sexta-feira, 19 de junho de 2015

MOURIR D'AMOUR




Quando fiquei sabendo que os cadeados da Pont des Arts de Paris seriam retirados, fiquei bem chateada. Não que eu tivesse algum com meu nome lá, mas pensei em quanto amor aquelas 45 toneladas de cadeado representavam. Quantos sonhos, esperanças, risos, beijos, alegrias e noites de amor simbolizados em quase um milhão de cadeados.  Tudo jogado fora, claro que por uma boa razão. Mas fiquei triste porque o mundo precisa muito e cada vez mais de amor. E os cadeados da Pont des Arts, em certa medida,  representam esse sentimento, tão humano e indispensável.

Pont des Arts.
Imagem extraída de: https://www.flickr.com/photos/djpig91/8144632619 

Por coincidência, fui a Paris a trabalho  logo após a retirada dos cadeados e talvez por estar com esse sentimento de desalento, comecei a ver corações em todos os lugares. Corações e pessoas apaixonadas. E me dei conta de que em Paris, de fato, o amor está no ar. Em todos os espaços. Mesmo nos mais improváveis. Até nas lojas de frutas e verduras, as famosas quitandas. Até mesmo nos...tomates, imagine só. Encontrei dois com nomes de coração, o coeur de boeuf e o coeur de pigeon. Como os nomes sugerem, o coeur de boeuf é um tomate bem grande, enquanto que o coeur de pigeon é pequenino e delicado.


Tomates de todos os tipos, em Paris*. 


Tomate coeur de pigeon e coeur de boeuf*. 


Presenteada pelo destino e com os olhos apaixonados por Paris, encontrei algo ainda mais raro: um tomate do tipo coeur de bouef em forma de coração. Fiquei encantada com esta amorosa coincidência.

Em Paris, até os tomates lembram o amor*. 

Nas quitandas, a variedade de frutas é tão grande que dá vontade de comer todas. As cerejas são linda e apetitosas, e lembram  (claro!) pequenos corações, rubros e vibrantes, pedindo para serem saboreados. 

As cerejas, os pequeninos corações vibrantes*.

Próximo à Gare du Nord, onde fiquei hospedada, há muitas lojas de roupas para festas e uma especialmente me chamou a atenção, por causa do nome: a Coeur des Femmes. Pois se há um lugar em que mora o amor, desde sempre, esse lugar é o coração das mulheres.

Loja Coeur des Femmes, em Paris.

Em todo o comércio de Paris, o amor é lembrado ou sinalizado de forma sutil e às vezes nem tanto, mas o coração é o símbolo que mais se destaca.


Vitrine de loja de decoração, postais românticos e vitrine de loja de macarons, todas próximas à Basílica de Sacre Coeur.
Fui conhecer a Sorbonne e depois da visita, sentei-me na Place de La Sorbonne, para lanchar. Enquanto comia uma baguette deliciosa, recheada com copa, alcachofra e camembert, comecei a observar as pessoas. Um casal atraiu minha atenção. Ele era alto, vestia uma camisa xadrez vermelha e um jeans claro. Levava uma bolsa tipo carteiro. Tudo bem britânico. Observei que não era muito jovem. 

Ela também não. Ambos tinham por volta de cinquenta anos. Mas pareciam dois adolescentes, porque felicidade rejuvenesce. E era evidente que eram muito diferentes. Ele andava de um jeito comportado, sério e compenetrado. Ela, ao contrário, andava tão solta e livre, que parecia que dançava. Usava uma blusa pink, dupla, de um tecido leve. 

Ao se movimentar, as laterais se levantavam, dando a impressão de que tinha asas cor-de-rosa.  Às vezes, enquanto andava, ela girava e ria, de tanta  felicidade, apontando para um lado e outro, mostrando alguma coisa que lhe chamava atenção. Ele ria também, mas todo contido e, encantado com a liberdade dela, apenas segurava sua mão, com tanto carinho e reverência, que era impossível não se comover.

