Poesia e Música: o ser humano revelado



Olá companheiros de leitura! Ao pensar sobre o que escrever essa semana para a coluna “Escritos contemporâneos”, confesso que muitas ideias sobrevieram à minha mente. No entanto, passaram por mim, como o vento que beija nossos cabelos em uma tarde de verão.

Percebi que eu ainda não havia dado o valor merecido a uma das Artes que julgo mais belas, a música. Há vários tipos de músicos, canções, assim como de literatura. Se pensarmos atentamente entre uma possível relação existente entre as letras das canções que escutamos no rádio, na TV, no computador e a poesia intuitivamente vislumbraremos uma aproximação tão grande, a ponto de confundirmos as duas artes. O que diferencia a música da literatura, ou melhor, o que as aproxima?


Uma diferença interessante entre essas expressões artísticas é que a canção, não necessariamente necessita de uma letra a ser cantada, pode ser elaborada com o aspecto instrumental. Há várias divisões existentes em relação à Canção, como também à poesia. Em relação ao primeiro deles, destacamos: hino, balada, cântico, canção folclórica, canto gregoriano, canção de ninar, madrigal, canção popular, entre outras; Já na lírica encontramos sonetos, poemas em prosa, ode, sátira, idílio, elegia... Ambas possuem elementos em comum como a preocupação estética, o ritmo, rima, aliterações, assonâncias, discurso fragmentado, ambíguo, multideterminado.

A lírica, em sua gênese, era composta para ser cantada com acompanhamento de um instrumento chamado Lira. Os poetas compunham a fim de cantar a poesia que vislumbravam no mundo e também com intuito de difundir sua Arte, uma vez que apenas uma pequena parte da população era alfabetizada, utilizando a oralidade para  que a palavra permanecesse. Com o surgimento da escrita e sua difusão, o ser humano passou a, quase que exclusivamente, escrever seus poemas, relegando o cantar a um segundo plano.

O grande poeta de Língua Portuguesa, Camões, escreveu tanto poemas líricos, quanto canções belíssimas. Vejamos um estrofe da canção II camoniana (outras canções desse poeta podem ser acessadas aqui):

Se este meu pensamento,
como é, doce e suave,
de alma pudesse vir gritando fora,
mostrando seu tormento
cruel, áspero e grave,
diante de vós só, minha Senhora,
pudera ser que agora
o vosso peito duro
tornara manso e brando.
E eu que sempre ando
pássaro solitário, humilde, escuro,
tornado um cisne puro,
brando e sonoro pelo ar voando,
com canto manifesto,
pintara meu tormento e vosso gesto.

O ser humano utiliza a canção para variados fins como expressar o amor por alguém ou algo, apresentar o descontentamento com alguma situação, denunciar algo, dentre muitas outras coisas. É interessante notar como é abrangente a finalidade da canção. Ontem, ao acordar, escutei uma música de Vanessa da Mata (para mim uma das melhores cantoras e compositoras brasileiras) que com seu tom humorístico, denuncia o contexto contemporâneo de consumismo desenfreado. Tal música tem como título “Bolsa de Grife”:
Comprei uma bolsa de grife
Mas ouçam que cara de pau.
Ela disse que ia me dar amor
Acreditei, que horror
Ela disse que ia me curar a gripe
Desconfiei, mas comprei
Comprei a bolsa cara pra me curar do mal
Ela disse que me curava o fogo
Achei que era normal
Ela disse que gritava e pedia socorro
Achei natural

Ainda tenho a angústia e a sede
A solidão, a gripe e a dor
E a sensação de muita tolice
Nas prestações que eu pago
Pela tal bolsa de grife

Nem pensei
Impulso
Pra sanar um momento
Silenciar barulhos.
Me esqueci de respirar
Um, dois, três
Eu paro
Hoje sei que tenho tudo
Será?
Escrevi em meu colar
Dentro há o que procuro

Meu amigo comprou um carro
Para se curar do mal

A artista quando foi perguntada sobre o conteúdo da letra musical, disse que gostaria mesmo de retratar o consumismo humano, a necessidade que as pessoas têm de comprar para sentirem-se bem. É realmente isso que a letra musical nos passa após sua leitura. Ela aponta para o caráter supérfluo de comprar em que nos embrenhamos a cada dia em busca de sentimentos  que nos satisfaçam mental e corporalmente.

