma, possa se parecer com o retrato mostrado no filme. 
Os Brasis;  dos sertões,  dos caipiras,  dos morros, da miscigenação cultural, continua. É preciso ver, crer e se apropriar dele.
Na próxima coluna, AS HORAS , vou analisar o filme "Na Estrada da Vida". Enquanto esperam, que tal ouvir a dupla em um programa de auditório. Programas de Auditório, herança americana de misturar cultura popular com cultura de massa.  De novo, para o bem e para o mal, estes são, muitas vezes,  os únicos lugares em que povo brasileiro pode, mesmo que  enlatado, se reconhecer. 



Bom filme!

Nelson Pereira dos Santos


Kátia Peixoto é doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Mestre em Cinema pela ECA - USP onde realizou pesquisas em cinema italiano principalmente em Federico Fellini nas manifestações teatrais, clowns e mambembe de alguns de seus filmes. Fotógrafa por 6 anos do Jornal Argumento. Formada em piano e dança pelo Conservatório musical Villa Lobos. Atualmente leciona no Curso Superior de de Música da FAC-FITO, na FPA -Faculdade Paulista de Arte e na UNIP nos Cursos de Comunicação e é integrante do grupo Adriana Rodrigues de Dança Flamenca sob a direção de Antônio Benega
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O OLHAR ESTRANGEIRO de MAUREEN BISILLIAT



Em cartaz no Museu Oscar Niemayer (MON) em Curitiba, a exposição da fotógrafa inglesa naturalizada brasileira, Maureen Bisilliat.
Nascida no ano de 1931 em Surrey, veio pela primeira vez ao Brasil em 1952 fixando-se definitivamente no país em 1957, em São Paulo. Nas palavras da fotógrafa, "o Brasil foi uma procura de raízes, que eu não tive quando criança. Nasci na Inglaterra, mas vivi em muitos lugares. Meu pai era diplomata, o que me obrigou a uma vida meio camaleônica. O destino me amarrou ao Brasil. Foi um ficar querendo."
Trabalhou como fotojornalista para a Editora Abril entre 1964 e 1972 na revista Quatro Rodas mas se destacou sobretudo na extinta revista Realidade.
Em 50 anos de intensa atividade, Bisilliat conseguiu produzir uma obra autoral, onde registra as cores e a multiplicidade do povo brasileiro, e em destaque a série onde busca retratar os personagens de grandes escritores da literatura brasileira.
Em dezembro de 2003 sua obra fotográfica completa com mais de 16.000 imagens, incluindo fotografias, negativos preto e branco e cromos coloridos, nos formatos 35mm e 6cmx6cm, foi incorporada ao acervo fotográfico do Instituto Moreira Salles.

Nas palavras de Paulino Viapiana, Secretário de Estado da Cultura, tradicionalmente as imagens acompanham textos como um caminho de dar forma à imaginação. Mas mais do que ilustrar, as fotos de Bisilliat são o próprio texto, ela é de fato uma fotógrafa que escreve. Com todas as imagens.
Consegue dar forma, traduzir, materializar, tridimensionar as palavras de mestres como Euclides da Cunha, Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto, Jorge Amado, Adélia Prado dentre tantos outros que serviram de fonte para seu trabalho.

Suas fotos dão outro sentido à alma do sertão que parece não ter alma. Nelas podemos sentir a presença do calor, da seca, da aridez, e também da luz, umidade, cor e transparência.
Mesmo que a artista ache ser impossível aprisionar a alma, suas fotos a revelam. Registram o vigor, o sopro dos ventos que a limpa e a deixa à mostra. Ela consegue captar imagens de anjos de cara e pele pretas e ir para além da cor, do pó, do árido, do sertão.
De retratar o calor do sol, a simplicidade e a leveza da alma em meio à lama. Pura poesia, prosa ou romance. Pura literatura.












Para a fotógrafa, a exposição é "um chamado ao passado, e tem me dado, apesar das dúvidas sem fim, o prazer de um reencontro com um eu perdido no tempo: um algo de mim em outras dimensões."





Izabel Liviski é Fotógrafa e Mestre em Sociologia pela UFPR. Pesquisadora de História da Arte, Sociologia da Imagem e Antropologia Visual.  Escreve quinzenalmente às 5as feiras na Revista ContemporArtes.