Imagem extraída de: http://purezaesantidade.blogspot.com.br/

Ela falava alto em inglês e gesticulava bastante, rindo muito. Sua felicidade era contagiante. La joie de vivre, pensei. Achei que era italiana, pois era muito expansiva, ao contrário dele, super austero. Ele era um lorde inglês. Ela era uma maluquinha. Então, em um determinado momento, eles se sentaram e se beijaram na boca. Foi um beijo rápido, só um selinho. Percebi que ela queria mais, mas ele era muito discreto para isso. 

Ela o olhou diretamente nos olhos, profundamente e não precisou dizer nada. Seu olhar era de absoluta entrega ao amor. Então ele cochichou algo em seu ouvido. Che bello, ela disse e riu baixinho, toda enternecida e aí tive certeza de que era italiana. 

A seguir, eles ficaram sentados de mãos dadas, em silêncio, apenas apreciando aquele momento tão especial, que nunca mais se repetiria, não daquele jeito; e porque ambos sabiam disso, respeitaram aquele instante mágico. Depois de alguns minutos, levantaram-se e foram embora. Fiquei olhando enquanto se afastavam e torci muito e verdadeiramente para que aquele amor desse certo...

Place de La Sorbonne

Cenas como essa, que mostram o poder do amor em Paris, vi muitas. Na Gare du Nord, uma jovem estrangeira pediu uma informação para um guarda, um negro bonito, todo elegante em seu uniforme azul-escuro. Quando ele começou a falar, a moça foi subitamente tomada por alguma coisa, uma energia especial e eletrizante. Não sei se foi a língua francesa, tão musical, ou se foi o charme do homem, mas ela começou a fazer uma pergunta atrás da outra, na tentativa de prolongar aquele momento único, enquanto seu corpo começou a se mover, no compasso da conversa. 

Fez algumas piadas, porque ambos riram e ela começou a passar a mão pelos cabelos, subitamente transformada em uma mulher sedutora. Olhava o guarda nos olhos e ele também a olhava, hipnotizado. Uma atração imediata se estabeleceu entre eles. Já não eram mais dois estranhos, mas um homem e uma mulher, atraídos e encantados um pelo outro. 


Gare du Nord
Imagems extraídas de: http://genius.com/2302351 e
http://dicasdefrances.blogspot.com.br/2011/02/gares-de-paris-rer-tranportes.html

No Arco do Triunfo vi muitos casais apaixonados. Mas um jovem casal oriental se destacava pela alegria e beleza. Tão lindos e felizes que pareciam em lua-de-mel. Usavam “roupa de casal”, coisa que só tinha visto em novelinhas coreanas (Sim, eu confesso que assisto! E adoro!). 

Como na Coréia gestos afetivos e carinhosos entre casais podem ser vistos como algo imoral, vestir-se igual é uma maneira de dizer ao mundo que se amam muito, que são um casal apaixonado e que estão juntos. Perguntei se estavam e lua-de-mel e a moça respondeu que sim, mas pela terceira vez. Quer coisa mais romântica que essa?


Tristan e Sisi, o lindo casal coreano, curtindo sua terceira lua-de-mel em Paris.

Há muito amor em Paris e se os casais apaixonados não podem mais colocar cadeados na Pont Des Arts, há muitos outros lugares que podem substituir a ponte. Na Basílica de Sacre Coeur, alguns apaixonados já começaram a clicar os cadeados nas cercas que circundam a igreja. Ainda são poucos, mas sem a opção da ponte, acredito que esse será o novo point dos apaixonados. E com um bônus extra: a energia sagrada da antiga igreja, cujo nome (lógico que sim!) remete ao coração.



Cadeados na Basílica Sacre Coeur





Referências:

Créditos das fotos não referenciadas:
Izabel Liviski e Vanisse Simone.

* Frutas e vegetais foram fotografados em uma quitanda próxima à Gare Du Nord.





Vanisse Simone Alves Corrêa é doutoranda em Educação pela UFPR 
e co-editora da Revista Contemporartes. Ela nunca acreditou 
muito em amor à primeira vista mas,  se ele existe,
 o lugar certo para ele  acontecer é em Paris.


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