Tanto a música quanto a poesia são importantes maneiras de revelar a percepção humana de mundo, a memória cultural na qual as pessoas viveram e vivem. Enfim, são formas artísticas que além de agradar a olhos e ouvidos, tornam a todos mais críticos e perspicazes.





Rodrigo C. M. Machado é Mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa.
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São Paulo em Cena III – O RAP em SP


Este “São Paulo em Cena III” foi dedicado exclusivamente ao RAP, o ritmo e a poesia na toada de SP. O discurso sonoro surge com letras musicais que soam como manifestos embalados por ritmos bem marcados que são comandados por uma dupla composta pelo DJ  (efeitos sonoros e mixagens) e MCs (rimas cantadas).  O som que veio da periferia, de bairros pobres de Nova Iorque e se expandiu para subúrbios de outras metrópoles, chegou ao Brasil na década de 1980 sob os olhares desconfiados dos músicos e de todos seres que sentiam neste gênero a maldição do crime, da pobreza, da miséria e da escória da sociedade. O RAP elucida e sustenta um certo desconforto ao explicitar o abismo gerado pela estratificação social que fortalece a cada instante a máxima sartreana; “O inferno são os Outros”.  O “ver pra crer”, o testemunho do outro ou de si próprio é "a real". O que acontece longe dos olhos e portanto longe do coração não pode ser  "a real".  O RAP tem como compromisso levar o drama pra perto dos olhos e do coração.  Numa exaltação da auto-estima,  a manifestação da dor  também pode ser transformada em alegria, festa e protesto. O RAP abre os olhos e os ouvidos de todos para que, na "correria" do dia-a-dia, possam crer naquilo que  pensavam nunca precisarem ver.

Um dos primeiros LPs de RAP Nacional, fins de 1980  

HIP HOP em letras de TAG - forma de assinaturas dos grafiteiros
Minha experiência com o RAP aconteceu via filho e sobrinho, apreciadores  do movimento. Quando adolescentes grafitavam, cantavam e freqüentavam eventos do gênero. Nunca vou me esquecer a cena: eu na praça da Paz, no Ibirapuera, lotada vendo Thaide e DJ Hum, viajando .... vestida com uma camiseta da Janis Joplin num Show de RAP.... Coisas da vida.... 
Então, nada melhor do que ele, Leandro Daniel, meu filho, para contar um pouco sobre o RAP e  rappers de SP.

"Os gemeos", grafiteiros de SP - Dos muros para  o MASP 
Tudo começou em fins dos 1980. Era efervescência musical do funk e do som que rolava nos States: África Bambaataa, Grand Master Flash, Run DMC, Public Enemy. Essa cena que vinha de fora alimentava os pioneiros do Rap em Sampa. O movimento hip-hop como um todo criava suas raízes nesse chão de asfalto. São Bento era o pico. Dançarinos breakers (chamados b boys) giravam no chão e se trançavam no locking, misturados com os mcs, djs e grafiteiros de plantão.

Racionais MCs
Nelson Triunfo dançando na rua 24 de Maio

Gentes das periferias da ZL, ZS, ZN, ZO se encontrando no centro! Nasceu assim  o relacionamento! Seja na mensagem de protesto, seja cantando o rolê ou nas crônicas do dia a dia, o rap, gestado nas periferias de SP, mostrou que vinha pra ficar. Thaide e DJ Hum são um dos grandes ícones desse início, assim como Nelson Triunfo, Sistema Negro, Racionais Mcs e Possemente Zulu. Os primeiros Lps, bolachas (pra felicidade dos DJs nos scratches), como a coletânea “Consciência Black I”, já traziam um RAP de pegada, acertando a jugular dos que desacreditavam do movimento. A grande revelação foi um grupo chamado Racionais Mc’s, que hoje dispensa apresentações. Importante notar que o RAP era a única voz que relatava o cotidiano das periferias que, apesar de sua grandeza, viviam excluídas na sociedade paulistana.