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Guerras e violências são discutidas no Café com PP amanhã




Amanhã, no Café com PP, evento que une arte e discussões de políticas públicas na atualidade, serão discutidos os temas: Memória, traumas e guerra (comigo) e Determinantes agrário da guerra civil (com Prof. Artur. Zimmerman). Nós dois compomos os quadro de docentes da UFABC. Para abrir o debate foi convidada a aluna Débora Ishikawa que fará uma apresentação de arte circense denominada "O Beijo", ao lado de seu parceiro, Alessandro Coelho.
O evento acontece a partir das 16h na quadra e auditório do Bloco Sigma da UFABC (Rua João Pessoa, 59, Centro), São Bernardo do Campo.

Mais detalhes estão no site: http://bpp.ufabc.edu.br






Mais notícias do meio acadêmico:

LANÇAMENTO DE LIVRO
 Entre Tipos e Recortes - Histórias da Imprensa Integralista, organizado por Leandro Gonçalves e Renato Simões
O livro possui 16 capítulos escritos por professores e pesquisadores do movimento integralista brasileiro. Com prefácio de Giselda Brito Silva (UFRPE) e apresentado pelo autor de Ideologia Curupira: análise do discurso integralista, Gilberto Felisberto Vasconcellos (UFJF) o livro tem como objetivo analisar a importância da imprensa no interior do movimento integralista desde a década de 1930 até os movimentos atuais do século XXI. 
Com 432 páginas o livro será lançado oficialmente no XXVI Simpósio Nacional de História (ANPUH) que ocorrerá na USP no mês de julho, mas caso exista interesse o livro pode ser adquirido por R$ 35,00 através do e-mail: renasimoes@hotmail.com 









LANÇAMENTO DE LIVRO


MULHERES, HOMENS, OLHARES E CENAS
(Editora UFPR)
na terça feira, dia 21 de junho, 19:30 na Livraria Curitiba do Shopping Estação (Curitiba - PR). Este livro é fruto de um longo trabalho que iniciamos junto com outras colegas do Núcleo de Estudos de Gênero da UFPR, a partir dos primeiros ciclos de cine-debate que organizamos sobre representações de gênero no cinema contemporâneo. Reúne textos deestudios@s nacionais e estrangeiros.
Organizadoras:  Miriam Adelman, Amelia Corrêa, Lennita Ruggi e Ana Carolina Rubini Trovão.








LANÇAMENTO DE LIVRO DO NOSSO COLUNISTA GERALDO TROMBIN







LANÇAMENTO DE LIVRO



LANÇAMENTO DA WAK EDITORA


Título: TORNE SUAS AULAS DE PORTUGUÊS UM MOMENTO AGRADÁVEL


             AUTOR: SÉRGIO SIMKA


               Formato: 14x21cm   -  140 páginas    


               ISBN/COD. BARRAS:  978-85-7854-136-1
                Preço: R$ 26,00


Há uma ideia generalizada de que a aula de Português costuma arrancar suspiros de tédio de alunos supostamente desinteressados. Tal fato pode ser constatado perguntando a qualquer um sobre o grau de satisfação que uma aula de Português pode atingir. Esta, que deveria abrir mentes e formar cidadãos capazes de ler e produzir um texto, tem levado uma multidão a detestar por tabela o próprio idioma, afastando-a criminosamente do acesso a “universos culturais” que o domínio da linguagem implica.


            Este livro traz, para tentar minimizar essa situação, sugestões e reflexões que tornarão as aulas de Português um momento mais agradável porque, além de abordar assuntos importantes, como metodologia, criatividade, autoestima textual e estratégias de produção textual ancoradas na Pedagogia do Encantamento, se destina ao professor que considera o aluno, não como um mero registro escolar falante, mas como um ser humano que merece, antes de quaisquer teorias de cunho pedagógico, linguístico, psicológico, sociológico etc., o nosso respeito e admiração.  


www.wakeditora.com.br      (21) 3208-6113


Ana Maria Dietrich é editora-chefe da Contemporâneos-Revista de Artes e Humanidades e coordenadora junto a Rodrigo Machado da Contemporartes-Revista de Difusão Cultural. Profa. Dra. Adjunta da UFABC.
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Tirando da Gaveta









