quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Tolerância Zero: conflitos sociais interiorizados


Lucca Amaral Tori, Luana Homma e Caio Biz

Danny é um jovem rapaz estadunidense, que sai de casa vestindo coturnos nos pés e de cabeça raspada, encontrando, em seu caminho, outro jovem – um judeu. Assim começa a história da personagem que se diz abertamente neonazista, evidenciando em público sua crença no que diz ser a: “superioridade caucasiana”. Danny coloca o ódio por judeus como algo natural e inerente aos seres humanos – mostrando sua crença de que judeus não se enquadram como tal – e inclui uma explicação sexual para tal “inferioridade”.




Vestindo a suástica (símbolo utilizado pelo partido nazista na Alemanha), Danny esbarra propositalmente em duas pessoas negras.

O interessante e diferencial deste filme – que, como tantos outros mostra um conflito histórico entre a extrema-direita, antisemitas, e os judeus – é que este aborda o tema do neonazismo com um conflito individual e interno, da personagem Danny Balint – um judeu neonazista – que ao mesmo tempo que demonstra acreditar na “supremacia branca”, tem ainda respeito por símbolos judeus. Durante todo o filme, ouvimos vozes e observamos flashes de memória, que destacam a racionalidade do protagonista desde criança, que inconformado com certas colocações em sala de aula sobre a questão religiosa e seus ensinamentos, é por vezes reprimido pelo professor e pelos colegas. Danny então demonstra em sua história um forte descontentamento com os seguidores do judaismo que para muitas ações não tinham motivos aparentes ( como explica para sua namorada: “Eles não fazem por temer a Deus, não fazem por motivos racionais, o fazem porque é como manda a Torá”).

Em reunião de um grupo de senhores que se declaram fascistas (colocando como explicação a questão econômica, dos problemas do livre mercado), Danny e alguns amigos aparecem, expressando a questão racial como barreira para o desenvolvimento, incluindo que uma das ações deles deveria ser matar um judeu (um rico dono de banco).


                                                   Danny e outros crentes na “supremacia branca”

Após causarem uma grande briga, Danny e alguns amigos – também neonazistas – começam a participar de grupos de discussão, de senhoras e senhores que tem algum grande trauma na vida – como pena alternativa à prisão. É neste ponto que o protagonista começa a demonstrar sensibilidade, quando, em determinado momento, um judeu sobrevivente das atrocidades do governo nazista no período da II Guerra Mundial, conta uma triste história sobre como os brutais oficiais da SS pegaram seu pequeno filho de suas mãos e o empalaram da maneira mais fria possível, deixando que o sangue de toda essa brutalidade jorasse em seu rosto. Danny ao ouvir essa história mostra-se comovido, mas demonstrando de maneira diferente, se mostra muito mais bravo com os Judeus – nesse caso específico retratado pela história desse senhor – pois este não fez nada enquanto o soldado matava o filho, não tentou lutar para evitar esse estrago.
O protagonista realmente sentiu a brutalidade da história e do fato de terem matado a criança dessa forma, mas ao invés de direcionar esse ódio ao soldado hitlerista que o fez, ele o concentrou nos judeus, pelo que estes “não fizeram” – criando mais pontos para fortalecer seu ódio contra esses, explicitando esse sentimento ao dizer: “mate o inimigo independente do lado em que estiver”, sendo essa a sua lei maior. Essa história foi tão forte ao protagonista, que em diversos momentos do filme, quando este se via triste, mal ou confuso, ele se enxerga participando da história, fazendo o papel do soldado nazista assassino. Também é nessa cena que ele diz não negar o Holocausto, mas o afirma de forma honrosa, exaltando Hitler como herói exatamente por ter acabado com a vida de tantos Judeus.

Outro momento em que o conflito interno relacionado com sua sensibilidade ocorre por suas atitudes externas, é quando Danny, junto de seu grupo de amigos neonazistas, invadem uma sinagoga e começam a depredar tudo por dentro. Porém, quando o grupo encontra uma sala mais específica com alguns símbolos judeus mais fortes – roupas, mantos, objetos, etc. – Danny não se mostra tão seguro com a situação, principalmente quando encontram um Torá – livro sagrado em hebraíco – que dentro da religião e de todo o seu símbolismo, não deixa que as pessoas encostem com as mãos seus escritos, nem que ajam de maneira subversiva sob ele. O protagonista passa a contar a história desse símbolo aos seus comparças, mas esses não se importam, ele demonstra claro ódio aos colegas por nem conhecerem o próprio inimigo, mas mesmo assim esses vão com todo o desrespeito rasgar folhas do Torá. Danny, mesmo com todo o ódio que demonstra sentir ao povo Judeu, sua ideologia de superioridade ariana e contrária aos pressupostos e seguidores da religião hebraica, não consegue se desvincular desse respeito a certos símbolos, e por isso acaba levando o Torá para sua própria casa e o reconstrói, com todo o respeito – ainda levando sua ideologia nazista consigo, tornando seu conflito interno cada vez mais intenso.


                                           Ódio de Danny  e a reação violenta dentro do próprio grupo de neonazistas

Podemos ver com o decorrer da história os conflitos se agravarem, tudo na forma da própria personagem, que ao mesmo tempo que expõe para outras pessoas o motivo de odiarem judeus, em sua casa persiste com certos rituais da religião, mostrando se sentir protegido enquanto o faz. Em diversos momentos, como quando o protagonista discursa em uma reunião de pessoas de extrema-direita, e inicia com uma oração judaica, colocando que a arma para acabar com o povo judeu seria não o ódio, mas o amor, uma vez que este povo está acostumado com o sofrimento, e com ele se fortalece; ou como quando erra o tiro destinado ao judeu bancario ao qual se referia no início do filme, Danny se mostra em dúvida acerca de suas convicções.

Ao fim, demonstrando o fim da negação de sua crença, Danny se vê na mesma cena da história do senhor, mas agora como o judeu, aquele que sofre ao ver o filho sangrar nas mãos do oficial da SS. E em ato maior ainda de redenção, Danny avisa os judeus da sinagoga onde fazia a oração da existência de uma bomba no local, e de lá não sai.

Assim, em um filme que retrata basicamente a história de um homem, vemos refletida a história de diversos, de um grupo que, por sua religião foi por vezes perseguido – e que, em discussão, pelo filme, também atacou outros grupos, como os palestinos -, e de outro que por questões ideológicas – “morais” como, por vezes, colocam; ou econômicas – persegue o primeiro, bem como Danny fez, em uma perseguição constante dele próprio.

Outro filme que também mostra conflito semelhante (mas voltado mais para a questão dos neonazismo e os negros), de forma muito interessante é A Outra História Americana (American History X, EUA, 1998, 119min), com Edward Norton e direção de Tony Kaye.

Lucca Amaral Tori, Luana Homma  são discentes do Bacharelado de Ciências e Humanidades UFABC
Caio Biz é discente do Bacharelado de Ciências e Tecnologia da UFABC
Os três são autores do blog Performance Política

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