Nos anos 90 houve uma profusão de grupos, de todos os cantos de SP. Alguns nomes como Visão de Rua, RZO (clipe acima), Consciência Humana, Realidade Cruel, DMN, RPW, 509-E, Facção Central provaram que era um caminho sem volta a epidemia do RAP. Foi no fim dessa década que comecei a acompanhar essa cena. Foi também quando ia à Galeria, que muitos diziam do rock, mas suas bases estavam no RAP, no valoroso subsolo. Cabeleireiros, lojas de roupas, CDs e vídeos, e com a freqüentação da fina flor dos adeptos desse estilo de vida. 

Sabotage

Cresceu o rap nas rádios, na noite, nas periferias, no centro. Uma verdadeira organização, manifestos em forma de música afirmavam a identidade da galera das quebradas. Vale lembrar que foi nessa década que as taxas de homicídio atingiram índices elevados nas periferias de SP; e lá estava o Rap (juntamente com o hip-hop) para denunciar essa situação e mostrar que aquelas pessoas tinham muito a dizer. Como dizia Mano Brown na música Capitulo 4, Versículo 3, “27 anos contrariando as estatísticas”, seguiu rimando a realidade.


Já nos anos 2000 o processo de fortificação e amplitude do RAP só aumentou. Viu-se surgir na cidade uma vertente mais ligada às batalhas de Mc’s, que ousavam nas rimas, não tão ligadas a temas sociais, e na produção das bases. Artistas como Kamau, SpFunk, 5º Andar, e já atualmente Emicida, Rashid, Flora Matos, somaram as forças já sem limites do RAP paulistano.

Flora Matos

Hoje não se pode falar de SP, sem falar “mano”, “quebrada”, “fita”, “é nóis” e muitas outras expressões que se fundiram na fala dos paulistanos. O RAP hoje tá no VMB da MTV, tá no Faustão, no Roda Viva, nos ouvidos e corpos dos seres noturnos de São Paulo. Mas ele não esquece de onde veio, e de todos aqueles nomes que afirmaram o RAP não só como um estilo musical, mas um estilo de vida.

Criolo 


Pra finalizar vou deixar uma letra aqui (novo hino!) do artista Criolo Doido, um cara que está há muitos anos na ativa e representa bem o que é o RAP paulistano: movimento, ponte de ligação, manifesto, diversidade.

Aproveitem os clipes e as mensagens que valem muitos quilates!


Não Existe Amor em SP

Não existe amor em SP

Um labirinto místico

Onde os grafites gritam

Não dá pra descrever

Numa linda frase

De um postal tão doce

Cuidado com doce

São Paulo é um buquê

Buquês são flores mortas

Num lindo arranjo

Arranjo lindo feito pra você
Não existe amor em SP

Os bares estão cheios de almas tão vazias

A ganância vibra, a vaidade excita

Devolva minha vida e morra afogada em seu próprio mar de fel

Aqui ninguém vai pro céu
Não precisa morrer pra ver Deus
Não precisa sofrer pra saber o que é melhor pra você
Encontro duas nuvens em cada escombro, em cada esquina
Me dê um gole de vida
Não precisa morrer pra ver Deus

Até a próxima,  assitam os videos, 
e descubram os encantos do RAP em SP,
Bjs a todos,
Katia e Leo


Kátia Peixoto é doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Mestre em Cinema pela ECA - USP onde realizou pesquisas em cinema italiano principalmente em Federico Fellini nas manifestações teatrais, clowns e mambembe de alguns de seus filmes. Fotógrafa por 6 anos do Jornal Argumento. Formada em piano e dança pelo Conservatório musical Villa Lobos. Atualmente leciona no Curso Superior de de Música da FAC-FITO e na UNIP nos Cursos de Comunicação e é integrante do grupo Adriana Rodrigues de Dança Flamenca sob a direção de Antônio Benega.
 Leandro Daniel é formado em Ciencias Sociais pela USP e cursa Relações Internacionais na Unifesp. Paticipou do Nucleo de Estudos em História Oral - NEHO/USP e realizou atividades no Núcleo de Estudos da Violência-USP. 