Acordou com idéia fixa, mas evitou a decisão precipitada. No criado-mudo, guardava seus textos: poemas, contos, romances iniciados, um quase no fim.
Passou o dia pensando na decisão. Não poderia ser algo fruto apenas do impulso. Mas estava decidido que não passaria desse dia. Na hora do almoço, sentou-se à beira da cama. Olhou demoradamente antes de se inclinar e abrir a primeira gaveta. Nas últimas vezes, apenas pusera uma bola de naftalina em cada compartimento.
Desta vez, não. Há muito tempo já deveria ter resolvido tirar dali os manuscritos e dar-lhes o destino merecido. Não havia porquê esperar. Juntou-os todos do jeito que estavam e desceu às pressas as escadas que levavam à varanda. Antes que capitulasse, jogou tudo num dos tonéis de lixo e ateou fogo.






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Poesia na Música de Caetano Veloso!



POESIA DE LETRA II
CAETANO E SEU "QUERERES"

por Altair de Oliveira


Para aproveitar a deixa do "Dia dos Namorados" que, bem ou mal, acabamos de engolir embalados pelos "jingles" do pessoal da publicidade e pelo amor, a nossa coluna de poesia comovida volta ao tema da semana passada, onde ressaltamos as características poéticas de alguns autores da música brasileira contemporânea. Desta feita falamos sobre a letra da música "O Quereres" do polêmico e genial baiano Caetano Veloso, um músico que é também considerado grande poeta e que já trabalhou em versos de poetas como Paulo Leminski, Oswald de Andrade e Gregório de Matos, entre outros.

No poema "O Quereres" o poeta Caetano Veloso, que é também um dos criadores do movimento Tropícália, utiliza de antíteses e paradoxos, além de outras figuras (principalmente as sonoras), para construir numa linguagem atual um canto moderno e rápido, que deixa no ar um rosário de motivos de dúvidas que parecem fazê-lo dançar para deixar tonto um interlocutor ou interlocutora que parecia ter simplesmente perguntado: "Você me ama?" ou "Casa comigo?" Sem todavia conseguir responder a pergunta, provando assim por A mais B, como estas questões do amor são difíceis em nosso tempo se a versatilidade do tempo for levada em consideração pelos seres humanos atuais. Animais versáteis, dinâmicos, tecnocratas e, portanto, mutantes e divorciáveis. O poeta, então, ao versar sobre o amor tergiversa.

Gostaria que observassem atenciosamente à quarta estrofe deste poema, onde Caetano faz um belo paralelo entre as dificuldades de amar e de se escrever poesia moderna. Não podemos nos esquecer que na época em que o poema foi escrito predominava ainda em nossos meio literários fortes movimentos, engajados nas escolas de vanguardas, que pregavam a soberania do verso livre, às vezes decretando não só a morte do poema rimado e metrificado, como também a morte da própria poesia escrita. Ao fazer poesia para cantar, diria eu, o poeta é politicamente correto e, não mente, somente novamente tergiversa. Mesmo assim ele ainda nos encanta, cantando com poesia as dificuldades de se contar ou de se cantar o amor em nossos dias. Uma deliciosa semana para todos vocês, que continuem enamorados!