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Livro aborda o heavy metal sem sensacionalismos ou preconceitos



O heavy metal ainda sofre preconceitos e estereótipos típicos de quem têm pouco conhecimento sobre o estilo e a importância do mesmo para a “eterna” revitalização do rock como cultura jovem. No último Rock in Rio, tivemos vários exemplos dessa representação muitas vezes medíocre feita pela grande mídia. Os velhos “lugares-comuns” de que o estilo é barulhento e tem apenas letras satânicas, é usado muitas vezes como “exotismo” para atrair a atenção dos receptores. E tal atitude preconceituosa não fica explícita apenas aos veículos e suas pautas sem pesquisa ou com pouco conteúdo de pesquisa.

Sarcófago: banda mineira de heavy metal e a imagem do choque para causar impacto

A cantora Claudia Leite demonstrou total preconceito ao comparar os “metaleiros” com nazistas. Indignada por ter sido vaiada num festival que unia diversas “tribos”, ela apenas reafirmava uma posição totalitária: a de que todos no festival deveriam apreciar suas músicas, mesmo que o show não fosse numa noite de carnaval na Bahia. Ou seja, muito do que é dito de forma pejorativa acerca do gênero mais pesado do rock é feito com má-vontade, além de inúmeros clichês que acabam sempre caindo em reducionismos e sensacionalismo.
O heavy metal sempre usou da polêmica como um dos artifícios para a manutenção de sua imagem rebelde e contestadora, porém mostrou durante décadas, uma vitalidade e ambição, bem maior que o punk rock, um estilo musical que muitas vezes ficou em guetos underground pela sua parca força propulsora de novos subgêneros. Dessa forma, é evidente que o metal manteve-se vivo e atuante pela capacidade de se reinventar e criar ramificações que utilizam influências que vão do jazz até o hardcore, por exemplo.
Primeiro disco do Black Sabbath consolidava o estilo e a imagem "maldita" do heavy metal

Para ilustrar a importância do metal às gerações de roqueiros das últimas quatro décadas, foi publicado no Brasil o livro “Heavy Metal – A História Completa”, do jornalista especializado em música, Ian Christe. O livro é um lançamento da editora ARX e vem com um apanhado geral e completo dos 40 anos do estilo, desde que o Black Sabbath lançou seu primeiro elepê, até as bandas atuais. Além de muito bem escrito, com uma história que mescla as desventuras dos “metaleiros” (termo ridículo criado pela Rede Globo durante o primeiro Rock In Rio, em 1985) com o contexto histórico, político e social de cada década, “Heavy Metal...” pode ser chamado de a “Bíblia Negra” do metal.
O livro não é apenas uma fonte interminável de consulta para os apreciadores do estilo, mas pode-se dizer que é uma verdadeira luz às trevas que sempre são colocadas por jornalistas mal informados - os típicos críticos preconceituosos de cadernos culturais de publicações comerciais; senhores de terno e gravata que acham que o som mais pesado feito no rock é o U2.

O livro também aborda, de forma bem completa, a ligação do estilo com a grande mídia. Se no começo houve uma profunda ligação com a imprensa alternativa, visto sua popularidade através de fanzines que estimulavam a troca de fitas, o metal passou nos anos 80 a gênero predileto da MTV. Depois da glória, o estilo caiu no ostracismo na visão da grande mídia, isso porque na década de 90, a mídia popularizou estilos como música eletrônica e o próprio grunge. Contudo, nos subterrâneos, as bandas de metal continuavam a vender milhares de discos e realizar turnês lotadas por todo o globo, isso demonstra (e fica muito bem claro no livro) que o metal nunca precisou do grande apoio da mídia para vender discos. O estilo sobrevive (e bem) pela devoção dos fãs, tornando-o mais que um movimento modista, mas um estilo de vida que transpassa gerações e tendências.
A obra  não é apenas para quem é fã de heavy metal, mas para todos aqueles que gostam de música e querem entender a história de um estilo que definiu modas, gírias e todo um universo cultural.


 Marcelo Pimenta e Silva é graduado em jornalismo pela Universidade da Região da Campanha, Bagé/RS. Como pesquisador atuou por três anos no Núcleo de Pesquisa da História da Educação, pela Urcamp, tendo produzido diversos trabalhos multidisciplinares. Tem como temas de pesquisa a imprensa alternativa brasileira; a contracultura e suas implicações na sociedade brasileira, além de temas como o ativismo na cibercultura. Conta com experiência em colunas sobre cultura, em jornais, em sites e em revistas. Atualmente, trabalha com jornalismo, assessoria de imprensa e pesquisa free-lance, além de cursar pós-graduação em comunicação mercadológica na Fatec Senac de Pelotas/RS.  
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Foto&Grafia e documentário







 Nesta atualização falarei sobre o projeto Foto&Grafia e contarei um pouco da etapa de finalização do documentário Transformação sensível, neblina sobre trilhos. 

 A oficina Foto&Grafia foi idealizada e produzida pela Melina Resende, Moises Patrício e por mim, uma interligação e soma de saberes dentro da sala de aula, nas ruas de Heliópolis, no centro de São Paulo, lugares ou temas do cotidiano. A realização deste projeto teve um curto tempo - três meses - e mantivemos o enfoque em ensinar os alunos do Programa Jovens Urbanos 2011 as reflexões, a prática das linguagens: fotografia, história oral, humanidades, intervenção urbana, entre outras vertentes que nascidas no processo de vivência com os jovens na comunidade.  

Imagem elaborada pelo assessor Moises Patrício para apresentação aos jovens.
 As inscrições para a oficina tiveram relevante procura e formadas duas turmas. Uma matinal, das 9h00 as 12h00 com 11 alunos participantes, e a vespertina, das 14h00 A 17h00 com 27 alunos. A professora de fotografia Melina Resende realizou um trabalho para sempre manter sintonizados seus conteúdos elaborados com o trabalho dos outros assessores, explicou conceitos técnicos de fotografia, como o enquadramento, a fotometria, ensinou a utilização de câmeras profissionais e amadoras, passou referências de trabalhos com auxílio da fotojornalista Amana Salles. 

Aula de fotografia com Melina Resende.

O Moises explicou alguns conceitos e referências de intervenções urbanas, utilizou como referência o artista Romero Brito, desenvolveu com os alunos um desenho e produziu graffiti no mural da Rádio Heliopolis. 

Jovens em aula com o Moises. Foto Melina Resende.
 Ao final da oficina o Moises elaborou uma apresentação com seus materiais produzidos e alguns dos feitios das aulas desenvolvidas com a Melina Resende e Amana Salles, que também trabalharam com intervenção urbana, na realização de lambe lambe das imagens feitas pelos alunos e a tão difundida imagem Che Guevara feita pelo fotógrafo Korda.

Clique aqui para acessar ou http://www.blurb.com/books/2548354.

 Minha contribuição nesta oficina foi com a história oral. Incitei os jovens a pensarem no cotidiano, temas que se motivariam a pesquisar, formamos quatro grupos, um de manhã e três a tarde, orientei os jovens com alguns conceitos e cautelas necessárias na realização da história oral, como por exemplo,  coleta de depoimento, transcrição e análise do material. Discutimos interesses e definimos temas para pesquisar de forma coletiva, em grupo.

Tuma da manhã. Foto de Melina Resende. 

Turma da tarde. Foto de Melina Resende.


 O Grupo 1 e 2, escolheram o tema Lazer na comunidade com enfoque no baile funk. Motivação decorrente da vivência dos jovens no baile e das polêmicas geradas na favela, como de proibição, uso de drogas, sexualidade, entres outras coisas investigadas por meio do roteiro de perguntas elaboradas pelos jovens.


Na rua que acontece o baile funk alunos em aula prática de fotografia, orientados pelas professoras Amana Salles e Melina Resende, e em busca de colaboradores para entrevistar. Foto de Soraia O. Costa.

 Grupo 3, Tema: Educação

Tendo em vista uma característica comentada e estudada em vídeo da acessão do Heliopolis como um "Bairro Educador", vejam abaixo um teaser do documentário que mostramos para os jovens:




Grupo 4, Tema: Esporte. 

Existem inúmeros times de futebol de campo, tem a quadra do Unas, a prática do Karate com crianças...

Jogos na rua e no campo em Heliopolis, pesquisa da temática esporte. Foto de Jovens Urbanos.