***

O QUERERES


Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão

Onde queres descanso, sou desejo

E onde sou só desejo, queres não

E onde não queres nada, nada falta

E onde voas bem alto, eu sou o chão

E onde pisas o chão, minha alma salta

E ganha liberdade na amplidão


Onde queres família, sou maluco

E onde queres romântico, burguês

Onde queres Leblon, sou Pernambuco

E onde queres eunuco, garanhão

Onde queres o sim e o não, talvez

E onde vês, eu não vislumbro razão

Onde o queres o lobo, eu sou o irmão

E onde queres cowboy, eu sou chinês


Ah! Bruta flor do querer

Ah! Bruta flor, bruta flor


Onde queres o ato, eu sou o espírito

E onde queres ternura, eu sou tesão

Onde queres o livre, decassílabo

E onde buscas o anjo, sou mulher

Onde queres prazer, sou o que dói

E onde queres tortura, mansidão

Onde queres um lar, revolução

E onde queres bandido, sou herói


Eu queria querer-te amar o amor

Construir-nos dulcíssima prisão

Encontrar a mais justa adequação

Tudo métrica e rima e nunca dor

Mas a vida é real e é de viés

E vê só que cilada o amor me armou

Eu te quero (e não queres) como sou

Não te quero (e não queres) como és


Ah! Bruta flor do querer
Ah!
Bruta flor, bruta flor


Onde queres comício, flipper-vídeo

E onde queres romance, rock´in roll

Onde queres a lua, eu sou o sol

E onde a pura natura, o inseticídio

Onde queres mistério, eu sou a luz

E onde queres um canto, o mundo inteiro

Onde queres quaresma, fevereiro

E onde queres coqueiro, eu sou obus

O quereres e o estares sempre a fim
Do que em ti é em mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal

Bem a ti, mal ao quereres assim

Infinitivamente impessoal

E eu querendo querer-te sem ter fim

E, querendo-te, aprender o total

Do querer que há, e do que não há em mim




Poema de Caetano Veloso, do disco "Velô" - 1984


***

Para ler mais sobre Caetano Veloso:

- Biografia e discografia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Caetano_Veloso
- Trabalhos recentes de Caetano: http://www.caetanoveloso.com.br
- Letras de Caetano: http://letras.terra.com.br/caetano-veloso/


***


Ilustrações: 1- foto do poeta Caetano Veloso; 2- foto da do disco "Velô", de Caetano; 3- foto do quadro "Silêncio Com Sentença Musical", de Juarez Machado.


***

Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve quinzenalmente às segundas-feiras no ContemporARTES a coluna "Poesia Comovida" e conta com participação eventual de colaboradores especiais.




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Amado Capitão


             Já culminava à meia-noite, a lua elucidava a pequena cidade de Camamu, na Bahia. Era uma noite triste e com o passar das horas luzes iluminavam o interior dos acanhados casebres, gatos miavam nos becos e, como de costume, raparigas esperavam pelos viajantes que viriam a desembarcar no porto. Ansiosa eu esperava por meu amado, eis que estava disposta a passar a noite observando os reflexos do mar, as estrelas do céu, até que meu amado Capitão chegasse e a saudade que me amargurava a cada segundo acabasse.
           
      Aos poucos recordava o primeiro encontro, à troca de olhares, o redemoinho no estômago, o primeiro e inesquecível beijo e mais tarde, o nosso enlace. Um amor avassalador, ora doentio, ora sadio. A espera continuava e finalmente ouvi o apito e a luz ainda longe. Uma nova brisa soprava meus cabelos e me levantara o ânimo.
            
      O tempo foi consumindo e à medida que os viajantes desembarcavam meu coração disparava. Era muito tempo sem uma palavra sussurrada ao ouvido, um beijo, um toque.
             
            No semblante dos marinheiros notei tristeza e aflição, pareciam esconder-me algo e soluçando vertia insondáveis lágrimas imaginando o que poderia ter acontecido. Enfim, a notícia: meu amado capitão havia se afastado para sempre. A morte o levara discreto e surdamente para onde eu não poderia encontrá-lo.
             
           Hoje percebo que o tempo passa, mas há instantes que ficam. E vejo muitas pessoas viverem de certezas. Outras, porém, de incertezas. Eu continuo a viver do mais sublime sentimento: o amor.

            Penso que um dia o tocarei e o meu fascínio por seus olhos voltará a satisfazer todos os meus desejos. Toda noite me vejo junto dele e hoje estou a desfrutar novamente dos raios da lua refletindo sobre o mar, que um dia hão de me levar para junto dele, o meu Amado Capitão.


Maikely Teixeira Colombini, nascida em 1989. É natural de Mimoso do Sul, Espírito Santo, mas viveu grande parte da sua vida em Cachoeiro de Itapemirim. Hoje é graduanda em Letras com Licenciatura em Português e Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais.  Entre as suas grandes paixões está a Literatura. Atualmente está pesquisando os Espaços íntimos e espaços públicos na narrativa de Joaquim Manuel de Macedo. Áreas de interesse: Linguística, Letras e Artes, e mais especificamente, Literatura Brasileira.

A Contemporartes agradece a publicação e avisa que seu espaço continua aberto para produções artísticas de seus leitores.


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