 Foi um rico aprendizado este primeiro projeto social que participo e tenho pretensões em me envolver em mais. Quem sabe uma segunda edição do projeto Foto&Grafia. Agradeço todos os envolvidos que somaram e fizeram com que o projeto tomasse tal dimensão! Em breve, postarei os vídeos que elaboramos resultantes das aulas teóricas e práticas.


***


 Em relação ao documentário, estamos em finalização. O resultado das horas de filmagem, os diferentes e precários meios de captação nos motivou a usar a criatividade, além do desejo de não deixar enfadonho o seu resultado. Eu e o Rafael Caitano, com colaboração dos alunos da UFABC, Eloi P., Fernanda Gonçalvez e Thiago Leite, somados as orientações dos professores Ana, Cláudio e Sá, nos conduzem neste momento a ter um resultado, gerado a longo prazo, de experiências e de aprendizados em audiovisual, direitos autorais, roteirização, decupagem, edição, tratamento de imagem, de som, pesquisa iconográfica para ilustrar depoimentos mais marcantes em relação a história e patrimônio.

Mais informações a respeito, por favor, perguntem, mandem críticas e sugestões, para isto, usem também as paginas criadas na rede social: Neblina Sobre Trilhos e Foto&Grafia

Muito obrigada,

Soraia Oliveira Costa, graduada em Ciênciais Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA). Trabalha com fotografia, audiovisual e oralidades desde meados de 2007, quando começou a analisar o cenário urbano, a natureza, o trabalho, as transformações sensíveis, os transportes, o comportamento, a cultura, a arte... Atualmente é documentarista do projeto "Transformação sensível, neblina sobre trilhos", documentário aprovado pelo MEC/SESu.




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Um esquecimento imperdoável



Em Cuiabá. Evidente que haveria escalas em outros países e cidades. Fato que retardaria a chegada... Não. Fato próprio da vida dos viajantes: escalas, espera em hotéis, atrasos. Talvez seja com isso que Osmar contasse. Ele precisa de tempo. É o que parece. Anahy logo estará em casa.

Conexão Tóquio-Cuiabá. Depois de seis meses de estágio em uma empresa japonesa, Anahy Igawa volta a ensolarada Cuiabá. Sorte grande acompanhar o trabalho de uma excepcional estilista dark toy (Em off: Aqui, vejamos, uma invenção despropositada do autor. Um disparate). Na volta, tudo indicando que o namorado a pedirá em casamento.

Pedir é um passo difícil. Osmar se lembrou de comprar um anel. De diamantes, talvez. O que é sabido é o valor do objeto, em torno de doze sálarios minímos. Momento apavorante. Falar de sentimentos, fazer um pedido de casamento. A expectativa pelo sim e o obscuro desejo de ouvir um não. Livre e decepcionado. Triste e reconciliado.

No aeroporto. Anahy sofre os efeitos do clima arenoso da cidade. Cuiabá prima-irmã do deserto do Saara. A jovem gozava o seu sucesso. Mínimo, mas seu. Osmar não estava no aeroporto. A mãe viera buscá-la. Um lapso? Um compromisso? Há três horas espera para revê-lo.

Preparando tudo. Osmar tem o discurso ensaiado. Nada de ficar de joelhos. Seria uma posição aviltante? Romeu se declarou de joelhos à Julieta? A "japinha" aceitaria, ele se ajoelhando ou não. Eís a certeza absoluta de Osmar (Em off: O autor escreve sabendo que a certeza masculina é pura vaidade, não uma asserção científica).

Integralmente, Cuiabá. Cidade verde sempre acolhedora para Anahy. A "gueixa", como alguns a chamam, para seu bem ministrado e disfarçado, é óbvio, repúdio. Ainda aguarda Osmar que não se reunira aos amigos para a calorosa recepção. Entre vinho, pizza, o carinho dos pais e um portentoso cigarro de maconha, Anahy via as horas passarem e nada de Osmar.

Hesitação. Osmar circulou pela cidade, aproveitando as cafetarias e livrarias, para espairecer em meio a multidão. Seis meses sem ver Anahy e a euforia em revê-la tinha se perdido no correr do tempo implacável, que a tudo esmaga. Em alguns momentos, esquecera o rosto dela. Um esquecimento imperdoável. As fotografias socorriam a memória nesses instantes de angústia.

Pensamentos resgatados. Anahy, na espera que se prolonga por um sinal de vida de Osmar, recordou-se que, em Tóquio, sabia que ao voltar para Cuiabá se casaria com ele. Para o que ela não encontrou resposta, no Japão, foi do porquê se casar. Antes de viajar, para a Cidade do Sol Nascente, Osmar e a moda eram tudo para a moça. Uma vez em Tóquio, Anahy e a moda são tudo para ela. Se Osmar não chegasse logo, para reabiltar a situação de outrora, ela temia que tudo que ocorresse dali para a frente confirmasse a mudança. Um esquecimento imperdoável, esse de não de não conseguir lembrar porque se ama alguém, pensou Anahy.

Cuiabá em pedaços. Osmar sentado em uma cafeteria toma um capuccino e lê "A Insustentável Leveza do Ser". Café, leite e Kundera. Reflexão e a caixa com o anel pousada na mesa ao lado da xícara de capuccino (Em off: O autor reflete à seco e sem estimulantes para o cérebro: "A mente é desobediente ou falta força a vontade que acalentava um amor considerado indestrutível?").

Sonho do tango da desilusão. A música invadiu Anahy. Um aviso importante. O tango que rasgava um cetim vermelho com uma navalha. Ela chorou. Sozinha refletia como tudo desmorona se o vento é favorável a um afã oculto, irremediável. O CD chega ao fim.

O encontro na cafeteria. Osmar permanecia absorto no ruminar da decisão que se sentia impelido a tomar. Isabella, a loira que ele ama em segredo, mas tão secretamente, que a si mesmo esconde o sentimento por medo de ser descoberto, assomou à porta do estabelecimento. Quando os seus olhos encontararam o dela, o homem repeliu a caixa que continha a sua fortuna ou o seu desastre.

Via SMS. (Em off: Aqui o autor compartilha a informação que um relacionamento de anos que resvalou no casamento acabará por meio da impessoalidade de um aparelho eletrônico. Osmar se esqueceu que o rosto de Anahy era o que ele deveria enfrentrar com destemor. Um esquecimento imperdoável que desmente o seu propalado romantismo). Osmar: "Eu não posso mais. Não posso me casar com você". Anahy: "Fale isso olhando para mim". Osmar: "Não dá. Me perdoe". Anahy: "Eu me esqueci porque amava você". Osmar: "Eu acreditava que te amava acima dos meus medos". Anahy: "Creio que seus medos são náufragos que agora não posso suportar". Osmar: "Acabou. Você me perdoa pelo meu ato de fraqueza?". Anahy: "Adeus e vá para o inferno".

A jornada um ano depois. Osmar viverá um romance com Isabella. Se casarão? Terão filhos? Dando-se tempo ao tempo e não restringindo o espaço um do outro, quem sabe? Anahy estará no Japão trabalhando como assistente da criadora da moda dark toy, que será dark angel toy. Alguns romances à vista e olhos nos olhos para as coisas importantes que deverão ser ditas. (Em off: Seria um esquecimento imperdoável do autor se ele não se lembrasse de abolir lágrimas e sangue da estória para que a citada estória não fosse somente mais uma tragédia a se abater sobre uma composição literária).

Moral da história. Um lapso de memória. Um lacuna numa inabalável convicção. Uma fenda no contínuo espaço-tempo. Um esquecemento imperdoável.






Wuldson Marcelo, cuiabano, nascido em 1979. Graduado em Filosofia pela UFMT e mestrando em Estudos de Cultura Contemporânea – ECCO/UFMT. Editor do “Caos Sophia”, jornal dos alunos de Filosofia, de 2003 a 2005. Possui artigos e contos publicados em jornais e sites de Mato Grosso e demais estados brasileiros, entre eles contos no site www.releituras.com.br e no jornal “Bom Dia” de circulação em cidades do interior de São Paulo e no Grande ABC. Disponibiliza regularmente contos no site www.overmundo.com.br Autor do livro de contos Obscuro-shi (no prelo, Editora A Fábrika, a Santa Casa da Criação).


A Contemporartes agradece a publicação e avisa que seu espaço continua aberto para produções artísticas de seus leitores.
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